O juiz Garzón declara-se “obamista” e acaba de afirmar no Chile que “a melhor notícia que recebeu havia muito tempo foi a do encerramento de algo que nunca devia ter existido e que não era o mecanismo e a fórmula para lutar contra o terrorismo”. Não falava da Audiência Nacional, nem de Soto del Real, nem dos calabouços da Guarda Civil, mas de Guantánamo, como o leitor já deve ter entendido.
Neste caso, as suas palavras são consentâneas com as suas acções. Por exemplo, em Março de 2008 retirou as acusações de “pertença a organização terrorista” a Abú Aás e Omar Deghayes, ex-presos na polémica base yankee. Garzón assumiu que existiam “indícios racionais suficientes” de pertença a uma “célula espanhola da Al-Qaeda”, mas deu mais importância aos relatórios médicos que atestavam a deterioração da sua saúde mental após o seu enclausuramento em Guantánamo, e concluiu que seria “desumano” processá-los. Também libertou sob fiança Hamed Abdelrahman Ahmed, espanhol que passou dois anos naquele estabelecimento penal das Antilhas, aludindo à sua “detenção arbitrária”, feita “ao amparo de uma violação sistemática dos direitos fundamentais dos detidos”.
Duas decisões louváveis, sem dúvida.
Dizem que este Garzón é a mesma pessoa que subscreve o último auto de prisão contra oito militantes independentistas. Depois de ler as 46 páginas, somos assaltados por mil dúvidas, mas sobretudo uma: por que o assinou às 5h da madrugada e não, por exemplo, às 20h30, para depois ir jantar ou ao futebol, com o trabalho acabado. Para atribuir um cunho judicial a um relatório policial não faz falta esperar (nem fazer esperar) tanto. Será que apenas queria dar aparência de rigor e profissionalismo a uma operação arbitrária e falsa? Maliciosos...
Garzón ou Zapatero usaram o termo “limbo” para definir Guantánamo. Mas em Euskal Herria impõem outro limbo pior, na medida em que tem um disfarce legal. Em Washington tiveram o descaramento de revestir de rigor jurídico um sistema de punição arbitrária e injusta, mas em Madrid continua a vender-se a perseguição política como “normalidade do Estado de Direito”. Em Washington, Dick Cheney assume que deu autorização à chamada “asfixia simulada”; uma coisa que aqui tem outro nome, muito mais directo e compreensível – “o saco” –, mas que Madrid nunca reconheceu ou nem se propõe reconhecer.
Os progressistas espanhóis – talvez até Garzón se aliste – começam a pressionar Zapatero para que receba os presos de Guantánamo, os liberte e os ampare como refugiados políticos. Alguém no mundo deveria fazer o mesmo com Amparo Lasheras, por exemplo.
Ramón SOLA
Fonte: Gara