Coincidências da vida, naquele dia 19 de Dezembro de 1983 Felipe González e François Miterrand tinham-se reunido em Paris. Coincidência, ou não, os seus amigos Joxean Lasa e Joxi Zabala encontravam-se desaparecidos havia três meses, talvez já mortos. Seja como for, naquela tarde foram buscar Ramon Oñederra ao bar Kayetenia, em Baiona, para o matar. Azkoitia recordará nestes dias a primeira vítima mortal impune dos GAL.
Ramon Kattu Oñederra teria hoje 48 anos. Mas, aos 23, sete disparos realizados por pessoas nunca identificadas acabaram com a sua vida. Um quarto de século depois, o seu caso passou a ser o primeiro atentado mortal totalmente impune dos GAL, que antes – ou porventura depois – tinham acabado com a vida de Joxean Lasa e Joxi Zabala. Os refugiados tolosarras foram sequestrados a 15 de Outubro, mas não se sabe quanto durou o seu cativeiro e quando os crivaram de balas em Busot (Alicante). Um comunicante anónimo reivindicou estas mortes em Janeiro de 1984 à Cadena Ser de Alicante. Se assim fosse, Oñederra teria morrido quando ambos ainda eram torturados.
Este dado não é insignificante, porque os dois refugiados de Tolosa conheciam o de Azkoitia. Evidencia-o uma foto tirada a 7 de Outubro, apenas uma semana antes de que Lasa e Zabala desaparecessem. Essa amizade era do conhecimento dos familiares de todos eles. A ama [mãe] de Kattu explicava ao GARA há alguns anos que Ramon ligou para casa naquele dia de Outubro “e disse-nos que tinham desaparecido esses dois rapazes, mas que não estivéssemos em cuidados por causa dele, que estava bem”.
Naquelas alturas, a etiqueta GAL era uma de várias siglas entre as utilizadas para reivindicar acções de guerra suja. Tinha-se ouvido pela primeira vez aquando do sequestro de Segundo Marey. Logo depois veio a tentativa de rapto de Joxe Mari Larretxea, o desaparecimento de Lasa e Zabala, e, a 19 de Dezembro, a morte de Oñederra.
Foi uma presa fácil. Naquela tarde, por volta das 19h30, estava sozinho ao balcão do Kayetenia. O dono do bar encontrava-se no local, mas tinha ido para cima, fazer o jantar. E quatro refugiados acabavam de sair do estabelecimento. Alguém entrou e ouviram-se sete disparos. Suspeita-se que o jovem refugiado tentou pegar numa pistola para se defender, mas não teve tempo de o fazer. Baiona Ttipia ficou abalada por uma comoção que se repetiria muitas vezes ao longo dos meses seguintes. A polícia francesa foi quase a última a chegar. Ao invés, em Azkoitia a Guarda Civil empenhou-se a fundo em “escoltar” o cadáver. Os GAL, por seu lado, reivindicaram o ataque de imediato e ameaçaram “quem protege, colabora ou dá trabalho aos terroristas”.
Quase duas décadas depois, Oñederra deu nome a um processo que se converteu num caixote de entulho em que se juntavam várias acções dos GAL. Houve algumas declarações judiciais e os guardas civis Felipe Bayo e Enrique Dorado chegaram a estar processados, mas em Janeiro de 2003 a Audiência Nacional pôs um ponto final no assunto. “Arquiva-se a última ponta solta dos GAL”, intitulava El País. E acertou. Cinco anos depois, está tudo por fazer. Todas as perguntas continuam em aberto: Quem o matou? Quem ordenou? Como conseguiram a informação para chegar até ele?
«As razões persistem»
A sua terra, Azkoitia, não esquece nada disto, e preparou uma série de actos que foram apresentados no sábado numa conferência de imprensa, a que não faltou a mãe de Ramon Oñederra. Recordou-se então o caso, sublinhou-se a persistência da repressão durante todos estes anos e realçou-se que “as razões que levaram Kattu a dar sua vida permanecem actuais no dia de hoje”.
As mostras de lembrança começaram no domingo com um memorial de xadrez. Para esta quinta-feira está anunciada uma projecção de vídeo na Kultur Etxea de Azkoitia, às 19h30. Na sexta é o dia em que se cumprem os 25 anos sem o Kattu, pelo que se prenderá fogo em sua honra no monólito aos gudaris, às 19h30. No sábado, será colocada uma placa na Kakut, de manhã, e à tarde terá lugar uma manifestação, a que se seguirá um comício e um jantar popular.
