quarta-feira, 15 de abril de 2009

Familiares afirmam que há vidas inteiras prisioneiras da dispersão


“Este triste aniversário lembra-nos que andamos há duas décadas a fazer milhares e milhares de quilómetros para visitar os nossos familiares, os nossos amigos e as nossas amigas. Algumas das pessoas aqui presentes viveram aquele momento. Outras não tinham idade suficiente para ter noção, mas passaram toda a vida a sofrer as consequências da dispersão”. Foi com estas palavras que Miguel Angel Olaiz deu início a uma conferência de imprensa em que participaram meia centena de familiares de presos, ontem, na Gaztelu Plaza, em Iruñea [Pamplona], com o intuito de dar a conhecer os actos previstos para os próximos dias.

Em nome dos presentes, Miguel Angel Olaiz e Susana Ubani afirmaram que a dispersão é “uma política cruel que não trouxe mais do que sofrimento” e cujo objectivo é “aniquilar os presos políticos enquanto pessoas e militantes, ao mesmo tempo que procura desgastar os seus familiares e pessoas amigas de todas as formas possíveis”.
“Procura debilitar-nos física, psicológica e economicamente, para além de ser uma chantagem inaceitável – acrescentaram –, que pretende hipotecar o futuro de Euskal Herria”.

Como dados mais significativos das consequências da dispersão, informaram que nestes vinte anos morreram 21 presos políticos bascos nas prisões espanholas e francesas, entre os quais figuram os navarros Kotto Altzuguren e Peio Mariñelarena. Além disso, ao longo destas duas décadas contabilizaram-se 267 acidentes graves nas deslocações semanais dos familiares e amigos às prisões, que causaram a morte a 16 pessoas. Entre elas mencionaram duas de Iruñerria: Sara Fernández (Iruñea) e Karmele Solaguren (Barañain).

“Conseguiram fazer-nos sofrer, seguramente, mas a dispersão não atingiu os seus objectivos. Não nos conseguiram impedir de lhes fazer chegar o nosso carinho, e também não conseguiram calar a nossa denúncia desta política criminosa”, referiram Olaiz e Ubani.

Também constataram como a dispersão concebida pelos estados francês e espanhol enfrentou uma reprovação “a nível mundial”, recordando que diversas organizações internacionais, como a ONU, “reprovaram esta ferramenta repressiva”.
Apesar disso, ambos os estados, “vendo como os seus objectivos não eram alcançados, optaram por endurecer a sua estratégia”, assinalaram. Como exemplos, referiram a aplicação da pena perpétua sob o eufemismo de “sentença N.º 197/2006” e a recusa da libertação das pessoas presas com doenças graves e incuráveis.

Actos previstos
Em Nafarroa, a campanha começará hoje em diversas localidades da Ribera, na sexta-feira centrar-se-á em Sakana e Lekunberri, e no sábado em Otsagabia, Lesaka e Bera. O principal evento terá lugar amanhã, consistindo numa manifestação que unirá o bairro de Donibane a Barañain, em lembrança das duas familiares que morreram em consequência da política de dispersão.

Testemunho – Garazi BARANDALLA

«A dispersão pretende criar um muro entre o preso e a família»

“Eu tinha um ano quando detiveram o meu pai e agora tenho vinte, tantos quantos a dispersão.
O meu pai continua preso. Durante todo este tempo pude ver e sentir na pele o que significa a dispersão. Para mim, às vezes, cansaço; outras vezes medo, sobretudo quando no dia da visita a minha mãe ia sozinha. Tinha medo de que lhe acontecesse alguma coisa.
Outras vezes senti raiva porque, depois de uma viagem tão longa, não tinha tempo para conviver com o meu pai como precisava.
À medida que fui crescendo, fui vendo o grande muro que a dispersão quer criar entre o preso e a sua família, entre o preso e os seus amigos, entre o preso e o seu povo. E também fui vendo como esse afastamento ajuda a que os seus direitos, até os mais elementares, sejam violados. Eu sei-o bem porque o meu pai vai ficar doente para o resto da vida e continuam a recusar-lhe a liberdade.
Eu quero ser uma das pessoas que durante toda esta semana vão percorrer Nafarroa para denunciar a dispersão e dizer à sociedade que nós, com visitas, com cartas, com os nossos testemunhos, somos os únicos a poder abrir uma brecha no muro da dispersão, e que entre todos o vamos conseguir”.

Iñaki VIGOR

Notícia completa: Gara