quarta-feira, 31 de dezembro de 2008

Lembrança e compromisso


Desde as suas masmorras – ali fechados vinte horas por dia – lutam, constroem e sonham. “Não vos vamos deixar ficar mal”, escrevia uma presa amiga. Será tão expressivo o nosso compromisso?

[Texto publicado no Gara a 22/12/2008 e cuja tradução queríamos aqui apresentar só hoje, dia 31/12/2008. E assim o fazemos. Zuentzat.]

Estamos à beira da grande festa. E, como toda a festa maior que se preze de o ser, chegar-nos-á carregada de celebrações e de lembranças. Saudade de tempos passados e de pessoas idas; evocação das pessoas queridas e ausentes. Neste contexto de recordações íntimas, ocuparão lugar destacado as nossas presas e os nossos presos. Não são mais um capítulo da nossa história social e política. São o epicentro de um conflito que nos afecta a todos e que, de um modo cruel, neles se visualiza. Que a nossa pequena Euskal Herria suporte o cativeiro de 780 presos políticos é um facto escandaloso e único na refastelada Europa; evidência de que França e Espanha – estados imperialistas – se homologaram em rigor com a insultada Turquia.

Os 780 interpelam-nos a todos. São um revulsivo para nós, que nos aprestamos a celebrar os iminentes festejos como se nada disto acontecesse. Ou como se acontecesse num desses países distantes e malditos que não nos importam a ponta dum corno. A brutal política penitenciária também reclama o compromisso de guias religiosos, dirigentes sindicais, líderes políticos ou activistas sociais. Encontramo-nos ante um sofrimento massivo utilizado como ferramenta política. Madrid e Paris aplicam a dispersão como um tormento para dobrar a dissidência; mecanismo de controlo social com pretensões dissuasivas e exemplares; sequestro que converte os cativos em reféns e a solidariedade dos seus familiares em delito. Cenário por onde desfilam a dignidade dos cativos, a sevícia dos seus guardiães e o compromisso – ou o desentendimento – dos restantes cidadãos; esta crua representação não admite espectadores. As 780 pessoas cativas puseram em jogo aquilo a que mais valor dão: a sua própria existência; as suas famílias pagam, semana após semana, o duro tributo da fidelidade incondicional. Umas e outras reclamam justiça e apoio. Passou o tempo das palavras ocas; quem tiver tribuna e voz, abstenha-se de apelos genéricos a princípios éticos. Os bispos deveriam denunciar esta barbárie com a mesma contundência com que condenam outros atentados. Políticos e sindicalistas, como fazem outras vezes, também agora deveriam deixar de lado as suas divergências e unir-se para repudiar a dispersão. Se demonstrassem relativamente à violência prisional a mesma contundência e determinação que utilizam face a outras violências, a política penitenciária não gozaria de tanta impunidade.

780 militantes em reflexão permanente podem trazer-nos chaves de grande utilidade para o presente e o futuro do nosso povo. Desde as suas masmorras – ali fechados vinte horas por dia – lutam, constroem e sonham. “Não vos vamos deixar ficar mal”, escrevia uma presa amiga. Será tão expressivo o nosso compromisso? Cabe-nos a nós girar as portas dos presídios. À beira da festa, uma saudação afectuosa a todos os presos políticos do mundo; ainda cativos, continuam a lutar por uma sociedade mais justa. Saudação carregada de cumplicidades e afectos para os 780 paisanos e paisanas. Delas e deles não nos despedimos. Hator etxera! [Vem para casa!] Encontrar-nos-emos no dia 3 nas ruas de Bilbau.

Jesus VALENCIA
educador social

Fonte: Gara

Zuentzat. Maite zaituztegu! Para vocês. Gostamos muito de vocês!

Um abraço para todos os leitores que nos acompanham e, em especial, para os que nos incentivam e acarinham. Urte berri on. Bom ano novo.

O independentismo procura um ponto de viragem perante o bloqueio estatal


Há uma década fê-lo com o PNV e o EA, e há cinco anos com o PSOE. A esquerda abertzale – o independentismo em geral – perfila-se de novo como a única força com interesse e capacidade suficientes para buscar em 2009 um ponto de viragem face ao actual bloqueio do conflito. Um bloqueio imposto pelo PSOE e acatado sem problemas pelo PNV em 2008; a aliança estratégica não escrita entre ambos altera as coordenadas do mapa político basco.

2008 despede-se como um ano de absoluta paralisia no longo conflito entre a Euskal Herria que quer decidir o seu futuro e os estados que não o permitem. O sinal mais claro do bloqueio, e também o mais anunciado, chegou a 10 de Setembro. O Tribunal Constitucional espanhol mostrou, preto no branco, que a única soberania que admite é a do “Povo Espanhol” – em maiúsculas na sentença –, face um “povo basco” em minúsculas e cuja existência põe em causa. Com isso, o Estado espanhol lançava um sinal esclarecedor: nem sequer estava disposto a dar ao PNV um sucedâneo do acordo político que tinha negado à esquerda abertzale. Após 30 anos de Constituição, uma geração inteira, Madrid bloqueia as exigências bascas, uma blindagem a toda a regra, com o PSOE como guia.

Depois de se constatar que desta vez também não haveria desacato, posicionamento, passe foral, desobediência civil, consulta... nem sequer denúncia à Europa, o PNV esgotou a sua última quota de crédito para a quase totalidade dos independentistas do país. Um bloco que se tenta tornar invisível, mas que, apesar de todas as notícias adversas e da impossibilidade fáctica de levar a cabo hoje o seu projecto dentro da lei espanhola, continua assente em níveis superiores a 30%.

2008 retratou o PSOE como um partido timorato, que não pode – ou não quer – afrontar a transição real pendente do modelo de Estado, que se assusta – ou se justifica – com o PP, e que 78 anos depois nem se atreve a reivindicar justiça para as suas próprias vítimas do franquismo.

E o PNV mostra-se tanto ou mais temeroso de uma mudança política real que possa ferir o seu quinhão de poder institucional, mais fragilizado a cada passagem pelas urnas. Um dado: transcorrido ano e meio desde as frustradas conversações de Loiola, os jeltzales continuam sem explicar publicamente por que alinharam com o PSOE e não secundaram as propostas concretas avançadas pela esquerda abertzale para garantir que a independência fosse uma opção real e se pudesse materializar.

Processos encadeados
Com este quadro, o independentismo converteu-se no único sector que não tem nada a perder e antes muito a ganhar. Em 2008 não conseguiu condicionar as posições dos restantes agentes tanto como teria desejado. 2009 chega, portanto, com esse desafio pendente.

Na recta final do ano ouviram-se mensagens que assumem a necessidade de tomar a iniciativa em busca de um novo ponto de viragem que possa conduzir finalmente à solução, com base em toda a experiência já acumulada em processos que se vão encadeando. Não é nenhuma novidade. Na realidade, foi sempre este sector político que se encarregou de mover o debate e de criar novas oportunidades, em ocasiões marcadas por mudanças inesperadas e vertiginosas. Passaram apenas 14 meses entre a fase em que a esquerda abertzale apareceu isolada e quase varrida pelo “espírito de Ermua” (Julho de 1997) e aquela outra em que liderou o Acordo de Lizarra-Garazi (Setembro de 1998). E em plena ilegalização foi capaz de erguer com paciência um novo processo de negociação, que decorreu entre 2005 e 2007.

No primeiro caso, o PNV também foi uma força de tracção. No segundo, esse papel foi desempenhado pelo PSOE. Mas desta vez, vistas as posições de ambos, terão que ser os independentistas – siglas à parte – a manobrar em solitário, pelo menos no início. Dos dois processos anteriores chegam heranças bem fundadas que abrem a porta ao “reatamento” posterior de quem o desejar: o direito a decidir cimentado em Lizarra-Garazi, para o PNV, e o procedimento de negociação de Anoeta, no caso do Estado.

A esquerda abertzale parece disposta a pôr mãos à obra, sabendo que a acumulação de forças obriga ao debate sobre estratégias actuais e futuras. Uma discussão que se fará a olhar para a Europa, o enquadramento natural de Euskal Herria e o cenário em que não deixam de nascer novos estados que tomam a dianteira ao basco. É uma dinâmica sem ritmos fixados nem final escrito. A música e a letra estão por escolher, sem esquecer que tanto o Estado como os bascos pró-espanholistas irão procurar estragar a partitura.

A espiral repressiva
2009 chega com mais presos que nunca e mais partidos ilegalizados que nunca. Uma política eleita pelo Estado espanhol, e também pelo francês, para procurar enclausurar o processo político pendente numa espiral de repressão que se vá retroalimentando.

Seis expedientes abertos

Estrasburgo
A sua decisão sobre a ilegalização pode acontecer este ano. O anúncio de que poderia ser abordada na Grande Sala, em julgamento público, já transtornou a representação espanhola.

Macrojulgamentos
Três macroprocessos totalmente políticos encheram as prisões. Também se ameaça agora julgar a Udalbiltza e o Batasuna; de momento, sem data fixada.

Diálogo
O julgamento de oito políticos por falar de soluções será o nunca visto. Mas uma absolvição implicaria, por seu lado, um apoio expresso a esta via, a única com futuro.

Autarquias
O Governo do PSOE está a pensar no que fazer para arrebatar à esquerda abertzale as 40 autarquias alcançadas pelos votos. Outro tema que dará que falar este ano.

