Depois das quatro detenções ocorridas na Bizkaia na primeira semana de Março, e quando os detidos se encontravam ainda incomunicáveis, numerosos meios de comunicação divulgaram uma versão policial que aludia a um plano da ETA para cometer um atentado contra o lehendakari, Patxi López, e o conselheiro do Interior de Lakua, Rodolfo Ares, em Junho de 2010. No último Zutabe, ao qual o Gara teve acesso e do qual já deu conhecimento no sábado, a organização desmente rotundamente este facto, e garante que o Governo espanhol, que deixou circular essa versão sem a desmentir, sabia que era mentira.
Artigo do Zutabe
Editorial do Gara: «La intoxicación como arma recurrente»
O suposto plano contra López e Ares foi divulgado com todo o tipo de dados, com o propósito de lhe conferir credibilidade. Assim, pôde-se ler que o atentado ia ter lugar no acto de aniversário do comandante policial Eduardo Puelles, morto pela ETA em Arrigorriaga um ano antes. Disse-se que tinha sido abortado devido ao facto de ir ser perpetrado com uma espingarda que não chegou ao seu destino. Na sequência disso, alguns meios de comunicação recordaram inclusive que as Forças de Segurança tinham apreendido uma arma deste tipo em Janeiro de 2010 em Zamora.
Contudo, a ETA explica que, na verdade, não existe notícia alguma. Matiza, antes de mais nada, que, «como é sabido, a ETA não responde às informações difundidas pelos ministérios do Interior de Espanha e França, nem para as desmentir, nem para as confirmar. Neste caso, contudo - acrescenta -, bastaria lembrar o que foi dito até agora: por um lado, que a ETA tomou em Fevereiro de 2010 a decisão de não realizar acções armadas ofensivas e que fez saber isso mesmo a todos os companheiros de luta e taldes de acção. E o Governo de Espanha sabia-o. Por outro lado, a decisão da ETA não tem um limite temporal. Portanto, o Governo de Espanha mente uma vez mais».
Na verdade, este Zutabe lembra que outro tanto se passou na Primavera de 2010, quando o Governo espanhol insistiu na possibilidade de acções da ETA quando, «nessa altura, tinha conhecimento da sua decisão».
A ETA qualifica de «muito grave» o caso concreto de López e Ares, e aponta directamente para Alfredo Pérez Rubalcaba, vice-presidente, ministro do Interior e porta-voz, de quem diz com ironia que nesse caso agiu «transformado em jornalista», dado que a fuga partiu «das cloacas do Estado». Quanto aos principais meios de comunicação implicados, indica que se transformaram, com isso, em «defensores da tortura». É que, segundo recorda, a operação «incluiu a violação de uma mulher basca» (Beatriz Etxebarria).
Este artigo do Zutabe número 113 tem por título «Tortura eta gezurraren erabilpen politikoa», e nele a ETA cita outros casos similares a este. Por exemplo, o de Juan Karlos Besance e Xabier Atristain, detidos em Setembro do ano passado «e brutalmente torturados», como salienta. Como se recordará, neste caso até o embaixador da Venezuela em Madrid expôs as suas suspeitas de que tivessem sido maltratados.
A ETA lembra que nessa altura se afirmou que Besance e Atristain tinham declarado que tinham ordens para não cometer atentados até às eleições de Maio próximo. «A notícia não tinha pés nem cabeça, mas os meios de comunicação espanhóis lançaram-na em grandes letras - acrescenta -, sob o título de que a iniciativa da ETA de Setembro era uma ‘trégua-logro'» (convém recordar que, apenas alguns dias antes desta operação, a organização armada tinha revelado o final das suas acções ofensivas). Qual é o motivo de tudo isto? Para a ETA, tratava-se de preparar argumentos para impedir que a esquerda abertzale estivesse nas eleições.
A organização denuncia o facto de, para os objectivos policiais e governamentais, se utilizar «o que supostamente disseram cidadãos bascos sob tortura, ou o que os fizeram dizer».
«Em todas estas tentativas de intoxicação, o mais grave é o recurso à tortura. A tortura, infelizmente, não é estranha aos independentistas de esquerda - continua a ETA -. Sentimo-la na pele muitas vezes. Nesta última época, sofreram-na do modo mais duro possível os cidadãos que trabalham no movimento popular ou em organizações políticas. O objectivo, obter informação política dessas organizações e movimentos e da esquerda abertzale em geral, e engrossar as listas negras de militantes, transformadas por sua vez em alimento de próximas operações policiais», denuncia a ETA.
Pede reflexão
Na sequência da tempestade desencadeada pelo inexistente plano de atentado contra López e Ares, a ETA reclama uma reflexão sobre as intoxicações. Neste caso concreto, ressalta que «durante dias e dias estivemos "condenação para cima e para baixo", depois de algo que não tinha acontecido, aumentando a pressão sobre a esquerda abertzale».
«Parece-nos que os agentes políticos e sociais bascos têm motivos para reflexão - conclui a ETA -. O Governo espanhol leva a cabo uma intoxicação incessante, e, face às notícias que divulga, há que agir com prudência». E enumera vários casos significativos das últimas décadas: «Que Mikel Zabalza tinha escapado da Guarda Civil. Que os companheiros de luta Jon Lizarralde, Susana Arregi, Xabier Kalparsoro, Josu Zabala e Jose Luis Geresta se tinham suicidado. Que o 11 de Março foi obra da ETA. Ou que Jon Anza fugiu com o dinheiro da ETA. Todas estas coisas saíram do Ministério do Interior espanhol», lembra.
Guardas civis gozam com Nérin num vídeo apanhado
O Zutabe número 113 inclui um conteúdo que chama bastante a atenção. Trata-se de imagens retiradas de «vídeos gravados pela Guarda Civil que estão nas mãos da ETA», segundo explica a organização, que não apresenta mais detalhes a esse respeito.
Aparecem três documentos videográficos. O primeiro corresponde a «dois guardas civis que foram vistos em Hernani, em funções de repressão sobre cidadãos bascos», de acordo com a ETA. O segundo inclui imagens de uma operação da Guarda Civil. E no terceiro aparecem agentes deste corpo a praticar tiro.
A ETA divulga ainda uma conversa entre guardas civis referente ao tiroteio de 16 de Março do ano passado em Dammarie-lès-Lys e que provocou a morte a um sargento da Polícia francesa, Jean-Serge Nérin. Explica que nela os militares espanhóis gozam utilizando frases como «un franchute a la cazuelé», e lembra, neste ponto, como já em Abril do ano passado afirmou num comunicado que as condenações e tons de lamentação espanhóis eram «hipócritas», já que, na verdade, Madrid procurava tirar «dividendos políticos» daquela morte.
A ETA diz que dispõe de mais documentação deste tipo, que está a analisar. Fala, exactamente, de uma «colecção» de vídeos. GARA
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