segunda-feira, 14 de dezembro de 2009

Turcos e espanhóis


O Tribunal Constitucional da Turquia acaba de ilegalizar o Partido para uma Sociedade Democrática que, com os seus 21 deputados, representa dois milhões de curdos no Parlamento de Ankara. Não causa surpresa nem espanto o ataque do Estado turco contra a nação curda, que reprime pela violência. Tão-pouco que os argumentos sejam semelhantes aos que já aqui conhecemos desde os anos 90. O que é surpreendente - embora a uma altura destas poucas coisas nos surpreendam - é que o alto tribunal de um estado ao qual recusam inclusive a integração na União Europeia pela sua escassa qualidade democrática recorra à sentença do tribunal de Estrasburgo que ratificou a ilegalização do Batasuna. Naquela sentença apoia-se um estado não equiparável à democracia para justificar o envio para a clandestinidade do partido que representa uma parte importante dos curdos.

Virá alguém alegar que não são, nem de perto, comparáveis ou equiparáveis as realidades que vivem - padecem - o povo basco e o curdo e que, em consequência, também não se pode cair na tentação de caricaturar o rei de Espanha ou Rodríguez Zapatero com os mandatários turcos. É óbvio que não atravessamos, curdos e bascos, as mesmas circunstâncias, mas não é menos verdade que ambas as nações vêem como lhes é recusada a sua própria existência por parte dos estados que ocupam a sua terra. No nosso caso, falam da quimérica Euskal Herria ou da fantasia nacionalista que nos faz ver um povo basco onde não existe mais que um colectivo de espanhóis de fala estranha.

É claro que as realidades de curdos e bascos não são idênticas, mas não é menos verdade que, tal como nós, também os curdos sofrem o pesado fardo de centenas de prisioneiros políticos, exilados, mortos. E que, como os bascos, vêem agora como se volta a mutilar a sua representação política com a exclusão dos seus partidos, que é o mesmo que dizer a exclusão dos votantes. Também aqueles, como nós, conhecem a marca brutal da tortura, da segregação. E, para o caso de alguém ainda ter dúvidas, o Tribunal Constitucional da Turquia deixou as coisas bem claras ao agarrar-se à sentença de Estrasburgo contra o Batasuna com unhas e dentes.

Bascos e curdos não serão iguais, nem Espanha será a Turquia, mas será forçoso reconhecer que, quando de oprimir uma nação se trata, os seus comportamentos são idênticos. É a democracia turco-espanhola. Ou hispano-turca, se preferirem.

Martin GARITANO
jornalista
Fonte: Gara