segunda-feira, 29 de junho de 2009

Uma lança em Gorbeia


Entre 1556 e 1648, desde o levantamento dos flamengos contra a monarquia espanhola até à paz de Westfália, as tropas mercenárias espanholas enfrentaram gente que reclamava a sua emancipação. As circunstâncias políticas da época tornaram num inferno o movimento da soldadesca desde a península até ao campo de batalha e daí o ditado popular “Mais difícil que espetar uma lança na Flandres”.

Em 1556, conseguiu-o o maldito – mil vezes maldito – Duque de Alba, embora no final, com a assinatura do tratado de Westfália, ao império espanhol não restasse mais do que reconhecer a independência dos Países Baixos levantados em armas. De nada lhes serviu, portanto, espetar as suas ensanguentadas lanças na Flandres.

Depois, de derrota em derrota, veio a decomposição do império espanhol até chegar à caricatura da ilha de Laila [Perejil]. Naquele penhasco povoado por uma dezena de cabras e meia dezena de recrutas marroquinos em fato de banho, com vento forte de levante, os legionários de Federico Trillo conseguiram cravar a bandeira espanhola frente à costa de África. Imagino-os numa postura de firmes, altivos, orgulhosos da sua proeza, saudando a bandeira e entoando hinos guerreiros.

Agora, com ânimo renovado após o discutido e discutível triunfo das forças espanholistas na Comunidade Autónoma Basca, as tropas de Carme Chacón alcançaram outro dos seus ambicionados objectivos militares. A bandeira vermelha e amarela já flutua na cruz de Gorbeia, perto das grutas de Mairulegorreta, onde milhares de bascos renovaram mil e uma vezes o seu abertzalismo durante a noite franquista.

Depois de assustarem mendigoizales [montaheiros], pastores e ovelhas, os guerreiros de elite do Exército espanhol conseguiram envolver a cruz numa enorme e alargada bandeirola, e, para o celebrar – à luz das fotografias publicadas –, deitaram-se nas calmas a comer sandes de cavala. Ali não houve gestos bizarros nem hinos patrióticos. Cada vez mais freaks.

P.S. – O PNV protestou, enfurecido, contra este acontecimento de guerra. O deputado José Ramón Beloki, ferido nos seus sentimentos, pede contas a Rodríguez Zapatero e o EBB [Euzkadi Buru Batzar] convoca uma romaria de desagravo. Pergunta: Assistirá Izaskun Bilbao? Ela espetou a vermelha e amarela no Parlamento de Gasteiz. Outra vitória.

Martin GARITANO
jornalista

Fonte: Gara