Na sua análise, que supera abertamente a chave eleitoral, Otegi acende os «máximos» para constatar que «deixaram a esquerda abertzale fora do Parlamento na CAV mas, de modo algum, fora da luta por uma mudança política e social para o conjunto de Euskal Herria na senda independentista e socialista». E nos primeiros passos desse caminho situa a grande importância dos votos ilegalizados, «votos de ouro», que amanhã se depositarão nas urnas como «inversão para construir a esperança da maioria da sociedade basca».
Hoje é oficialmente dia de reflexão para os cidadãos dos territórios ocidentais de Euskal Herria. Parece que nestas democracias formais a reflexão se cinge à eleição de um boletim depois da tempestade de mensagens, skechts e frivolidades de todo o tipo e natureza que tivemos que sofrer nesta interminável e vergonhosa campanha eleitoral; quer dizer, parece que nos convidam a reflectir durante 24 horas – mais pode ser perigoso – para logo de seguida desligar até à campanha eleitoral seguinte, onde novamente nos aparecerão com produtos programáticos renovados.
Superando esse esquema formal, há que realçar algumas variáveis e referências que vão para lá do resultado eleitoral e que, portanto, continuarão a ser matéria pendente colectiva de toda a cidadania basca.
Em primeiro lugar, estas eleições inserem-se no braço de ferro político de fundo que Euskal Herria vem mantendo desde Lizarra-Garazi. Uma transição entre uma fase constitucional-estatutária esgotada e um ciclo político que nunca mais se abre e, dessa forma, assenta em novas bases políticas de reconhecimento nacional e respeito pela vontade popular democrática.
Estes anos foram sinuosos em oportunidades e fracassos para o movimento abertzale face à estratégia estabelecida pelo constitucionalismo espanhol para condicionar os conteúdos do, por outro lado, irreversível novo ciclo político. O PSOE, tal como o PP, cada qual com as suas características, mantiveram posicionamentos políticos, jurídicos e repressivos tendentes a desgastar o espaço da autodeterminação que emana de Lizarra e, mais especificamente, neutralizar o papel de motor de mudança da esquerda abertzale.
Nesse braço de ferro atravessámos momentos diferentes – Loiola –, sendo evidente o bloqueio instalado nos últimos tempos em todos os parâmetros do conflito político. Um bloqueio que o constitucionalismo tem vindo a trabalhar para debilitar a correlação de forças de Lizarra, inserindo o PNV na estratégia do Estado. Algo que conseguiu e pretende rubricar com os resultados e as consequências das eleições de amanhã, domingo.
A campanha eleitoral foi um fiel reflexo de ambas as questões. Por um lado, o apartheid político contra a esquerda independentista teve um novo desenvolvimento com a anulação da possibilidade de representação institucional ao sector da sociedade basca mais dinâmico e determinante para a mudança política neste país. Uma decisão do Estado espanhol que teve uma resposta insignificante e hipócrita dos sectores políticos que tanto reclamam o direito a decidir e as vias políticas e democráticas. Pelo contrário, por trás de declarações formais atiraram-se aos votos e assentos que a decisão política do Estado lhes proporciona num hemiciclo que será renovado com a bandeira espanhola na sua fachada e com uma composição interior amanhada pelo mencionado apartheid político.
Por outro lado, vimos como PNV e PSE-EE fizeram uma campanha de baixo perfil político e mediatizada pelo discurso autonomista e a gestão económica. Diz Ibarretxe que amanhã está em causa onde se decide, em Madrid ou em Gasteiz. Uma falácia evidente perante a estratégia e a posição do Estado com o “seu” plano e a “sua” consulta e, agora mesmo, perante a imposição das regras de jogo do “seu” Parlamento. Temos a convicção, fundamentada na posição do PNV no processo de negociação e em posteriores acordos parlamentares, de que este partido iniciou há algum tempo a viragem de Lizarra, encaminhando-se para um “acordo político” que, no fundo, é a constitucionalização do nacionalismo, autêntica matéria pendente do modelo de Estado Espanhol, como alternativa ao reconhecimento nacional basco e aos seus direitos democráticos no quadro de um estado plurinacional. Essa é a questão de fundo que tem vindo a amadurecer neste contexto de bloqueio político.
Neste mesmo cenário, o EA trata de clonar a esquerda abertzale e o Aralar dá o remate tentando aproveitar as condições do apartheid para as colocar, como em Nafarroa, ao serviço da estratégia regionalista de Sabin Etxea.