Tortura
As últimas denúncias mostram que a prática é sistemática e vai em crescendo. Madrid promete à ONU que irá mudar, mas a sua credibilidade neste terreno é nula.

TGV
Lakua e Madrid querem acelerar a imposição pela via dos factos do maior macroprojecto conhecido. Em Nafarroa, pelo contrário, a questão do financiamento não está ainda encerrada.

Ramón SOLA

Fonte: Gara

Uma furgoneta armadilhada provoca danos de monta na sede central da EiTB, em Bilbau

O Departamento do Interior do Governo de Lakua confirmou que o atentado cometido esta manhã contra o edifício Bami, que alberga as sedes de vários meios de comunicação, tinha como alvo a EiTB. A furgoneta armadilhada explodiu pouco depois das 11h e causou danos consideráveis nas instalações, que tinham sido evacuadas previamente, depois de os bombeiros terem recebido uma chamada em nome da ETA. Não houve feridos.

Pouco antes das 10h da manhã, os bombeiros de Bilbau receberam uma chamada em nome da ETA em que uma pessoa alertava para a explosão, a ocorrer em menos de uma hora, de um artefacto na sede central da EiTB na capital biscainha. De acordo com o Departamento do Interior de Lakua, o comunicante teria precisado na chamada que a entidade pública basca era o alvo do ataque.
O comunicante teria também informado que numa zona do monte de Arrigorriaga, próxima da estação de tratamento de águas de Venta Alta, se encontrava um homem atado a uma árvore, segundo referem a EFE e a Europa Press.
A Ertzaintza confirmou pouco depois que localizaram, manietada, uma pessoa nesse lugar e nas condições relatadas pelo comunicante, a quem tinham roubado o carro. De acordo com a mesma fonte, os autores do atentado teriam usado o telemóvel dessa pessoa para efectuar a chamada para os bombeiros.

Explosão às 11h03
Três minutos depois das 11h, uma furgoneta explodiu em frente à sede da entidade e causou “importantes danos materiais”, segundo o Departamento do Interior do Governo de Lakua, que confirmou que ninguém ficou ferido na sequência da deflagração.

O veículo, uma furgoneta Citroën Jumpy com matrícula BI-6008-CU, estava estacionado na parte traseira do edifício Bami, que alberga, para além da EiTB, outros meios de comunicação – El Mundo, Deia, Expansión, Antena 3 e Onda Cero.
A fachada do edifício, totalmente em vidro, veio abaixo, e a explosão também provocou o incêndio de uma autocaravana que se encontrava na zona.

Após a deflagração, podia-se divisar uma densa coluna de fumo a partir de diversos pontos da capital biscainha, e um helicóptero da Ertzaintza sobrevoou o local.
Às 12h30, a Ertzaintza levantou o cordão policial na zona da estação da Termibus mas mantinha vedado o acesso aos arredores do edifício e aos lugares mais afectados pela explosão, pedindo ainda aos moradores da zona para se manterem em casa, por precaução.

ETB e Rádio Euskadi, obrigadas a emitir música
Tanto a ETB como a Rádio Euskadi se viram obrigadas a emitir música ainda antes das 11h, quando, após o aviso de bomba, os seus trabalhadores foram evacuados. Os noticiários da televisão serão emitidos desde as instalações de Miramon, segundo avançou o membro da direcção da EiTB Andoni Aranburu à Euskadi Irratia.

Notícia completa: Gara

segunda-feira, 29 de dezembro de 2008

Questão de oportunidades

O primeiro-ministro espanhol, José Luis Rodríguez Zapatero, proclamou, com ares de manchete, que “já não haverá mais oportunidades para a ETA”. Segundo Zapatero, o regime espanhol abriu negociações com a organização armada basca em três ocasiões e das três saiu escaldado. Não haverá, pois, um quarto processo.

A manchete trabalhada no laboratório de propaganda de Rubalcaba assemelha-se à da sentença que presidia à entrada do inferno de Dante: “Deixai toda a esperança, ó vós que entrais!”. E soa, talvez por isso, a artificial. Não foram só três as vezes que a ETA e o Governo espanhol mantiveram encontros ao mais alto nível e também não se pode aceitar que a boa fé para resolver o assunto tenha guiado os delegados governamentais. Da outra parte nunca ouvimos ou lemos o contrário.

Mas chegados a este ponto, quando Zapatero sentencia o seu particular “nunca mais”, é oportuno parafrasear Ibarretxe perante os atentados da ETA: Porquê? Para quê? E responder nos mesmos termos: para nada. Por que diz Zapatero o que diz, sabendo que é razoavelmente impossível que ele possa garantir tamanha asserção? (É preciso pensar que não pensa continuar no posto pelos séculos dos séculos). Leiam qualquer manual de contra-insurgência ou o tratado de guerra psicológica e encontrarão a resposta no primeiro capítulo. Para que o diz? Continuem a ler o mesmo manual e prestem atenção ao que se diz sobre a necessidade de aparentar imbatibilidade, dar moral às tropas e procurar o colapso anímico do inimigo. Não há mais. E, sobretudo, apliquem a máxima de Ibarretxe: para nada. Zapatero, como González ou Aznar, sabe que o Estado espanhol não alcançará estabilidade política nem homologação democrática enquanto não abordar com vontade de resolução o conflito basco. Sabe Zapatero, além do mais, que essa negociação inevitável assenta em dois pilares que o mesmo assinou por procuração: o reconhecimento de Euskal Herria e o seu correspondente caderno de direitos. Sabe mais. Sabe que o Governo que o quiser resolver terá que negociar com os Bascos, abrir a fivela do corpete constitucional e falar também com a ETA. Zapatero manipulará os tempos, Rubalcaba as sondagens, carregarão no acelerador repressivo em função dos seus interesses e hão-de manter a chantagem penitenciária. Mas chegará o dia em que hão-de decidir que o interessante (por razões de oportunidade e de interesse) é sentar-se, dialogar e chegar a um acordo. Antes hoje do que amanhã. Estou seguro.

Martin GARITANO
jornalista

Fonte: Gara

Baía de Pasaia, a emboscada impune


Emboscada e fuzilamento. Foi com estas palavras que os dois sobreviventes definiram os acontecimentos daquela noite de 1984, em que os focos policiais dissiparam a escuridão e as águas se tingiram de sangue. A investigação reabre-se agora.

Corria o mês de Março de 1984 quando Jose María Izura, Pelu; Pedro María Isart, Pelitxo; Rafael Delas, Txapas; e Dionisio Aizpuru, Kurro, membros dos Comandos Autónomos Anticapitalistas morreram crivados de balas pela Polícia espanhola. Emboscada na baía de Pasaia. Com esta designação passou para a memória colectiva um dos episódios mais negros da história recente de Euskal Herria e um facto que os mais jovens talvez só conheçam através da canção dos Barricada: «Detrás del uniforme queda el anonimato/en el cuartel un brindis/esta vez fueron cuatro» [Por trás do uniforme fica o anonimato/no quartel um brinde/desta vez foram quatro].

Quase 25 anos depois, não foram apuradas responsabilidades sobre aquelas mortes mas existe um raio de luz que ilumina a esperança dos familiares dos falecidos, e a de Joseba Merino e Rosa Jimeno, únicos sobreviventes. É que proximamente os então responsáveis da Brigada de Informação Central e Provincial – de Gipuzkoa – da Polícia espanhola vão prestar declarações.

Depois de três suspensões do caso e meses de inactividade, parece que o processo volta a estar na agenda do Tribunal de Instrução número 2 de Donostia. No entanto, Merino não duvida de que existe um “boicote” a este caso, e refere como dado esclarecedor que passam meses e meses entre cada uma das diligências. O advogado, Santiago Gonzalez, quer mostrar-se mais esperançado e insiste que, “embora pareça difícil, temos a mesma vontade que no princípio de chegar até ao fim”.

Olhando para trás

O GARA reviu o caso com a sua ajuda. Tudo começou a 18 de Março de 1984, quando Rosa Jimeno foi presa pela Polícia espanhola. A detenção ocorreu em Donostia, na praça XII, quando a jovem oriotarra se aproximava do seu veículo. Mas ninguém soube da sua detenção.

Quase 25 anos mais tarde, Jimeno relembra, ainda abalada, aqueles dias. Refere com detalhe como sob tortura, e colocando-lhe uma pistola na nuca, a obrigaram a telefonar para casa e para o trabalho para dizer que não iria aparecer durante uns dias. Os agentes obrigaram-na a usar a desculpa de que tinha que ajudar uma amiga grávida, pelo que estaria alguns dias fora de casa.

Os seus pais conheciam-na demasiado bem para não desconfiarem da chamada. Inclusive dirigiram-se até à esquadra para perguntar pela sua filha, mas a detenção foi registada com uma identidade falsa, pelo que o nome de Rosa Jimeno não figurava ali. “Queriam manter a detenção em segredo... no fim de contas foi um sequestro”, afirma ela e também Joseba Merino.

No momento da detenção, a jovem levava consigo um número de telefone que pertencia à casa de Ziburu em que se encontrava o seu companheiro Dionisio Aizpuru, Kurro. Rosa diz que a tortura da Polícia espanhola não cessou até conseguirem que a jovem combinasse um encontro com Kurro.

Estava já tudo a postos para a emboscada. O encontro tinha sido marcado para 22 de Março, às 22h, nuns rochedos próximos do porto da baía de Pasaia. Três sinais de luz, usando uma lanterna, seriam o combinado para indicar que o lugar “estava limpo”.

