segunda-feira, 12 de abril de 2010

A Audiência Nacional espanhola absolve os cinco dirigentes do «Egunkaria» que foram a julgamento


A Audiência Nacional espanhola absolveu Martxelo Otamendi, Xabier Oleaga, Txema Auzmendi, Iñaki Uria e Joan Mari Torrealdai, que foram a julgamento no processo movido contra o Egunkaria, apesar de a Procuradoria ter solicitado o arquivamento do processo. A sentença põe em questão o encerramento do diário em euskara e afirma que os processados e o periódico «não tinham a mínima relação com a ETA».

Sentença na íntegra

A maior parte das forças políticas pede que se repare o dano causado

Sete anos após o encerramento do Euskaldunon Egunkaria, a Secção Primeira da Sala Penal da Audiência Nacional espanhola decretou a absolvição de Martxelo Otamendi, Xabier Oleaga, Txema Auzmendi, Iñaki Uria e Joan Mari Torrealdai, que foram a julgamento pela acusação de «pertença» à ETA, apesar de a Procuradoria ter pedido o arquivamento do processo ao considerar não existir relação com a organização armada.

Para levar os cinco dirigentes do Egunkaria a julgamento bastaram as acusações da AVT e da DyJ, que solicitaram penas de prisão entre os doze e os catorze anos para cada um deles.

Em Dezembro de 2006, foi a própria Procuradoria a solicitar o arquivamento do processo, depois de assumir que não estava provado «que o periódico fosse fonte de financiamento da ETA, ou instrumento de branqueamento de capitais ilícitos» procedentes dessa organização.

«Não se provou que parte alguma do capital social ou outros recursos fossem de proveniência ilícita», sublinha a Sala, para acrescentar que «também não consta o envio ou desvio de fundos ou activos de qualquer tipo da sociedade editora ou do diário para o grupo terrorista ETA».

A sentença, de 33 fólios, estabelece que as acusações «não provaram que os processados tenham a mais pequena relação com a ETA, o que por si determina a absolvição com todos os pronunciamentos favoráveis».

O tribunal sustenta que «também não se provou de forma directa ou indirecta que o periódico Euskaldunon Egunkaria tenha defendido os postulados do grupo terrorista, tenha publicado um só artigo a favor do terrorismo ou dos terroristas, nem que a sua linha editorial tivesse sequer uma orientação política determinado, a qual, para além disso, não seria um crime».

A sentença destaca em seguida que «até os membros da Guarda Civil que compareceram como peritos reconheceram que não se tinha investigado se a linha do periódico era ou não de apoio à ETA, o que torna a acusação incompreensível».

Os relatórios policiais carecem de natureza pericial
Os magistrados Javier Gómez Bermúdez, Manuela Fernández Prado e Ramón Sáez Valcárcel concluem que os factos e elementos em que se basearam as acusações «não foram provados de forma directa» e que os indícios em que se apoiaram para reclamar elevadas penas de prisão «são equívocos e admitem diversas interpretações favoráveis aos processados».

Afirma-se ainda que os relatórios elaborados pela Guarda Civil, «a base exclusiva da acusação», foram propostos e admitidos como prova pericial mas «não têm tal carácter» de natureza pericial.

O fechamento, sem cobertura constitucional
A sentença chega a pôr em causa o próprio encerramento do diário em euskara. Os juízes sublinham que, «entre as diversas formas e modos de ingerência na liberdade de imprensa, o fechamento representa a maior restrição, a suspensão ou cancelamento radical de todos os direitos relacionados com a emissão e recepção de informação e opinião, de maneira sistemática», já que afecta «massivamente direitos e interesses de múltiplas pessoas e da própria sociedade».

Por isso, entendem que o encerramento provisório ou cautelar do Egunkaria «não tinha aval constitucional directo e carecia de uma norma legal especial e expressa que o autorizasse».

Salientam que um jornal «não pode ser considerado como uma empresa qualquer», e consideram que «os fins de prevenção da suposta reiteração delitiva» que foram esgrimidos para sacrificar a liberdade de imprensa «ou a suspender singularmente» podiam ter-se conseguido «usando outras possibilidades alternativas de intervenção cautelar que não implicassem a interrupção da actividade informativa, da elaboração, impressão e distribuição do diário. Sobretudo - realça - quando, de acordo com as investigações realizadas, a análise da linha informativa permitia descartar que o jornal fosse instrumento para a prática de delitos ou suporte de actividades criminosas».

Tortura: «Não houve eficiência das condições do regime de incomunicação»
A sentença também faz menção às denúncias de tortura que os cinco ex-arguidos efectuaram depois de serem detidos e permanecerem cinco dias em poder da Guarda Civil. O tribunal destaca que na apreciação das declarações dos processados «tem especial relevo o facto de as suas denúncias sobre maus tratos e tortura sofridos durante a detenção em regime de incomunicação - que foram relatadas com detalhe na audiência oral e antes na presença do instrutor e alvo de denúncia nos tribunais - serem compatíveis com o exposto nos relatórios médico-forenses emitidos depois de serem reconhecidos no centro de detenção, ainda que o Tribunal não possa chegar a conclusões jurídicas penalmente relevantes sobre o particular, salvo constatar que não existiu um controlo judicial suficiente e eficiente sobre as condições da incomunicação».

A AVT e a Dignidad y Justicia estudam a possibilidade de recorrer
Os presidentes da Dignidad y Justicia, Daniel Portero, e da AVT, José Antonio García Casquero, afirmaram à Europa Press que estão a estudar a possibilidade de recorrer da sentença.
Consideraram que a sentença representa «um duro golpe na luta contra o terrorismo e insistiram «de forma taxativa» que o diário em euskara «fazia parte da rede mediática da ETA».

Fonte: Gara