sexta-feira, 26 de outubro de 2018

«Raiva»

[De Anabela Fino] Em meados dos anos 90 do século passado, Manuel da Fonseca escreveu a história do Alentejo a partir de um episódio verídico ocorrido cerca de vinte anos antes e que deu brado na imprensa: o assassinato de um agrário e do seu filho por um trabalhador agrícola. Chamou-lhe Seara de Vento. Obra emblemática do grande escritor comunista e do neo-realismo português, nela está plasmada a repressão sem medida, a humilhação mais abjecta, a exploração sem freios que os latifundiários, com a benção do clero e das forças policiais do fascismo, infligiam ao operariado agrícola alentejano e aos pequenos camponeses, bem como a miséria e a fome nos campos do Sul que Salazar dizia ser o «celeiro da nação». Uma obra onde perpassa ainda a corajosa luta clandestina dos que ganhando consciência de classe aprendiam que «um homem só não vale nada».
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Quando por toda a parte a besta fascista volta a levantar a cabeça sem subtilezas e nos EUA se anuncia a reabertura oficial da corrida às armas nucleares, a Raiva que Tréfaut foi buscar à Seara de Vento ganha uma actualidade acutilante. Lembra-nos, sem o dizer, que um homem só não vale nada. (avante.pt)