sábado, 9 de agosto de 2008

Paris deixou passar 25 anos sem esclarecer o paradeiro de Popo Larre


Teria agora 46 anos de idade. No entanto, passaram 25 desde a última vez em que Jean-Louis Larre foi visto com vida: o jovem de Heleta, em fuga, metia-se num bosque próximo do parque de campismo de Leon, nas Landas, onde minutos antes se deu um enfrentamento armado entre agentes da Gendarmerie e o comando do Iparretarrak (IK) ao qual Larre pertencia. Um polícia francês morreu, e um outro ficou ligeiramente ferido num dedo. A Popo, ninguém mais o voltou a ver desde então.

A 7 de Agosto de 1983, era já noite, nas imediações do parque de campismo Lou Puntao de Leon (Landas), um tiroteio entre polícias franceses e militantes do IK deu origem, imediatamente depois, a uma operação policial de grandes dimensões que cercou, num raio de vários quilómetros, o bosque no qual se tinha visto Larre pela última vez, a fugir. Mas, com isto, deu-se início a um dos episódios mais obscuros que Euskal Herria e Paris enfrentam. A reconstrução dos factos e os dados que se conheceram muitos anos depois evidenciaram que, pouco antes do enfrentamento armado, a polícia francesa prendeu um militante do Iparretarrak ao qual, supostamente, apreenderam uma nota em que aparecia o endereço do parque de campismo da localidade das Landas. Além disso, uma chamada anónima para a Gendarmerie levou dois polícias a interceptarem os militantes bascos. Após a refrega, três dos militantes de IK conseguiram safar-se da perseguição policial, enquanto Popo se meteu pelo bosque adentro.

O cerco policial, a que chamaram «Plan Epervier», contou com a participação de helicópteros, equipas de perseguição terrestre, cães treinados e polícias especiais que se espalharam pelas imediações do parque e do bosque pelo qual Larre fugiu.
Dezassete anos depois do desaparecimento do jovem de Heleta, e sem que à altura se tivesse levado a cabo qualquer investigação oficial para esclarecer a localização do único militante que várias testemunhas reconheceram – o gerente do parque de campismo confirmou que foi ele que alugou um lote no recinto –, a Corte Especial de Paris iniciou o rocambolesco julgamento que acabaria por condenar Filipe Bidart a 20 anos de prisão, Gabi Mouesca a 15 e Totte Etxebeste a 5. O único basco que desde o início se encontrava acusado no processo, Popo Larre, foi retirado do mesmo por decisão do próprio tribunal. Com o arranque do julgamento voltaram a aflorar novos dados, que mostraram o interesse nulo dos franceses em esclarecerem um desaparecimento que obviamente os implicava.

A insistência da família do polícia falecido em esclarecer os acontecimentos de Agosto de 1983 foi o que acabou por forçar a abertura do julgamento. Este – o «caso Leon» – passou durante 17 anos pelas mãos de cinco magistrados, sem que nenhum o quisesse enfrentar. Mais, nas vésperas do seu começo, a primeira das surpresas aconteceu quando os 167 elementos probatórios se viram drasticamente reduzidos a 37. Dados que foram eliminados e que nunca serão conhecidos publicamente.

Para além das contradições policiais que os diferentes agentes militares e policiais chamados a depor deixaram entrever, novos elementos conheceram a luz no mesmo tribunal que fez o possível para que não se realizasse um julgamento em que a principal incógnita recaía no paradeiro de Larre.

«Não, aquele não era o nosso filho»
Vários dias depois dos acontecimentos de Leon, a 22 de Agosto de 1983, desaparecia o jovem Pascal Dumont, com pouco mais de 15 anos, que se encontrava a passar uns dias com alguns amigos em Lacanau, a várias dezenas de quilómetros do parque de campismo das Landas. Cinco dias depois, numa praia próxima de Leon, apareceu um cadáver que a polícia identificou como o corpo sem vida de Dumont.

A sua família negou desde o início que fosse o do seu filho. Um homem que passeava pelas redondezas encontrou o cadáver às 8h45, e três quartos de hora depois a polícia contactou os Dumont para os informar de que as buscas efectuadas não tinham trazido resultados. No entanto, durante o julgamento, Yvonne Dumont declarou que “às 9h da manhã um médico forense tinha certificado a morte de Pascal Dumont”.

