segunda-feira, 29 de dezembro de 2008

Questão de oportunidades

O primeiro-ministro espanhol, José Luis Rodríguez Zapatero, proclamou, com ares de manchete, que “já não haverá mais oportunidades para a ETA”. Segundo Zapatero, o regime espanhol abriu negociações com a organização armada basca em três ocasiões e das três saiu escaldado. Não haverá, pois, um quarto processo.

A manchete trabalhada no laboratório de propaganda de Rubalcaba assemelha-se à da sentença que presidia à entrada do inferno de Dante: “Deixai toda a esperança, ó vós que entrais!”. E soa, talvez por isso, a artificial. Não foram só três as vezes que a ETA e o Governo espanhol mantiveram encontros ao mais alto nível e também não se pode aceitar que a boa fé para resolver o assunto tenha guiado os delegados governamentais. Da outra parte nunca ouvimos ou lemos o contrário.

Mas chegados a este ponto, quando Zapatero sentencia o seu particular “nunca mais”, é oportuno parafrasear Ibarretxe perante os atentados da ETA: Porquê? Para quê? E responder nos mesmos termos: para nada. Por que diz Zapatero o que diz, sabendo que é razoavelmente impossível que ele possa garantir tamanha asserção? (É preciso pensar que não pensa continuar no posto pelos séculos dos séculos). Leiam qualquer manual de contra-insurgência ou o tratado de guerra psicológica e encontrarão a resposta no primeiro capítulo. Para que o diz? Continuem a ler o mesmo manual e prestem atenção ao que se diz sobre a necessidade de aparentar imbatibilidade, dar moral às tropas e procurar o colapso anímico do inimigo. Não há mais. E, sobretudo, apliquem a máxima de Ibarretxe: para nada. Zapatero, como González ou Aznar, sabe que o Estado espanhol não alcançará estabilidade política nem homologação democrática enquanto não abordar com vontade de resolução o conflito basco. Sabe Zapatero, além do mais, que essa negociação inevitável assenta em dois pilares que o mesmo assinou por procuração: o reconhecimento de Euskal Herria e o seu correspondente caderno de direitos. Sabe mais. Sabe que o Governo que o quiser resolver terá que negociar com os Bascos, abrir a fivela do corpete constitucional e falar também com a ETA. Zapatero manipulará os tempos, Rubalcaba as sondagens, carregarão no acelerador repressivo em função dos seus interesses e hão-de manter a chantagem penitenciária. Mas chegará o dia em que hão-de decidir que o interessante (por razões de oportunidade e de interesse) é sentar-se, dialogar e chegar a um acordo. Antes hoje do que amanhã. Estou seguro.

Martin GARITANO
jornalista

Fonte: Gara