No dia 22 de Março, por volta das 19h, os cinco jovens e a cadela de Merino, Beltza, fazem o percurso desde Ziburu numa lancha tipo Zodiac. Todos vestiam fatos salva-vidas, como medida de protecção, o que os impedia de trazer armas por cima.

Quase ao mesmo tempo, Rosa é levada pela Polícia para o sítio combinado. Antes, contudo, ao sair da esquadra pode observar os preparativos da operação. “Havia muito movimento e os polícias, todos com coletes à prova de bala, pegavam em armas atrás de armas... Eu fiquei bastante nervosa e perguntava-lhes, tão inocente, para que queriam aquelas armas, ao mesmo tempo que lhes gritava que me tinham prometido que só os iam prender”, relata, ainda comocionada pela lembrança.

Precisamente quando começa a escurecer, os agentes levam-na até ao lugar combinado. Descem-na até às rochas e atam-lhe as pernas com uma corda. O polícia que segurava a outra ponta da corda, e que a devia puxar, permanece escondido.

Chega a hora e a barca aparece na baía pasaitarra. Os seus cinco tripulantes vêem Rosa ao longe e a lanterna que traz faz o sinal concertado. “Tudo parecia normal e aproximámo-nos”, recorda Merino.

Em poucos segundos a tranquilidade da noite vai desaparecer, a escuridão será dissipada pelos potentes focos da Polícia e o mar tingir-se-á com o vermelho do sangue. Pesem os 24 anos e meio passados, a memória de Merino não conseguiu apagar nem um só detalhe daquela noite e assim o relatou ao GARA.

Era ele que conduzia a embarcação. Já com o motor em ponto morto e as amarras lançadas, todos os militantes se preparam para desembarcar. Os primeiros a descer da zodiac são Pelitxo e Kurro, que conseguem aproximar-se de Rosa e ficar junto dela. O terceiro a descer será Joseba Merino... mas já não há tempo para mais.

Segundo relata, encontrava-se inclinado, a pegar na sua cadela para a passar a Kurro, que esperava já do outro lado. “Então – prossegue –, pudemos ver como se retesava uma corda que imobilizava a Rosa e como ela caía subitamente no chão. Foi nesse momento que se ouviu um ‘Alto, Polícia!’ e tudo ficou iluminado. De seguida, sem haver tempo para nada, ouviu-se um disparo isolado, e logo uns 20 txakurras [cães, no caso, polícias], ou mais, começaram a disparar”.

Merino relata que tanto ele como Txapas e Pelu, que ainda se encontravam na embarcação, saltam para a água para se proteger dos disparos. Na primeira rajada, no entanto, já caem mortos dois dos militantes dos Comandos Autónomos Anticapitalistas: Pelitxo, que estava em solo firme; e Pelu, na água.

Assim que as armas se silenciaram duas embarcações da Guarda Civil – corpo responsável pelas actividades subaquáticas e que apoia a operação – começam a aproximar-se desde o outro lado, desde Pasai San Pedro. Merino recorda que os botes contavam com potentes focos para a busca.

Apesar de nadar umas braçadas debaixo de água e conseguir esconder-se entre umas rochas, Merino indica que a sua tentativa é inútil: “Localizaram-me com as metralhadoras e fizeram-me sair da água, subir para as rochas e pôr as mãos sobre a cabeça, junto a Pelitxo”, refere.

Poucos minutos passados, segundo recorda o donostiarra, uma embarcação da Guarda Civil traz Txapas, que também obrigam a subir às rochas, ao pé deles.

Os três permanecem com as mãos na cabeça até que um agente os obriga a identificar-se. Merino recorda que foi depois de dar o seu nome que o afastaram dos seus companheiros. “Os polícias estavam muito nervosos, e, com insultos e ameaças, disseram-se que me afastaria uns metros”, rememora. Precisamente nesse momento, segundo relata, três polícias vestidos à paisana aproximam-se de Txapas e Pelitxo: “Ficaram a menos de um metro e levavam duas metralhadoras – uma Ingram 10 e uma UZI – e uma espingarda”, precisa. Merino indica que os seus companheiros não articularam uma palavra nem fizeram qualquer movimento: “Só se ouviu ‘vão morrer’... e abriram fogo”.

Merino sublinha que não esperava tal coisa. “Por essa alturas imaginávamo-nos presos, torturados e muitos anos na prisão, mas não pensávamos que podíamos morrer daquela maneira”, ressalta.

Os corpos sem vida dos dois jovens sucumbem e caem à ria pela força das balas que os atingem. A Merino, custa-lhe conter a emoção: “Tinham fuzilado os meus companheiros, foram muitas as balas que atingiram os seus corpos”. Dias depois, a autópsia contaria 113 projécteis encontrados nos corpos sem vida dos quatro militantes dos Comandos Autónomos Anticapitalistas.

Consumados os fuzilamentos, Merino recorda que foi arrastado por um caminho, onde o algemaram. Ali pôde observar um casal que também estava retido pela Polícia. Depois soube que estavam a passear por ali no momento em que a polícia tomava a zona e que tinham sido retidos antes da emboscada, para evitar qualquer fuga de informação.

Rosa Jimeno, por seu lado, não pode ver nada, já que continua retida, de pistola apontada, de boca para baixo. Entra em grave estado de choque mal ouve os disparos, e desata a gritar. Perto do local onde se encontra, vão-se juntando os curiosos. A escuridão e a localização afastada do enclave não lhes permite ver os acontecimentos, mas podem lançar o alerta sobre a situação em que Rosa se encontra. Os vizinhos chegam a pedir aos polícias, que mantêm o acesso cortado, uma ambulância para que a jovem receba assistência.

Quando tudo acaba, duas viagens de lancha transportam os quatro detidos, Merino, Jimeno e o casal de testemunhas, para o outro lado da costa, situada em Pasai San Pedro.

Os corpos sem vida dos quatro jovens são transportados para o Comando da Marinha, onde permanecem até serem levados para o depósito de cadáveres do cemitério donostiarra de Polloe. Desta forma, passa-se por cima do procedimento judicial regular, que estabelece que o levantamento dos cadáveres deve ser feito no lugar dos factos por um juiz forense, para esclarecer, mediante um processo de investigação, os motivos do falecimento.

A Rosa, levam-na directamente para a esquadra da Polícia espanhola em Donostia. No dia seguinte é transferida para Madrid, e, depois de 11 dias sob incomunicação, passa pela Audiência Nacional espanhola. Passa todo o período de incomunicação perguntando pelo estado dos seus companheiros. Asseguram-lhe que estão vivos. Não saberia a verdade até chegar à prisão, onde permaneceu mais de três anos.

Oihana LLORENTE

Ver ainda, na continuação deste texto, em castelhano: «Uma operação bem montada», «“Vingança” pela morte de Casas» e «Um processo interminável»
Fonte: Gara

Várias iniciativas a favor dos presos e manifestação em Algorta contra a tortura


Marcha anual a Langraitz e outras “marchas”

Durante a época de Natal multiplicam-se as iniciativas de apoio aos presos bascos que não podem passar estes dias com as suas famílias. Um exemplo é a marcha anual a Langraitz, que ocorreu ontem pelas 12h. Os participantes aproximaram-se desde o monte e fizeram-se notar não só com gritos de apoio mas também com foguetes. Exibiam ainda ikurriñas e bandeirolas a favor da repatriação.

Nesta edição deu-se destaque à reivindicação de liberdade para os presos doentes. Quatro foram levados para casa nestas semanas, mas os restantes continuam presos. Mostraram uma faixa com o lema «Gu Langraizera, gaixo larriak etxera» [Nós até Langraitz, os presos doentes para casa].

De Arrosadia a Madrid
Um dia antes, no sábado, cerca de 25 moradores de Arrosadia deslocaram-se de autocarro até Madrid, para visitar as prisões em que os seus conterrâneos se encontram presos. Levavam megafones e iam acompanhados de zanpantzarrak para poder transmitir o seu encorajamento no maior volume possível. Começaram em Soto del Real, passaram depois por Valdemoro e terminaram na prisão de Alcalá-Meco.

Neste fim-de-semana 15 jovens de Añorga terminaram um jejum que vinham mantendo a favor dos presos. No sábado, em Trapagaran, 50 pessoas participaram numa mobilização de apoio aos presos doentes, a que se seguiu um bertso-afari [um jantar com bertsos].
As mobilizações continuarão nos próximos dias, relacionadas com o ano novo, e terão como ponto culminante a manifestação nacional convocada pela Etxerat para sábado, em Bilbau, e que se prevê que seja amplamente participada.

Fonte: Gara

Em Algorta: lembram que «o silêncio contra a tortura só gera cumplicidade»

Cerca de 500 pessoas percorreram ontem o centro de Algorta para lembrar as últimas denúncias de tortura policial e deixar claro o silêncio de que fazem gala os principais partidos políticos e meios de comunicação ante este tipo de práticas. A marcha foi parada durante vários minutos por cinco furgonetas da Ertzaintza e os manifestantes, filmados pelos agentes.

A manifestação convocada era a resposta às últimas denúncias de torturas contra cinco dos seis detidos há duas semanas em Irun e na Bizkaia, e tinha também por objectivo trazer à luz as 64 denúncias formais de maus tratos contabilizadas durante este ano.
Os convocantes da manifestação centraram as suas críticas nos principais partidos políticos e nos grandes meios de comunicação, que acusaram de estar “surdos, cegos e mudos ante esta realidade selvagem”. E acrecentaram: “Como é que se pode entender a atitude dos meios de comunicação face às denúncias de cinco pessoas?”. Para o Movimento Pró-Amnistia, “o silêncio só gera cumplicidade”, e por isso incide na noção de que “a pressão popular será indispensável para acabar com a tortura”.