O pai do jovem francês, Germain Dumont, declarou que a polícia o pressionou no sentido de identificar como sendo do seu filho um cadáver que, segundo ele, não era tal. “Nem a idade aparente, nem o aspecto físico, nem os traços do rosto, nem o fato de banho que tinha... Não, aquele não era o nosso filho”, testemunharam os Dumont. O desacordo dos Dumont com a identificação evidencia-se também no epitáfio da sepultura atribuída a Pascal Dumont; a família colocou uma placa onde se lê: «Aqui descansa um desconhecido que nos foi imposto a 27-VIII-83 pela Gendarmerie, a polícia, a Justiça e os corpos médicos».

No processo judicial do «caso Leon», que se levou a cabo em Março de 2000 em Paris, foram incessantes as petições para exumar o cadáver que jazia na sepultura dos Dumont, mas foram rejeitadas, uma após a outra, sem contemplações, pelo tribunal parisiense. Finalmente, há cinco anos, quando passavam 20 sobre o desaparecimento de Larre, um magistrado de Bordele deu luz verde à exumação do cadáver para cotejar o ADN. Contudo, o nicho foi profanado seis meses antes e em Dezembro só encontraram despojos humanos e uma tíbia.

«Jean-Louis Larre encontra-se aqui?»
Outro elemento de destaque, a que os gendarmes não deram resposta no julgamento, foi o facto de, nos cartazes que a polícia publicou no dia seguinte ao tiroteio de Leon, não aparecer a foto de Popo Larre; o único militante identificado pelos polícias.

Mais ainda, a Gendarmerie não começou a recolher testemunhos antes de 9 de Agosto. Até essa data só obtiveram a descrição que lhes facilitaram o gerente do parque e o gendarme que ficou ferido sem gravidade.

Esses dados, entre muitos outros, possibilitaram que os militares e os gendarmes que declaram no processo judicial fossem surpreendidos em contradição. Mas isso não foi obstáculo de espécie alguma para que o tribunal parisiense continuasse a fazer caso omisso das demandas apresentadas pela defesa. Menos ainda depois de ver o desprezo com que se dirigia aos três bascos que se sentavam no banco dos réus.

Em Março de 2000, quando o julgamento do chamado «caso Leon» arrancou, a defesa interpelou o tribunal pela mais que estranha circunstância de nem se ter dado ao trabalho de saber o paradeiro da pessoa-chave no processo; a mais que vergonhosa resposta do presidente do tribunal veio na forma de uma ordem transmitida a um funcionário judicial – para que perguntasse tanto na sala como no exterior do tribunal especial se Jean-Louis Larre ali se encontrava.

25 anos depois do seu desaparecimento, Popo Larre continua a incomodar as autoridades francesas, que não têm interesse algum em esclarecer o que realmente aconteceu em Leon. Da mesma forma que lembrar Eduardo Moreno Bergaretxe, Pertur, e José Miguel Etxeberria, Naparra, desagrada aos governantes espanhóis.

O teatro, o desporto e a dança, gostos que, juntamente com a militância, lhe foram truncados.
Jean-Louis Larre nasceu a 6 de Abril de 1962 na localidade de Heleta (Behe Nafarroa ou Baixa Navarra). Uma terra que o viu crescer e na qual passou a maior parte da sua vida. Desportista e apaixonado pela montanha, Larre começou a ser chamado Popo pelos seus amigos de Baigorri, onde participava no grupo de dança Arrola e na equipa de rugby local. O teatro era outra das suas paixões e foi no grupo de teatro de Baiona Xirristi Mirristi onde mais desenvolveu os seus dotes. Também foi professor na AEK, embora tenha feito estudos de Electrónica e tenha sido nesta área que começou a sua carreira laboral.
Após a sua participação em grupos do movimento popular, foi também militante do grupo armado Iparretarrak (IK). Foi visto pela última vez com vida a 7 de Agosto de 1983.

Gari MUJIKA

Fonte: Gara


Popo revive em Heleta, no instante de uma homenagem

Mais de 200 pessoas juntaram-se em volta da lembrança de Popo Larre, esse jovem de Heleta desaparecido há 25 anos. Philippe Laskarai tomou a palavra e deixou uma vez mais esta questão sem resposta: onde está o Popo? Depois dele, fizeram-se ouvir o bertsolari Amets Arzallus, e os cantores Erramun Martikorena, Niko Etxart e Eneko Labeguerie.