O magistrado do MP na Audiência de Gipuzkoa, Jaime Goyena, sustenta que Igor Portu e Mattin Sarasola foram torturados pelos seus captores e mantém, por isso, a acusação de crime de prática de tortura contra quatro guardas civis e de lesões corporais contra outros seis. A acusação particular solicita que os quinze agentes sejam punidos. Prevê-se que a audiência oral termine hoje.
O magistrado do MP da Audiência Provincial de Gipuzkoa, Jaime Goyena, considera provado que Igor Portu e Mattin Sarasola sofreram «torturas graves» por parte dos guardas civis que os detiveram e «custodiaram». Entende que a sua versão não oferece qualquer credibilidade e é «tudo menos plausível» em inúmeros aspectos.
Nas suas conclusões, Goyena destacou que as lesões mais graves foram provocadas por membros dos GAR quando os presos foram detidos, enquanto nas transferências participaram outros agentes, que também lhes causaram feridas, mas não tão graves. Em concreto, exime de culpas os condutores dos veículos utilizados para transferir os dois jovens, e ao responsável pela sua custódia no quartel de Intxaurrondo, ao dar-se «um vazio probatório» sobre se este soube que se estava a maltratar os detidos nos calabouços.
O magistrado criticou o facto de os guardas que não participaram nos maus tratos não terem evitado que os seus companheiros o fizessem. Salientou que os agentes «agrediram de forma deliberada» Portu e Sarasola e que as lesões foram fruto de «uma acção de agressão reiterada, continuada e unilateral», e não consequência de uma disputa.
O representante do Ministério Público disse que os acusados mentiram durante o julgamento, criticou a Audiência Nacional espanhola por não ter investigado as denúncias de tortura e também a «parcialidade» e «falta de independência» dos peritos da defesa. Também expôs as «dificuldades jurídicas» que existem para julgar os casos de tortura.
Considerou válida a versão da testemunha que presenciou as detenções e mostrou dúvidas sobre o alegado manual da ETA para denunciar tortura. O magistrado não crê que Portu e Sarasola seguissem esse suposto manual, já que considera provado que ambos foram metidos em veículos diferentes e não num, onde teriam preparado a «cantilena», como sustenta a Guarda Civil.
Por todo isto, o magistrado mantém o pedido de dois e três anos de prisão para quatro guardas civis, pela prática do crime de tortura, enquanto acusa os outros seis de um crime de lesão corporal.
Acusação particular
Por seu lado, Amaia Izko, advogada da acusação particular, também considerou provado que os dois jovens de Lesaka foram torturados pela Guarda Civil. Salientou os relatórios forenses, que consideram compatível o relato de Portu e Sarasola com as lesões que apresentavam, não assim o dos agentes.
Na mesma linha que o magistrado do MP, argumentou que não teria lógica que metessem ambos num mesmo veículo, se, como dizem os guardas, momentos antes tinham exercido uma «violência desmesurada» durante a detenção.
Pôs em destaque, para além disso, as contradições no testemunho de um dos militares e os erros de tradução existentes nos documentos policiais.
Izko mantém o seu pedido de seis a 17 anos de prisão para os quinze arguidos e solicita a mesma responsabilidade para todos, ao considerar que há «uma unidade nos factos» e não se podem fazer distinções.
Tanto a advogada de acusação particular como o magistrado do MP demonstrado que o testemunho dos guardas civis é falso, já que os tickets da auto-estrada que registaram a passagem dos jipes no dia da detenção (6 de Janeiro de 2008) não coincidem nas horas com os horários apresentados pela Guarda Civil.
Médicos e forenses reiteram a gravidade das feridas de Portu
O julgamento foi retomado hoje com o depoimento do director do Hospital Donostia, que disse que, quando chegou ao hospital, o estado de Igor Portu tornava necessário o seu internamento na unidade de cuidados intensivos (UCI). Foi ele mesmo que avisou o Tribunal de Guarda que Portu se encontrava ali, e também falou com o juiz da Audiência Nacional espanhola Ismael Moreno.
Por seu lado, o médico que deu ordem de entrada a Portu na UCI confirmou que o seu estado era muito grave, que a sua vida corria perigo e que o lesakarra lhe contou que tinha sido vítima de maus tratos.
Explicou que as feridas não tinham sido «tratadas» e que, se não recebesse tratamento médico, correria «risco de vida».
Lembrou também que Portu lhe disse que estava detido e que as lesões se ficavam a dever aos pontapés e socos recebidos.
O médico que atendeu Portu quando chegou ao hospital reiterou a gravidade do seu estado – de extrema gravidade, disse –, e afirmou que, quando deu entrada no hospital , se notava que estava cansado e que mantinha uma postura forçada, e também que o jovem lhe disse ter sido agredido.
A forense que elaborou o primeiro relatório sobre Igor Portu também verificou a gravidade das suas feridas, que o faziam correr risco de vida, segundo referiu. Contou que foi levado para ali sem T-shirt, e que a sua roupa e botas tinham pó e lama. Portu contou-lhe que tinha sido torturado e que lhe tinham tirado a T-shirt porque estava molhada. Tendo em conta o estado que apresentava, decidiu que fosse levado para o hospital, ao que os guardas responderam que sim, que tinha de ser nesse momento.
Na sua opinião, as lesões resultaram de um «agente externo».
Sobre Mattin Sarasola, lembrou que, quando o examinou, sofria de grande ansiedade e não contava nada, já que naquele estado não podia. Afirmou ainda que as feridas que apresentava não eram fruto de uma lesão provocada a si mesmo.
Tensão à entrada
Como aconteceu desde que se iniciou a audiência oral, hoje também se viveram momentos de tensão no momento de aceder à sala, uma vez que guardas civis à paisana se colocaram novamente em frente à porta para impedir que os familiares e os amigos de Portu e Sarasola entrassem. Estes fizeram queixa ao secretário judicial e, finalmente, os primeiros puderam entrar.
Fonte: Gara
Ver também: «Teve início o julgamento de cinco polícias acusados de torturar Maite Orue, que não pôde comparecer» (Gara)
«El éxito del final de la tortura será vasco» (editorial do Gara)
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Fotos: em cima, concentração em Donostia, hoje ao meio-dia, em frente ao tribunal; em baixo, concentração contra a tortura e solidária com os detidos (imagem de arquivo).