Notícia completa: Gara

Em Iruñea, a Polícia espanhola leva muito a peito o espírito da quadra


Na Txantrea tentaram impedir a actuação de um grupo coral pró-presos, enquanto em Iturrama irromperam no bar Ezpala.

A Polícia espanhola procurou estragar um evento já tradicional no calendário natalício da Txantrea. O grupo coral pró-presos que percorre o bairro mostrando a sua solidariedade com os familiares dos perseguidos políticos voltou a ser importunado por agentes espanhóis. Na sequência de uma discussão, a polícia chegou mesmo a dissolver o grupo coral. Mas, depois de deixarem passar alguns minutos, as pessoas que participavam na actividade solidária voltaram-se a juntar e conseguiram prosseguir a sua actividade sem problemas de maior.

Já em Iturrama os agentes pegaram-se com o bar Ezpala. Entraram no estabelecimento e identificaram as 50 pessoas que ali se encontravam. Um jovem levou um soco na cara, mas o seu estado não é grave. Os agentes levaram uma "lata" pró-presos e as fotos dos perseguidos políticos do bairro.
O bar Ezpala tem sido vítima do acosso policial desde a sua abertura, e também já sofreu uma agressão fascista. Neste local, junta-se uma boa parte do movimento popular do bairro.

Fonte: apurtu

sábado, 27 de dezembro de 2008

Milhares de pessoas pediram a oficialização das selecções bascas em Bilbau

Milhares de pessoas reivindicaram esta tarde em Bilbau a oficialização das selecções bascas, numa manifestação convocada pela ESAIT e apoiada por outros 27 colectivos de diversos âmbitos sociais.
A manifestação foi convocada depois de no dia 23 de Dezembro a selecção basca não ter jogado o encontro amigável contra o Irão, em San Mamés, como protesto contra a designação “Euskadi”, em vez da de “Euskal Herria”.

A manifestação começou às 17h45, percorrendo a rua Autonomia, uma das principais artérias da cidade, e a Hurtado Amezaga antes de terminar junto ao Município de Bilbau.
Uma grande ikurriña seguia à cabeceira da mobilização, e depois dela vários desportistas, como o surfista Kepa Acero ou a futebolista da equipa feminina do Athletic de Bilbau Eva Ferreira, levavam uma faixa em que se lia «Euskal Herria nazio bat, selekzio bat, federazio bat» [País Basco, uma nação, uma selecção, uma federação].

Nas imediações da Câmara Municipal de Bilbau, onde a marcha terminou, o ex-guarda redes da Real Sociedad e do Eibar, que milita actualmente na equipa francesa do Aviron Bayonnais, leu um comunicado de apoio à oficialização das selecções.

A porta-voz da ESAIT, Itziar Arratibel, por seu lado, afirmou em declarações aos órgãos de comunicação que, para poder “competir a nível internacional”, é “indispensável a criação de estruturas que aglutinem os desportistas de Euskal Herria inteira, ou seja, federações nacionais que agrupem os sete territórios”.
Arratibel destacou que, “em colaboração com os desportistas”, a Esait dará impulso à criação de “competições que tenham Euskal Herria como base de actuação”.

Também acorreram à manifestação representantes das principais equipas de futebol bascas, como o jogador da Real Sociedad Jon Ansotegi, o do Deportivo Alavés Gaizka Garitano ou Joseba Garmendia, do Athletic de Bilbau, entre outros.
Para além disto, entre os colectivos que deram o seu apoio a esta manifestação encontram-se formações políticas como o Eusko Alkartasuna, o Aralar, a esquerda abertzale e o Abertzaleen Batasuna; ou os sindicatos ELA, LAB, ELB, HIRU ou STEEILAS.

A negativa dos futebolistas
No dia 13 de Novembro, 165 futebolistas de elite, entre os quais se contavam todo o plantel do Athletic e os jogadores seleccionáveis da Real, do Alavés e do Eibar, assinaram um documento, apoiado a 3 de Dezembro por um outro subscrito por 798 desportistas bascos, em que anunciaram que não jogariam o já citado encontro sob a designação de “Euskadi”.

Fonte: Gara

Fotos: EFE, KaosenlaRed e Argazki Press


No vídeo, imagens da manifestação e excerto da intervenção da porta-voz da ESAIT, Itziar Arratibel.
Gora Euskal Herria!

Em Nafarroa, o apoio aos meios ‘euskaldunes’ cai dos 310 000 para os 9567 euros

Topagunea, a federação que reúne os meios euskaldunes em Nafarroa, mostra-se decepcionada pelo facto de “as palavras dos representantes dos vários grupos terem ficado sem efeito”. Quase sem debate e de uma penada, o orçamento aprovado na terça-feira por UPN, CDN e PSN liquida praticamente os subsídios públicos a rádios, televisões ou revistas em euskara. O corte é de 96,7%.

Miguel Sanz anunciou-o no início do actual ano legislativo, na mesma entrevista em que iniciou o caminho para a ruptura entre a UPN e o PP. Afirmou que o dinheiro dedicado ao euskara era “excessivo” e que via com bons olhos destiná-lo ao que denomina como “línguas comerciais”. E o melhor expoente desta decisão política é a anulação prática da ajuda orçamental aos meios de comunicação em euskara.

Apesar do corte brutal, a questão passou sem causar grande rebuliço no plenário do Parlamento navarro que debateu e aprovou o orçamento nas sessões de segunda e terça-feira. Mas os números são esclarecedores: a quantia desce dos 310 000 euros atribuídos em 2007 para os 9567. Um corte de 96,7%.

Os meios euskaldunes ressaltam que, com essa verba, nem sequer se consegue pagar o salário anual a um único dos cerca de 60 trabalhadores com que todos estes órgãos contam.

Dez anos de cortes
A supressão efectiva desta verba põe fim a uma década de cortes paulatinos ou de promessas não cumpridas. Faz agora um ano, numa altura em que o Governo de Sanz apresentava uma posição menos negativa relativamente ao euskara, adornada com a criação do Euskarabidea, foram atribuídos 310 000 euros a estes meios de comunicação. Contudo, a meio do ano a verba ficou bloqueada, com a desculpa da quebra de receitas fiscais derivada da crise económica, como ocorreu a tantas outras destinadas ao Instituto Navarro do Euskara. Já em Novembro, o seu director, Xabier Azanza, anunciava que se tinha conseguido recuperar parcialmente esta quantia – apenas 240 000 euros, sendo que 70 000 (23%) tinham ficado pelo caminho. Este corte na verba inicialmente orçamentada deixou sob suspeita a defesa feita pelo Euskarabidea relativa às ajudas para 2008, nas quais estaria contemplado um interessante aumento.

Mas as restrições constantes já não são de agora, e, entre 1999 e 2008, os cortes acumulados foram de 16%. Os cortes dessa época ou o incumprimento deste exercício parecem agora, logicamente, quase um incidente menor à vista do orçamento para 2009.

Cinco ofertas em saco roto
A Topagunea expressou numa nota a sua frustração pelo resultado do debate: “Cumpriram-se as piores expectativas”. E especialmente depois de no passado dia 18 ter participado numa sessão de trabalho à porta fechada na Comissão de Educação do Parlamento, na qual ouviu belas palavras da parte de “vários grupos”, que “ficaram sem efeito”.

“Nessa sessão fizeram-se cinco pedidos que se podem resumir num só: pedimos que os meios de comunicação sejam tratados com dignidade” – avança a federação euskaldun. “Para tal, é necessário que os orçamentos incluam verbas que respondam às suas necessidades reais, que os meios em euskara possam ter publicidade institucional como qualquer outro, atribuir ao Euskarabidea funções e verbas adequadas para a realização do seu trabalho e criar uma base de colaboração estável entre o Governo e os meios de comunicação. Juntamente com estas exigências, oferecemos a nossa colaboração. A tudo isto o Parlamento disse que não”.

Ramón SOLA

Notícia completa: Gara

sexta-feira, 26 de dezembro de 2008

‘Euskal Herria, nazio bat, selekzio bat, federazio bat’


«País Basco, uma nação, uma selecção, uma federação» é o lema da manifestação convocada para amanhã em Bilbau pela ESAIT, plataforma de apoio às selecções bascas, e que partirá da Praça Aita Donosti às 17h30. Denok Bilbora! Todos a Bilbau!

'Gabonetako ekimenak': centenas de iniciativas a favor dos presos políticos


Nesta época do ano – Gabonak –, são às centenas as iniciativas levadas a cabo em diversos pontos de Euskal Herria em defesa dos presos políticos bascos.

Neste domingo, haverá ainda uma marcha reivindicativa até ao estabelecimento prisional de Langraitz, convocada pelo Movimento Pró-Amnistia, para exigir a libertação dos presos com doenças graves. Apesar da libertação de quatro presos doentes nos últimos dias, que foi saudada pelo EPPK (Colectivo de Presos Políticos Bascos), existe ainda um grupo considerável de presos políticos nestas condições e que, de acordo com a legislação vigente no Estado espanhol, deveria estar em casa.