25 anos não chegam para que todos os que conheceram Kattu deixem de sentir a sua falta. Mas os convocantes realçam que aqueles sete disparos só trouxeram sofrimento inútil: “Felipe González não conseguiu nada usando os GAL, e Zapatero não conseguirá nada com a Audiência Nacional. A repressão não acabará com a sede de liberdade deste povo”.
Ramon SOLA
Ramon Kattu Oñederra teria hoje 48 anos. Mas, aos 23, sete disparos realizados por pessoas nunca identificadas acabaram com a sua vida. Um quarto de século depois, o seu caso passou a ser o primeiro atentado mortal totalmente impune dos GAL, que antes – ou porventura depois – tinham acabado com a vida de Joxean Lasa e Joxi Zabala. Os refugiados tolosarras foram sequestrados a 15 de Outubro, mas não se sabe quanto durou o seu cativeiro e quando os crivaram de balas em Busot (Alicante). Um comunicante anónimo reivindicou estas mortes em Janeiro de 1984 à Cadena Ser de Alicante. Se assim fosse, Oñederra teria morrido quando ambos ainda eram torturados.
Este dado não é insignificante, porque os dois refugiados de Tolosa conheciam o de Azkoitia. Evidencia-o uma foto tirada a 7 de Outubro, apenas uma semana antes de que Lasa e Zabala desaparecessem. Essa amizade era do conhecimento dos familiares de todos eles. A ama [mãe] de Kattu explicava ao GARA há alguns anos que Ramon ligou para casa naquele dia de Outubro “e disse-nos que tinham desaparecido esses dois rapazes, mas que não estivéssemos em cuidados por causa dele, que estava bem”.
Naquelas alturas, a etiqueta GAL era uma de várias siglas entre as utilizadas para reivindicar acções de guerra suja. Tinha-se ouvido pela primeira vez aquando do sequestro de Segundo Marey. Logo depois veio a tentativa de rapto de Joxe Mari Larretxea, o desaparecimento de Lasa e Zabala, e, a 19 de Dezembro, a morte de Oñederra.
Foi uma presa fácil. Naquela tarde, por volta das 19h30, estava sozinho ao balcão do Kayetenia. O dono do bar encontrava-se no local, mas tinha ido para cima, fazer o jantar. E quatro refugiados acabavam de sair do estabelecimento. Alguém entrou e ouviram-se sete disparos. Suspeita-se que o jovem refugiado tentou pegar numa pistola para se defender, mas não teve tempo de o fazer. Baiona Ttipia ficou abalada por uma comoção que se repetiria muitas vezes ao longo dos meses seguintes. A polícia francesa foi quase a última a chegar. Ao invés, em Azkoitia a Guarda Civil empenhou-se a fundo em “escoltar” o cadáver. Os GAL, por seu lado, reivindicaram o ataque de imediato e ameaçaram “quem protege, colabora ou dá trabalho aos terroristas”.
Quase duas décadas depois, Oñederra deu nome a um processo que se converteu num caixote de entulho em que se juntavam várias acções dos GAL. Houve algumas declarações judiciais e os guardas civis Felipe Bayo e Enrique Dorado chegaram a estar processados, mas em Janeiro de 2003 a Audiência Nacional pôs um ponto final no assunto. “Arquiva-se a última ponta solta dos GAL”, intitulava El País. E acertou. Cinco anos depois, está tudo por fazer. Todas as perguntas continuam em aberto: Quem o matou? Quem ordenou? Como conseguiram a informação para chegar até ele?
«As razões persistem»
A sua terra, Azkoitia, não esquece nada disto, e preparou uma série de actos que foram apresentados no sábado numa conferência de imprensa, a que não faltou a mãe de Ramon Oñederra. Recordou-se então o caso, sublinhou-se a persistência da repressão durante todos estes anos e realçou-se que “as razões que levaram Kattu a dar sua vida permanecem actuais no dia de hoje”.
As mostras de lembrança começaram no domingo com um memorial de xadrez. Para esta quinta-feira está anunciada uma projecção de vídeo na Kultur Etxea de Azkoitia, às 19h30. Na sexta é o dia em que se cumprem os 25 anos sem o Kattu, pelo que se prenderá fogo em sua honra no monólito aos gudaris, às 19h30. No sábado, será colocada uma placa na Kakut, de manhã, e à tarde terá lugar uma manifestação, a que se seguirá um comício e um jantar popular.
25 anos não chegam para que todos os que conheceram Kattu deixem de sentir a sua falta. Mas os convocantes realçam que aqueles sete disparos só trouxeram sofrimento inútil: “Felipe González não conseguiu nada usando os GAL, e Zapatero não conseguirá nada com a Audiência Nacional. A repressão não acabará com a sede de liberdade deste povo”.
Ramon SOLA