Assim, deixaram a esquerda abertzale fora do Parlamento na CAV mas, de modo algum, fora da luta por uma mudança política e social para o conjunto de Euskal Herria na senda independentista e socialista. O debate político e económico, as condições estruturais impostas pelo Governo espanhol, revelam-nos que, seja qual for o resultado, estamos perante a continuidade da estratégia do Estado contra Euskal Herria e face ao perigo de um segundo ciclo autonomista ante a deriva de um PNV preocupado unicamente com a gestão dos seus negócios e interesses a partir das instituições actuais.
Apesar disso, as condições para uma mudança política continuam a estar vigentes numa sociedade basca que reclama de forma maioritária o reconhecimento da sua vontade democrática. Por isso, devemos abordar o retrato distorcido e tramposo de amanhã com tranquilidade, confiança e perspectiva. A esquerda abertzale tem vindo a propor com insistência a necessidade de uma acumulação e activação de forças soberanistas, independentistas e progressistas como eixo determinante na actual situação de transição para a definição dos ingredientes e/ou bases de um novo ciclo político. Um posicionamento que precisa de amadurecimento e concreção em desenho, conteúdos e propostas táctico-estratégicas. Com esses máximos acesos, com essa perspectiva e compromisso, aborda a esquerda abertzale este teste eleitoral antidemocrático e, sobretudo, a etapa política que se abrirá imediatamente depois.
Assim, na jornada de amanhã, passando por cima de decisões antidemocráticas, de uma campanha de perseguição brutal às nossas ideias e posicionamentos ou da permanente ocultação e manipulação mediática, a esquerda abertzale voltará a demonstrar a dignidade e o compromisso com este povo e os seus direitos nacionais e sociais, articulando um espaço social que nos permita trabalhar nos próximos meses por uma implementação de esforços e compromissos políticos, sindicais e sociais, de modo a configurar um bloco popular pela mudança em termos de soberania e modelo social. Como repetimos nos últimos dias, não há mudança política sem a esquerda abertzale ou, dito de outra forma, só a partir da iniciativa, da força e do entusiasmo da esquerda abertzale podemos alcançar um cenário democrático como primeiro passo para desenvolver a nossa proposta estratégica.
Portanto, face aos que antepõem os seus interesses aos direitos e à dignidade deste povo, face aos que procuram espaço político aproveitando-se da estratégia do Estado espanhol, face à estratégia de repressão e confrontação do Estado espanhol para manter um quadro político centrado na negação da nossa soberania e na imposição constitucional, amanhã o voto ilegalizado é uma inversão, um voto de ouro, para construir a esperança da maioria da sociedade basca.
Arnaldo OTEGI
Hoje é oficialmente dia de reflexão para os cidadãos dos territórios ocidentais de Euskal Herria. Parece que nestas democracias formais a reflexão se cinge à eleição de um boletim depois da tempestade de mensagens, skechts e frivolidades de todo o tipo e natureza que tivemos que sofrer nesta interminável e vergonhosa campanha eleitoral; quer dizer, parece que nos convidam a reflectir durante 24 horas – mais pode ser perigoso – para logo de seguida desligar até à campanha eleitoral seguinte, onde novamente nos aparecerão com produtos programáticos renovados.
Superando esse esquema formal, há que realçar algumas variáveis e referências que vão para lá do resultado eleitoral e que, portanto, continuarão a ser matéria pendente colectiva de toda a cidadania basca.
Em primeiro lugar, estas eleições inserem-se no braço de ferro político de fundo que Euskal Herria vem mantendo desde Lizarra-Garazi. Uma transição entre uma fase constitucional-estatutária esgotada e um ciclo político que nunca mais se abre e, dessa forma, assenta em novas bases políticas de reconhecimento nacional e respeito pela vontade popular democrática.
Estes anos foram sinuosos em oportunidades e fracassos para o movimento abertzale face à estratégia estabelecida pelo constitucionalismo espanhol para condicionar os conteúdos do, por outro lado, irreversível novo ciclo político. O PSOE, tal como o PP, cada qual com as suas características, mantiveram posicionamentos políticos, jurídicos e repressivos tendentes a desgastar o espaço da autodeterminação que emana de Lizarra e, mais especificamente, neutralizar o papel de motor de mudança da esquerda abertzale.
Nesse braço de ferro atravessámos momentos diferentes – Loiola –, sendo evidente o bloqueio instalado nos últimos tempos em todos os parâmetros do conflito político. Um bloqueio que o constitucionalismo tem vindo a trabalhar para debilitar a correlação de forças de Lizarra, inserindo o PNV na estratégia do Estado. Algo que conseguiu e pretende rubricar com os resultados e as consequências das eleições de amanhã, domingo.