Para mais informação, ver: askatu.org

terça-feira, 23 de dezembro de 2008

Parot e o processo judicial


Em jeito de balanço do ano que caminha para o seu termo, Alvarez-Solís considera que este foi “um mau ano”. Para além das crises políticas e económicas, o jornalista madrileno vê na «doutrina Parot» a evidência da dissolução da justiça, mesmo no sentido limitado que tinha até agora. Por isso conclui que “o regresso à história anterior à Revolução Francesa ocorre com toda a nitidez”.

Foi um mau ano, o que acaba. Durante o seu transcurso derrubaram-se muitas estruturas morais edificadas com sangue, suor e lágrimas ao longo de dois séculos. Está-se a afundar o estado do bem-estar, naufraga a economia de mercado, desaparece o Direito internacional, deixam de reger os respeitos da cidadania, as normas laborais tornam-se irracionais, quebram-se as cautelas na administração da justiça, o ar da democracia rarefaz-se, rasgam-se violentamente as veladuras próprias da liberdade, retorna o poder ao exercício de cínicas brutalidades, corrompe-se a linguagem, conformam-se as consciências...

Um mau ano fechado com uma chave apócrifa.

Talvez o mais grave seja o desaparecimento da justiça como pretensão de amparo. Um desaparecimento radical, escandaloso. Sobretudo, abrupto. Os tribunais sempre infundiram temor aos cidadãos como instrumentos de classe, mas neles, e falo desses dois últimos séculos, branqueava-se de algum modo o constante agravo forense dos poderosos aos mais fracos. Os hierofantes explicavam o seu papel. Não se administrava justiça verdadeira, mas lia-se as leis com uma certa elegância. Os tribunais eram essa reverência feita aos que nada podem por parte de quem pode tudo. O engano era prudente e as sentenças emanavam com uma cadência medida. O Estado enaltecia-se com o sum cuique tribuere, o dar a cada um o seu, cerne da justiça distributiva. Depois o Estado era de quem era, mas procurava retribuir-nos com uma pretensa igualdade.

Que foi de tudo isto que constituiu uma espécie de pacto para que uns matassem com cartilha de urbanidade e outros morressem com a esperança na sua luta pelo progresso humano? Nem sequer sobreviveu o estilo. A violência do poder não se veste hoje com a pretensão das ideias, ainda que sejam maliciosas, mas com o andrajo imundo da necessidade administrativa. Maquiavel já não é o fino e retórico depositário de uma trabalhada pretensão utilitária mas antes um falsificador suburbano de identidades. Custa muito para quem dedicou a sua vida a um combate com armas limpas ver-se no ringue emporcalhado de uma batalha repugnante. Com Shakespeare “a reputação é o alívio dos tontos”, mas a que chamamos agora reputação? Como se adquire e de quem é alívio? Não de tontos, certamente.

Possivelmente, a estocada final dada a uma justiça pretensamente discreta e com oficio de majestade nos juízes tenha acontecido com a «doutrina Parot», que procura converter os benefícios penitenciários numa nova fonte de escândalo. A «doutrina Parot» transforma a pena ditada numa decisão viciosa por elástica, que pode ser utilizada pelos juízes até lograr de facto a pena perpétua, que inclusive já não se encontra no limite cruel dos trinta anos mas nos quarenta, por ter substituído significativamente a pena de morte, mas de uma morte ainda mais grave que a física no patíbulo, porque falamos de uma morte de desestruturação do indivíduo, de esvaziamento da sua alma. É a tortura final que, tantas vezes, sucede à tortura primeira numa época que regressou às piores lonjuras da história. Acerca deste tipo de penas, escutemos as palavras da magistrada Garbiñe Biurrun, do Tribunal Superior de Justiça do País Basco, que fala com uma difícil transparência: “Quando o preso cumpriu entre 15 e 20 anos de prisão, a sua personalidade desestrutura-se psicologicamente, perdendo valores e a noção da realidade. Isto atenta muito gravemente contra a dignidade da pessoa. Trata-se de uma pena desumana”. E acrescenta, a brilhante e equilibrada juíza: “Na minha opinião é evidente que os critérios jurídico-penais que a Audiência Nacional está a utilizar são muito regressivos e perigosos”.

Isto é, mais uma vez voltamos a falar de tortura. Pode-se conceber neste momento, e com isso abre-se melancolicamente o ano novo e quase o século; pode-se conceber que tenhamos retrocedido aos tempos da tortura como procedimento inquisitorial e base frequente da administração de justiça? É inútil que as autoridades políticas, como são no Estado espanhol as representadas nos Governos do PP ou do PSOE, desmintam a existência de uns protocolos fácticos de tortura. Tortura física, insuportável, ou tortura psicológica, também intolerável. Essas torturas existem em muitos casos. E são sempre negadas. São torturas que começam nas detenções fora do âmbito físico policial e continuam, como vimos, na aplicação das penas. Não se trata já de acusar, porque o mundo admite esses procedimentos, mas de apreciar o dano social e moral que as torturas produzem no tecido da cidadania, que se degrada por um mecanismo de contaminação. Se tortura a autoridade, e agora falo do mundo, por que não há-de torturar o indivíduo que tem capacidade material para o fazer? Envenenaram a água e desse rio bebemos todos. A sociedade está-se a degradar até ao extremo de o vice-presidente ou o secretário da Defesa norte-americanos, fazendo resguardo de memória no que se refere ao protagonista das declarações, ter chegado a afirmar que o uso do saco para provocar a asfixia no detido não causava danos sensíveis e encurtava o interrogatório. Monstruosidade tremenda!

Mas voltemos à «doutrina Parot» e a reflectir sobre algumas das suas consequências. Da aplicação da «doutrina Parot» podem deduzir-se algumas escandalosas consequências.

Primeira – A pena ditada depois da audiência oral fica praticamente imprestável se aceitarmos que a sua aplicação pode ser agravada pela administração penitenciária mediante manipulações como um castigo variado aos presos e pela incerteza com que a concessão dos benefícios penitenciários pode ser aplicada pelos juízes.

Segunda – A «doutrina Parot» destrói o carácter literal da sentença que fixa o encarceramento efectivo num determinado número de anos; encarceramento que pode ir até aos trinta ou quarenta se os magistrados decidem aplicar o castigo substitutivo da pena de morte.

Terceira – A aplicação dos critérios Parot invalida a segurança processual ao deixar a sua culminação, que é a pena, num horizonte inconcreto e, portanto, do qual se pode dificilmente recorrer.

Quarta – A «doutrina Parot» declara subjacentemente que na finalidade da pena não entra a possível redenção do delinquente mas um espírito de vingança tão visível como primitivo.

Talvez de todos estes pontos convenha deduzir a invalidez do processo como veículo para estabelecer solidamente a pena. O encarceramento do suposto delinquente ficará dependente de muitos acasos, a começar no peso absurdo das actas policiais como prova em julgamento e a terminar na sentença repleta de névoa no que respeita à sua duração efectiva. O que parece evidente é que os tribunais perdem o seu valor de independência para retornar à realidade dos juízes reais que, ao dependerem da vontade mutável do soberano, convertiam a pena num simples castigo emanado da vontade julgadora, sem que as leis servissem de rumo com qualquer validade. Em resumo, pode-se afirmar que o regresso à história anterior à Revolução Francesa ocorre com toda a nitidez.

E então, face a este panorama, o que têm a dizer os parlamentos, os governos e a magistratura? Pois nada dizem.

Pela nossa parte, zorionak eta Eguberri on [felicidades e bom Natal].

Antonio ALVAREZ-SOLÍS
jornalista

Fonte: Gara

Treinar com bombas não tem nada a ver com violência

Tasio-Gara (As Bardenas até 2028 [legenda nossa])

Nas Bardenas ensaia-se para matar em grande escala, mas falam-nos do ruído. Os gritos das vítimas dos bombardeamentos da NATO não se ouvem no Diario de Navarra nem nos gabinetes dos políticos. Isso não é nenhum transtorno.

Claro que não! É preciso ser torto para estabelecer uma relação entre um campo de tiro e a violência! Violência – parece mentira que ainda haja gente que não se tenha apercebido – só há uma, a da ETA. Os exércitos são instituições humanitárias que se dedicam a fazer o bem ao próximo. O Campo de Tiro das Bardenas não tem nada a ver com a violência, nem com a guerra, nem com o sofrimento, nem com a destruição. Que disparate!

Infelizmente, as barbaridades que acabo de escrever não pertencem ao âmbito da ficção. São o discurso dominante na classe política navarra sobre o Campo de Tiro das Bardenas. Com estas ideias deu-se o aval à continuidade deste espaço dedicado ao ensaio de material e técnicas de guerra. Isto é, pretendeu-se ignorar o debate acerca da transcendência de manter no nosso solo um complexo militar destas características.

Conduziram o debate para a questão dos transtornos (segundo o Diario de Navarra, mais pequenos do que os de um aeroporto) ou de contraprestações: o dinheirito assentará bem às instituições que participam na Junta das Bardenas. Mas nem o Diario de Navarra nem os políticos que apoiaram o contrato quiseram assumir o significado de deixar usar parte do nosso território pela máquina bélica da NATO.

A referência aos transtornos, por exemplo, é sumamente esclarecedora. Nas Bardenas ensaia-se para matar em grande escala, mas falam-nos do ruído. Os gritos das vítimas dos bombardeamentos da NATO não se ouvem no Diario de Navarra nem nos gabinetes dos políticos. Isso não é nenhum transtorno. E quanto ao dinheiro, que diferença faz de onde vem ou em troca de quê?

