quarta-feira, 9 de janeiro de 2008

Fabricação de consenso sobre o 'inimigo'

Domingo:
Igor Portu e Mattin Sarasola são presos em Mondragón, no País Basco. As primeiras informações policiais dão apenas conta de que iam armados. Nenhuma outra notícia reportou qualquer acontecimento anormal.

Segunda-feira:
Igor Portu dá entrada na Unidade de Cuidados Intensivos do Hospital de Donostia com lesões graves. O caso é noticiado e a polícia faz as primeiras declarações. Segundo a Guardia Civil, Igor Portu ter-se-á lesionado quando entrava na carrinha militar.

O relatório médico é publicado pela imprensa basca e a gravidade das lesões não é compatível com a versão policial.

A notícia espalha-se por toda a comunicação social espanhola e a polícia volta a fazer declarações. Desta vez, a Guardia Civil apresenta uma versão diferente da primeira e explica que os dois jovens iam armados, tentaram escapar e que teve de ser usada a força para a detenção. Segundo a instituição militar espanhola, essa foi a razão para as lesões.

O escândalo salta para a imprensa estrangeira - menos para a portuguesa, claro - e o ministro espanhol da Administração Interna, em representação do governo, faz as primeiras declarações. Aprova a actuação e tem plena confiança nas forças de segurança. Naturalmente, explica que se iniciará uma investigação ao que passou.

À noite, comunica-se que, graças a um croqui em papel que possuiam os detidos, se descobriu um zulo [esconderijo] da ETA com explosivos na Huesca.

Terça-feira:
Começa-se a questionar sobre o estado do outro preso, Mattin Sarasola. A comunicação social noticia a descoberta de outro zulo da ETA com explosivos, desta vez em Navarra, no País Basco.

Quarta-feira:
Fontes médicas revelam que Mattin Sarasola também tem lesões. A comunicação social destaca que o preso negou essa realidade. Não revelando que é comum que a polícia espanhola recolha declarações falsas assinadas sob ameaça de tortura.

Surpreendentemente, a imprensa espanhola noticia que os dois presos confessaram ser os autores do atentado no aeroporto de Madrid e que, para além disso, iam atacar um parque de estacionamento no centro financeiro da capital espanhola.

Alguns comentários a esta última notícia na edição digital do El País:

"Enhorabuena a las Fuerzas de Seguridad y al Gobierno. Soy votante del PP, y ahora sí que puedo felicitar al PSOE. Este es el camino, y no otro." [Um votante do PP que felicita o PSOE pelo caminho tomado]

"Felicitar de nuevo a las fuerzas de seguridad del Estado por la captura de esta gentuza.El ministro Rubalcaba está haciendo una gran labor." [Felicita as forças de segurança pela captura desta gentalha e o ministro]

"No me gusto el titular de ayer del pais. Ni "el parte medico" No se sabia de de parte de quien estaban y si sabian de que hablaban. Una fractura de costilla por mucha novela que se le eche no tiene porque ir ligado a tortura, si se le inmoviliza a alguien poniendole una rodilla sobre el torax puede puede producir una fractura, el aire(enfisema) y el derrame es casi inevitable que aparecca horas despues. Se cura solo, con un tubo en la pleura que evacue el aire y el liquido, durante unos cuantos dias, sin ninguna otra medida. Es casi un lujo tener en la UCI, una fractura de costilla , una sola y ademas en plano posterior. que al estar tumbado se estabiliza." [Critica a manchete de ontem porque é demasiado branda. Para além disso, explica, as lesões podem não ter sido por tortura e que é "quase um luxo" ter "só" estas lesões na Unidade de Cuidados Intensivos. Ou seja, com uma perfuração no pulmão, uma costela partida e lesões por todo o corpo]