A campanha eleitoral foi um fiel reflexo de ambas as questões. Por um lado, o apartheid político contra a esquerda independentista teve um novo desenvolvimento com a anulação da possibilidade de representação institucional ao sector da sociedade basca mais dinâmico e determinante para a mudança política neste país. Uma decisão do Estado espanhol que teve uma resposta insignificante e hipócrita dos sectores políticos que tanto reclamam o direito a decidir e as vias políticas e democráticas. Pelo contrário, por trás de declarações formais atiraram-se aos votos e assentos que a decisão política do Estado lhes proporciona num hemiciclo que será renovado com a bandeira espanhola na sua fachada e com uma composição interior amanhada pelo mencionado apartheid político.
Por outro lado, vimos como PNV e PSE-EE fizeram uma campanha de baixo perfil político e mediatizada pelo discurso autonomista e a gestão económica. Diz Ibarretxe que amanhã está em causa onde se decide, em Madrid ou em Gasteiz. Uma falácia evidente perante a estratégia e a posição do Estado com o “seu” plano e a “sua” consulta e, agora mesmo, perante a imposição das regras de jogo do “seu” Parlamento. Temos a convicção, fundamentada na posição do PNV no processo de negociação e em posteriores acordos parlamentares, de que este partido iniciou há algum tempo a viragem de Lizarra, encaminhando-se para um “acordo político” que, no fundo, é a constitucionalização do nacionalismo, autêntica matéria pendente do modelo de Estado Espanhol, como alternativa ao reconhecimento nacional basco e aos seus direitos democráticos no quadro de um estado plurinacional. Essa é a questão de fundo que tem vindo a amadurecer neste contexto de bloqueio político.
Neste mesmo cenário, o EA trata de clonar a esquerda abertzale e o Aralar dá o remate tentando aproveitar as condições do apartheid para as colocar, como em Nafarroa, ao serviço da estratégia regionalista de Sabin Etxea.
Assim, deixaram a esquerda abertzale fora do Parlamento na CAV mas, de modo algum, fora da luta por uma mudança política e social para o conjunto de Euskal Herria na senda independentista e socialista. O debate político e económico, as condições estruturais impostas pelo Governo espanhol, revelam-nos que, seja qual for o resultado, estamos perante a continuidade da estratégia do Estado contra Euskal Herria e face ao perigo de um segundo ciclo autonomista ante a deriva de um PNV preocupado unicamente com a gestão dos seus negócios e interesses a partir das instituições actuais.
Apesar disso, as condições para uma mudança política continuam a estar vigentes numa sociedade basca que reclama de forma maioritária o reconhecimento da sua vontade democrática. Por isso, devemos abordar o retrato distorcido e tramposo de amanhã com tranquilidade, confiança e perspectiva. A esquerda abertzale tem vindo a propor com insistência a necessidade de uma acumulação e activação de forças soberanistas, independentistas e progressistas como eixo determinante na actual situação de transição para a definição dos ingredientes e/ou bases de um novo ciclo político. Um posicionamento que precisa de amadurecimento e concreção em desenho, conteúdos e propostas táctico-estratégicas. Com esses máximos acesos, com essa perspectiva e compromisso, aborda a esquerda abertzale este teste eleitoral antidemocrático e, sobretudo, a etapa política que se abrirá imediatamente depois.
Assim, na jornada de amanhã, passando por cima de decisões antidemocráticas, de uma campanha de perseguição brutal às nossas ideias e posicionamentos ou da permanente ocultação e manipulação mediática, a esquerda abertzale voltará a demonstrar a dignidade e o compromisso com este povo e os seus direitos nacionais e sociais, articulando um espaço social que nos permita trabalhar nos próximos meses por uma implementação de esforços e compromissos políticos, sindicais e sociais, de modo a configurar um bloco popular pela mudança em termos de soberania e modelo social. Como repetimos nos últimos dias, não há mudança política sem a esquerda abertzale ou, dito de outra forma, só a partir da iniciativa, da força e do entusiasmo da esquerda abertzale podemos alcançar um cenário democrático como primeiro passo para desenvolver a nossa proposta estratégica.
Portanto, face aos que antepõem os seus interesses aos direitos e à dignidade deste povo, face aos que procuram espaço político aproveitando-se da estratégia do Estado espanhol, face à estratégia de repressão e confrontação do Estado espanhol para manter um quadro político centrado na negação da nossa soberania e na imposição constitucional, amanhã o voto ilegalizado é uma inversão, um voto de ouro, para construir a esperança da maioria da sociedade basca.
Arnaldo OTEGI
Fonte: Gara