Estas atitudes, num país em que partidos, meios de comunicação e instituições repetem até à saciedade a ideia de que a violência está fora do lugar, não fazem senão retratar a hipocrisia que caracteriza este simulacro de debate acerca dos instrumentos com que cada qual defende as suas ideias ou pretende lograr os seus propósitos. Simulacro, digo, porque é óbvio que ninguém corre qualquer risco se justificar publicamente os bombardeamentos da NATO em Bagdade, mas o que é aconteceria a alguém que ousasse aplaudir uma acção da ETA?

Os mesmos que deram o seu apoio ao Campo de Tiro dizem-nos uma e outra vez que não se pode defender nada com a violência. Que não se pode permitir que continuem nos municípios os que não condenam a violência da ETA. Com base na legitimidade que lhes dá apoiar estratégias de guerra que causaram milhares de mortes, estabelecem uma linha divisória entre eles, os “democratas pacifistas”, e os “violentos”. Clamam contra a perversidade da violência da ETA esquecendo o sangue derramado pelos aviões dos exércitos que se treinam nas Bardenas.

É curioso, o seu conceito de responsabilidade moral. Não condenar um atentado da ETA converte alguém em cúmplice; apoiar um Campo de Tiro ou as invasões do Iraque e do Afeganistão não acarreta, naturalmente, qualquer implicação.

Floren AOIZ
www.elomendia.com

Fonte: Gara

Era hoje o jogo com o Irão: futebolistas bascos exigem avanços reais em direcção à oficialização


A suspensão do encontro entre a selecção basca de futebol e o Irão gerou uma controvérsia que, de forma simplista, muitos reduziram a uma dicotomia entre Euskadi ou Euskal Herria. Na véspera do dia em que se devia disputar esse encontro, o grupo de futebolistas tornou público um novo comunicado e uma cronologia em que se mostra o carácter e o modo de proceder dos futebolistas e da Federação Basca de Futebol no caminho para a oficialização.

A «Euskal Herriko Futbolariak» já tinha anunciado que tornaria pública a sua reflexão no princípio desta semana. Com a declaração da Federação Basca de Futebol (FVF) de 20 de Dezembro na memória, em que se suspendia de forma definitiva o encontro entre a selecção basca de futebol e o Irão, o grupo de jogadores emitiu um comunicado de nove pontos, ao qual se juntou uma cronologia das reuniões entre os futebolistas e a federação no último ano e meio, em jeito de nota de esclarecimento.

A missiva quis vincar as razões dos jogadores, sempre “no caminho para a oficialização”. Assim, os profissionais criticam duramente a FVF pelo seu procedimento face a esta questão, ao “não aceitar nenhum outro nome que não fosse Euskadi, sem qualquer vontade de dar passos em frente”. Para além disso, criticaram a influência da Direcção dos Desportos do Governo de Lakua, que não só apoiou o imobilismo da designação como influenciou a “decisão dos membros que participaram nas reuniões entre jogadores e federação”.

«Ninguém colocou obstáculos»
A nota recorda que a selecção de Euskal Herria se pôde constituir em 2007 “graças ao acordo entre jogadores e federação. Naquela altura, ninguém colocou obstáculos de qualquer tipo, e foi a FVF que, um ano mais tarde e por sua iniciativa, decidiu regressar ao termo Euskadi, rompendo o acordado no ano anterior com o objectivo de continuar a dar passos em frente”.

“Os jogadores sempre mostraram vontade de dar passos no caminho da oficialização de uma selecção de Euskal Herria formada por jogadores dos sete territórios. Mas a vontade não chega, a menos que se cumpram os compromissos adquiridos”.
Por isso, os futebolistas mostraram-se surpreendidos pelo facto de, apesar dos seus insistentes apelos à reunião entre ambas as partes para encontrar uma solução, esta só ter tido lugar seis dias antes da realização do jogo, o que os levou a duvidar da vontade das instituições.

“Que este ano não haja jogo da selecção basca é, sem dúvida, uma má notícia. Não obstante, não há mal que não venha por bem se toda esta controvérsia gerada servir para clarificar as vontades, as acções e o carácter de cada qual, e para destapar a careca de cada um”.
Assim sendo, o grupo de jogadores realçou no seu comunicado que a dicotomia entre Euskadi ou Euskal Herria, a que muitos, de forma simplista, tinham querido reduzir esta controvérsia, “é observar a questão por fora”.“Cremos que há que situar o debate na construção de uma selecção, no momento de estabelecer acordos sobre os passos que há que dar no caminho para a oficialização e, por último, na vontade para cumprir os compromissos estabelecidos em prol do objectivo marcado”.



A reunião de dia 17
Para além disto, a nota dos jogadores mostra com detalhe a reunião e o cruzamento de propostas entre jogadores e representantes da FVF em Durango, no dia 17.
Naquele encontro bilateral, os futebolistas propuseram uma alternativa a Euskal Herria com a designação de Euskal Selekzioa. “Compreendemos – avança o texto – que este nome não pode ter validade daqui para a frente, mas esta proposta implicava pelo menos uma manifestação da nossa boa vontade e disposição. Não obstante, encarámos de frente a rotunda negativa da federação, mesmo sabendo que tal negativa acarretava a definitiva suspensão da partida de dia 23”.

Também quiseram fazer menção à contraproposta da Federação, em que a selecção jogaria sob a designação de Euskadi mas com a inscrição de Euskal Herria na camisola. “Disseram que já tinham as entradas e os cartazes preparados com o nome de Euskadi, o que diz bem da atitude da FVF nesta discussão, e propuseram-nos, no final, jogar com as camisolas que usámos em 2007. Desta forma, reunimo-nos e não considerámos aceitável esta proposta. É que não a vimos como uma proposta de consenso, mas como uma última tentativa para vender as entradas, as camisolas e os cartazes com a designação Euskadi”.

Por último, os futebolistas recordaram que “quase um milhar de desportistas de outras disciplinas, diversos agentes sociais, adeptos... mostraram o seu apoio público às selecções bascas, o que é significativo. Certamente, temos muita pena por ver os adeptos ficarem sem o seu jogo da selecção basca, o mais bonito e especial que jogamos em todo o ano. Estaremos dispostos a colaborar com quem esteja disposto a dar passos pela oficialização. Porque a alegria e a expectativa que cria a selecção de Euskal Herria o merece”.

Reacção de Lakua
A reacção de Lakua chegou pouco depois. A Direcção dos Desportos, criticada pelos jogadores, disse que “apoiou, apoia e apoiará as decisões que a FVF adopte no desenvolvimento das suas competências”.
A partida não se joga porque “os jogadores não aceitaram a proposta da Federação, que é a entidade que representa o futebol basco”, resumiu a entidade dirigida por José Ramón Garai.

Arnaitz GORRITI

Fonte: Gara

segunda-feira, 22 de dezembro de 2008

Festival Hatortxurock 9,5 (Berriobeiti, Nafarroa) - a 10 de Janeiro

Festival musical a favor dos presos políticos e dos seus familiares que se tem vindo a realizar em Nafarroa todos os anos, no final de Dezembro ou no princípio de Janeiro, desde 1999.

Para ver o programa e mais informação: http://www.hatortxurock.org/




Vídeo da 8.ª edição. Como música de fundo, o emblemático tema «Hator, hator», cantado pelos Negu Gorriak.

Hator, hator, mutil etxera! Vem, rapaz, vem para casa!

Na homenagem a Argala, o apelo de Tasio Erkizia à esquerda ‘abertzale’


O histórico dirigente da esquerda abertzale pediu a este sector uma “reflexão” que possibilite “escolher o caminho mais idóneo, o caminho que mais danos cause ao Estado e que conduza este povo a um novo cenário democrático”.

Tasio Erkizia participou ontem na homenagem tributada ao membro da ETA falecido há 30 anos José Miguel Beñaran Ordeñana, ‘Argala’, e pediu uma “reflexão” que possibilite “escolher o caminho mais idóneo, o caminho que mais danos cause ao Estado e que conduza este povo a um novo cenário democrático”. No acto celebrado em honra de ‘Argala’, que decorreu na praça que ostenta o seu nome na sua terra natal, Arrigorriaga (Bizkaia), Erkizia assegurou, fazendo referência a textos do homenageado, que “sabemos que a luta é longa e dura” para lograr o objectivo de “um Estado socialista basco”.

Na sua alocução, que começou com um “Gora gaurko eta atxoko gudariak” (Vivam os gudaris de ontem e de hoje”), o dirigente da esquerda abertzale afirmou que se estão a viver “momentos duros”, em que “é importante ter as ideias claras” e responder-lhes “com tranquilidade e confiança”.

Referindo-se às três décadas passadas desde a morte do membro da ETA, Erkizia referiu que foram 30 anos “com muito sofrimento, com muito esforço, com muito trabalho, e também com erros, mas com uma entrega total”, nos quais conseguiram que as actuais instituições estejam mesmo em crise.

“Agora temos um grande desafio, é necessário dar mais um passo: da resistência, devemos passar à construção – sem a esquerda abertzale não há futuro de Euskal Herria e eles sabem-no muito bem –, temos uma enorme responsabilidade. É altura de reflectir, de continuar a trabalhar com confiança, mas ao mesmo tempo de reflectir, para escolher o caminho mais idóneo, o caminho que mais danos cause ao Estado e que conduza este povo a um novo cenário democrático”. “O nosso objectivo é alcançar este cenário democrático, no qual este povo tenha liberdade para decidir o seu futuro”, acrescentou.

