É curiosa, desesperante talvez, a facilidade com que os políticos espanhóis mascaram os problemas com o disfarce das palavras. Passam os acontecimentos por alto e enredam-se no emaranhado dos dicionários utilizados em jeito de cortina de fumo.
Desta vez o alvoroço é provocado por Alfredo Pérez Rubalcaba, aide-de-camp, auxiliar de Felipe o dos GAL. De acordo com o brilhante ministro da Governação (já vai sendo tempo de chamar cada coisa pelo seu nome e à Audiência Nacional, Tribunal de Ordem Pública, como lhe pertence), a esquerda abertzale prepara uma «farsa» - outro termo para a comédia -, algo parecido com um subterfúgio, um ardil saduceu, para, sem condenar a ETA, dar a entender que o faz.
Pérez Rubalcaba já escolheu os termos para que impere a confusão: «condenação» e «farsa». Começa agora o vaudeville.
Assim, acontece que, se quem «condenar» a acção da ETA não oferecer garantias ao júri designado pelo ministro da garrafa de anis (contemplem a etiqueta de um clássico anisado, espanhol, claro, e entenderão a parte anterior), a tal condenação não passará a prova do algodão da democracia corrupta dos GAL e dos desaparecidos.
[Se é permitida aqui uma digressão, corram às hemerotecas e leiam as veementes condenações dos GAL que um dos seus próprios dirigentes fazia, naquela altura líder plenipotenciário do PSE-PSOE, Ricardo García Damborenea].
Perdem assim o tempo Pérez Rubalcaba e os seus companheiros de novela.
Mas o que está em jogo para a sociedade basca - também para a espanhola - é algo de muito mais importante que o trava-línguas das condenações. Está à vista de todo o mundo. Perguntem por aí.
Não estamos em tempo de miudezas. Está o Governo espanhol disposto a reconhecer os direitos básicos do povo basco reconhecidos na Carta das Nações Unidas? É tudo tão simples quanto isto.
E não vale responder com a muleta de Espartero: «...sem prejuízo para a unidade constitucional da Monarquia». Essa lição já a aprendemos em Bergara há duzentos e tal anos.
Martin GARITANO
jornalista
Fonte: Gara