Relativamente à situação política que se vivia no ano da morte de ‘Argala’, reconheceu que não se pôde conseguir então “uma transição democrática”, mas apenas “uma reforma do franquismo”. Contudo, advertiu, “agora volta a surgir a possibilidade de uma segunda transição”. Para Erkizia, estes “30 anos de luta valeram a pena”, porque a transição “criou uma estrutura em que Euskal Herria não existia, tendo a Constituição como pedra angular e os estatutos de autonomia e de amejoramiento como acompanhamento”.

Crise da Constituição e dos estatutos
A luta da esquerda abertzale, prosseguiu, juntamente com a de “tantos outros abertzales e socialistas deste povo que não são da esquerda abertzale, mas que estão sempre prontos para a batalha”, conseguiu “pôr a Constituição e esses estatutos em crise, deixar claro que não garantem o futuro democrático”. Sobre esta questão, denunciou a “estrutura jurídico-política” dos textos constitucional e estatutários, que apenas permite “que se esteja bem em Espanha”. “Senhores, fiquem a saber, não queremos ser espanhóis, queremos ser simplesmente bascos!”, afirmou.

Erkizia também referiu que “a luta da esquerda abertzale fez com que o ELA, o EA e o PNV “tenham reconhecido que este povo necessita de outro marco”, embora considere que a formação jeltzale “se vendeu aos interesses do Estado espanhol”. Depois do discurso de Erkizia, entoou-se o «Eusko Gudariak» (hino do soldado basco) e teve início uma marcha pelas ruas da localidade bizkaitarra.

A homenagem tributada a ‘Argala’ incluiu uma oferenda floral – realizada perante uma foto sua –, dança, bertsos, txalaparta, leitura de alguns dos seus textos e a projecção de um vídeo em que se evocou a sua trajectória de vida. A presidir ao acto esteve, para além da foto citada, um cartaz com o lema «Independentzia Sozialismoa 1949-1978» [Independência Socialismo – com os anos de nascimento e morte]. Nas imediações, tinham-se colocado grandes cartazes com sua imagem, acompanhada da frase «Aitaren etxea defenda nahi dugu. Zure bidea jarraituz» [Queremos defender a casa do pai. Seguindo o teu caminho].
Fonte: kaos.eh

domingo, 21 de dezembro de 2008

Nova ofensiva da extrema-direita contra o «perigoso» Olentzero


Nesta época do ano, o Olentzero percorre Euskal Herria de norte a sul, mas em Iruñea [Pamplona] a trupe da UPN, que gosta pouco de “basquices” – o pai natal é que é! –, quer impedi-lo de desfilar nas ruas de alguns bairros, mais uma vez.
A extrema-direita unionista no Município de Iruñea decidiu proibir os cortejos populares do Olentzero nos bairros de Donibane, Txantrea e Arrosadia.
Aludem ao “carácter reivindicativo” destes actos e apresentam como prova “fotos” obtidas em anos anteriores.
Com esta nova ofensiva contra o Olentzero, são já seis os anos de proibições (em que se inclui o uso de violência contra a população civil desarmada).
Resposta popular...
A Coordenadora de Bairros de Iruñea denunciou a decisão da Direita unionista no Município de Iruñea, liderada pela UPN, de vetar as kalejiras do Olentzero nos bairros de Donibane, Txantrea e Arrosadia, e já pediu ao município que altere o seu posicionamento.

Arnaldo Otegi: «Nafarroa não é o problema, Nafarroa é a solução»


Otegi interveio em Burlata na apresentação do livro La red. El tormento en la España constitucional, de Xabier Makazaga, no âmbito dos eventos organizados para comemorar o 20.º aniversário da editorial Txalaparta. Estiveram presentes mais de 400 pessoas.

Arnaldo Otegi defendeu a criação de um bloco de esquerdas que arrebate a hegemonia tanto ao PNV como à UPN. Do mesmo modo, referiu que a Constituição e a Transição foram desenhadas pela oligarquia espanhola com a ajuda e a colaboração dos EUA. Otegi afirmou que um dos objectivos da “Reforma” era aniquilar ou assimilar a esquerda abertzale – algo que, na sua perspectiva, não conseguiram.

Depois de referir a necessidade de fazer um balanço destes últimos 30 anos e apelar à confiança nas forças da esquerda abertzale, afirmou que, “embora a situação seja extremamente dura, existem boas perspectivas”.
Otegi passou de relance pela conjuntura internacional (mencionando a situação actual da Escócia, Gronelândia, Irlanda, Flandres e verificando o avanço da esquerda na América Latina) e afirmou que a realidade internacional confirma o que a esquerda abertzale sempre defendeu. Por fim, Otegi referiu que “lutam para ganhar” e que este deve de ser o objectivo da esquerda independentista.

Por seu lado, Txelui Moreno, que também fazia parte da mesa, constatou que, de cada vez que se abre a possibilidade de uma mudança efectiva, Navarra converte-se num “laboratório repressivo” e a tortura faz a sua sinistra aparição com mais virulência. Moreno mostrou-se ainda convencido de que o último processo negocial deixou bases importantes para a resolução do conflito.

O advogado de ofício chegou a pedir o «habeas corpus» ao ver o estado dos detidos

Tasio-Gara (Dick Cheney admite o uso de tortura para fazer os prisioneiros confessarem // Mudamos de canal? // Mudamos)

O advogado de ofício que esteve com os detidos durante os dias de incomunicação chegou a solicitar que fossem levados quanto antes à presença do juiz, ao ver o estado em que se encontravam. O juiz Moreno enviou ontem para prisão Arkaitz Landaberea e Julen Etxaniz. June Villarrubia ficou em liberdade e declarou ter sido torturada.

O juiz imputou a Arkaitz Landaberea e Julen Etxaniz um delito de “pertença a grupo armado” e acusa-os de “recolher informação sobre os objectivos da ETA”.
Depois de terem sido presentes ao juiz, deixaram de estar sob incomunicação, mas, segundo fez saber o Movimento Pró-Amnistia, ainda ninguém de confiança os pôde visitar. As mesmas fontes indicaram que, enquanto os presos estiveram sob incomunicação, foram assistidos por um advogado de ofício que, ao ver a sua situação, fez um pedido de habeas corpus para os detidos, ou seja, que comparecessem quanto antes perante o juiz. Entre outras coisas, o advogado observou que Landaberea não parava de tremer.

Entretanto, o magistrado deixou June Villarrubia em liberdade. De acordo com o Movimento Pró-Amnistia, Villarrubia afirmou ter passado “cinco dias de inferno” nas mãos da Guarda Civil. Aplicaram-lhe o saco várias vezes, até não poder respirar, despiram-na e apalparam-na em diversas ocasiões. Puxaram-lhe os cabelos vezes sem conta, balançando-a de um lado para o outro, e obrigaram-na a suportar interrogatórios longos e duros.
A jovem não prestou declarações na esquadra e negou todas as acusações na presença do juiz.

Os três foram detidos na terça-feira passada, na mesma operação em que também foi presa Saioa Urbistazu, jovem que foi posta em liberdade anteontem sem qualquer acusação.
O ministro espanhol do Interior, Alfredo Pérez Rubalcaba, acusou-os de formarem um “comando de informação”. Ismael Moreno denegou a aplicação do “protocolo Garzón” – o tal que nem o próprio aplica.

Fonte: Gara

«Apesar de não sermos da ETA, queriam julgar-nos como se o fôssemos»


Um grupo de dez cidadãs e cidadãos bascos, comprometidos publicamente com organizações políticas e sociais da esquerda abertzale e procurados pelas FSE espanholas, deram a conhecer a sua decisão de ingressar nas fileiras da ETA.

Numa declaração enviada ao GARA, acompanhada da imagem com a cara descoberta de quatro dos dez militantes independentistas – cujos nomes não foram facultados – que tornam pública a sua integração na ETA, estes explicam as razões que estão na origem da sua decisão.
Apresentam-se como “militantes da esquerda abertzale” que, de uma ou outra maneira, participaram na luta em prol de Euskal Herria. “Trabalhámos – acrescentam – em diferentes organizações do Movimento de Libertação Nacional Basco até que polícias armados até aos dentes nos vieram torturar e encarcerar, e vimo-nos obrigados a fugir”.

No texto em euskara reproduzido integralmente nesta página, afirmam que “Euskal Herria não conhece a democracia, não pode decidir o seu futuro”, que “a ofensiva repressiva e a situação anti-democrática que o nosso povo vive continuam a endurecer”, e que “não há liberdade de expressão, não há liberdade de associação, não há liberdade de manifestação, não nos deixam viver como independentistas...”. Neste contexto, criticam a actuação dos “políticos desavergonhados do PNV e do Nafarroa Bai, que, juntamente com os torturadores do PSOE e do PP, nos exigem a condenação da ETA”.

“Face à impossibilidade de continuar a trabalhar nas nossas terras, nas nossas organizações, os signatários desta declaração não têm nenhuma intenção de claudicar, nem de se apresentar à Audiência Nacional. Se o inimigo pretendia neutralizar-nos – advertem –, enganou-se por completo”. Portanto, consideram que não têm outra alternativa “para continuar a lutar”. “Só nos resta fazer frente à razão espanhola das armas com as armas em punho, e fá-lo-emos com determinação!”. “Apesar de não sermos da ETA – realçam –, quiseram julgar-nos e sequestrar-nos como se o fôssemos, mas perante isto não nos acobardamos: como muitas outras pessoas antes de nós, tomámos a decisão de pegar em armas e passar a fazer parte da Euskadi Ta Askatasuna”.

O comunicado termina com um apelo aos cidadãos bascos no sentido “de continuarem a lutar, de forma organizada e comprometida, em prol da liberdade e da reconstrução de Euskal Herria”.
Fonte: Gara

sexta-feira, 19 de dezembro de 2008

Alerta: um cidadão basco foi sequestrado durante várias horas por pessoas que disseram ser polícias


O ataundarra Juan Mari Mujika foi raptado e retido durante várias horas por pessoas que se identificaram como polícias. Foi levado para um bosque de Pagola, onde foi interrogado e ameaçado. A sua advogada apresentou uma queixa no tribunal de Baiona.

O próprio Juan Mari Mujika, a sua advogada, Maritxu Paulus-Basurko, e representantes de associações que trabalham na defesa dos direitos humanos compareceram em Baiona para dar conta do que aconteceu no dia 11 de Dezembro ao ataundarra, quando se dirigiu, por volta das 9h da manhã, à localidade baixo-navarra de Donapaleu para fazer umas compras.

Segundo relatou a sua advogada, quando regressava a casa no seu automóvel, foi abordado por três pessoas que disseram ser polícias e que tinha que ir com elas até à esquadra.

Estas pessoas não mostraram qualquer documento que acreditasse a sua condição de polícias nem armas mas, como se expressavam em francês, Mujika não duvidou do que lhe disseram. Contudo, quando entrou no veículo, deu-se conta do seu “erro”, já que ali estavam outras duas pessoas, que se dirigiram a ele em castelhano.

“Gozaram com ele desde o início por ter metido a pata na poça”, referiu a advogada, que também afirmou que possuíam bastante informação sobre o cidadão basco.

De Donapaleu foi levado até um bosque nas imediações de Pagola. Pararam junto a um lago, onde havia mais carros e pessoas, supostamente polícias.

Ali, meteram-no numa barraca, onde o interrogaram e lhe fizeram “graves” ameaças, em que incluiram a sua família, ao mesmo tempo que o pressionavam para que “colaborasse” com eles.

Os seus sequestradores chegaram a dizer-lhe: “tiveste sorte, se isto fosse há 20 anos, levavas dois tiros na cabeça e estavas despachado”, relatou Maritxu Paulus-Basurko.

A advogada interpôs uma queixa no tribunal de Baiona, pelos delitos de sequestro, ameaças e violência.

Lançar o alerta
Juan Mari Mujika, por seu lado, vive “atemorizado” desde que os factos ocorreram.
Jakes Bortairu, da associação Oroit eta Sala, disse que não têm dúvidas quanto à participação da Polícia francesa na operação e sublinhou que “está na hora de lançar o alerta social”, tendo em vista um facto de tal gravidade. “O que aconteceu é muito grave e todos os cidadãos, toda a sociedade estão em perigo num Estado em que ocorrem coisas como estas”.

Fonte: Gara

Reformados navarros oferecem-se em troca de catorze presos bascos gravemente doentes

A associação de reformados navarros Sasoia escreveu a José Luis Rodríguez Zapatero e Nicolas Sarkozy voluntariando-se para ir para a prisão em troca da libertação de catorze presos bascos que sofrem de doenças graves.

Face à situação em que se encontram catorze presos políticos bascos que sofrem de doenças graves e incuráveis, dispersos por prisões espanholas e francesas, reformados e pensionistas da associação Sasoia de Nafarroa decidiram agir e apresentar-se como voluntários para ir para a prisão em troca da libertação destes presos doentes.

Para isso, no dia 2 de Dezembro enviaram dois textos ao presidente francês, Nicolas Sarkozy, e ao primeiro-ministro espanhol, José Luis Rodríguez Zapatero, nos quais lhes recordam que, de acordo com a legislação de ambos os estados, os prisioneiros que sofrem de doenças graves e incuráveis “deveriam estar em liberdade, para assim poderem tratar os seus males de forma adequada”. Como solução possível, propuseram que catorze membros da associação ingressem na prisão em troca da sua libertação, juntando dados das pessoas dispostas a ser encarceradas. Ontem, informaram que até à altura não tinham recebido qualquer resposta.

“Fazemos-lhes uma proposta baseada, não na sua justiça, mas no mais elementar direito humano, para que desse modo os presos possam ser correctamente tratados e que, rodeados das suas pessoas queridas, possam fazer frente à situação por que estão a passar – que de outra forma se pode tornar irreversível”, vincaram os pensionistas.

Explicaram a sua iniciativa desde o ponto de vista de pessoas mais velhas que, “quando passam por dias com o estado de saúde alterado, sentem a necessidade de acompanhamento por parte das pessoas que os querem e precisam deles”, tendo então assegurado que “já encaram há algum tempo com preocupação a situação dos presos políticos com graves doenças, e que decidiram rebelar-se”.

«Nem Franco se lembrou»
O porta-voz de Sasoia Patxi Erdozain referiu que a experiência acumulada ao longo das suas vidas os levou a concluir que actualmente, “apesar de todos falarem dos tempos obscuros do franquismo como algo superado e exaltarem a Constituição, o certo é que o Estado inventou novas fórmulas de mais intensa repressão de que nem Franco se lembrou”.
“Os maiores transgressores da lei são estas autoridades, pois fazem dela uma chiclete, moldando-a aos seus próprios interesses partidários”, criticaram os participantes.

Asier VELEZ DE MENDIZABAL

Fonte: Gara / Ver também: apurtu

Censura: concerto dos Soziedad Alkoholika suspenso depois dos esforços da AVT

Nem sequer a absolvição por parte dos tribunais, que rejeitaram as acusações da AVT – diziam que os Soziedad Alkoholika eram “simpatizantes” da ETA –, tornou possível a actuação do grupo gasteiztarra fora de Euskal Herria, como desejava a organização do evento, Matarile.

A actuação dos S.A. no Viña Rock estava programada para amanhã, em Leganés (Madrid), apesar do acosso permanente da AVT.
Por fim, a censura imperou e, de acordo com o porta-voz do PP, “graças às diligências efectuadas junto dos proprietários da praça de touros La Cubierta, local do festival”, o concerto foi suspenso, e a pressão, tanto por parte da presidente de Madrid, Esperanza Aguirre, como da AVT e do autarca da localidade, Rafael Gómez Montoya, do PSOE, surtiu efeito.

Fonte: Gara



«Piedra contra tijera», dos Soziedad Alkoholika, banda de Gasteiz, EH.

A Federação Basca de Futebol confirma que não haverá jogo com o Irão


Depois de intensa polémica, a partida de futebol anunciada para a próxima terça-feira no estádio de San Mames (Bilbau) entre as selecções de Euskal Herria e do Irão não se vai disputar.

A selecção de Euskal Herria não vai disputar o já habitual jogo de Natal. Jogadores e representantes da Federação Basca de Futebol reuniram-se na quarta-feira à tarde em Durango para tentar chegar a um acordo, depois de os futebolistas terem anunciado há mais de um mês que não iriam jogar caso a selecção não se chamasse Euskal Herria.
Na reunião, os futebolistas ainda avançaram com a proposta de jogar sob o nome de Euskal Selekzioa, mas a Federação não aceitou, já que entende que o nome oficial é selecção de Euskadi.

Notícia completa: SareAntifaxista



[Para que melhor se compreenda a polémica relacionada com as designações “Euskal Herria” e “Euskadi”, apresentamos excertos de um manifesto apresentado no dia 11 deste mês, subscrito por múltiplas associações e instituições de diversos âmbitos da sociedade basca, e lido por Egoitz Ascasibar.]

Na sequência da polémica surgida em torno da selecção de futebol de Euskal Herria, queremos denunciar que em muitas das discussões surgidas à volta questão se evitou abordar as raízes do problema. Face a isso, os futebolistas de Euskal Herria, os desportistas de Euskal Herria e os representantes dos diferentes organismos sociais e sindicais que aqui se encontram fazem uma mesma leitura sobre os dois eixos principais do tema.

1. Euskal Herria tem direito, desejo e vontade de competir em torneios internacionais. Nem uma região, nem uma Comunidade Autónoma, Euskal Herria é uma nação composta por sete territórios: Araba, Bizkaia, Gipuzkoa, Lapurdi, Nafarroa, Nafarroa Behera e Zuberoa. A esse conjunto de províncias chama-se Euskal Herria e, portanto, estamo-nos a referir à selecção que a representa.

2. Para poder competir contra outras selecções nacionais, o primeiro passo tem que ser o da criação de estruturas que adoptem no seu seio os desportistas de todo o país. Isto é, a criação de federações de Euskal Herria. Trata-se de uma medida imprescindível nestes momentos e que seria o primeiro passo no caminho em direcção à oficialização.

[…]

Com o sentido posto nessas futuras federações nacionais, voltamos a realçar que os jogos do Natal hão-de ser uma ferramenta e não um objectivo. Para além disso, pedimos à Federação Basca de Futebol e às forças que se escondem por detrás dela que não façam recuar os desportistas. Enfim, que não fechem a porta a Euskal Herria, já que este país quer e deve ter uma selecção.

Pois, pois, é Natal... Várias iniciativas a favor dos presos


Nomeadamente em Oiartzun, Santurtzi e Bilbau.



Saúde e liberdade!