segunda-feira, 19 de abril de 2010

O comboio que levou uma Primavera

Uma manhã de Primavera. Uma viagem de comboio. Um adeus. Não, um até logo. Estação de Baiona, 18 de Abril de 2009. Estação de Toulouse. Bilhete de ida e volta no bolso. Maldita ironia!

Uma consulta médica falhada em Bordéus. Primeiro murro no estômago. O telefone emudece. Nos hospitais nada sabem. Que ligue, por favor, que toque o telefone, mesmo que custe. Passam os dias, as semanas. A Primavera exibe-se insolente enquanto a angústia toma conta do meio próximo do viajante.

A notícia. Ou melhor, o que se publica é a falta de notícias. Aumentam as incertezas perante a falta de resultados da investigação que a Polícia Judiciária leva a cabo, às ordens da Procuradoria de Baiona.

A ETA confirma que Anza é militante dessa organização e que se dirigiu a Toulouse para entregar uma quantia significativa de dinheiro. Em Paris abre-se de imediato uma investigação paralela à de Baiona. A diligente secção antiterrorista não presta contas. Que sabe? Que silencia?

11 de Março de 2010. O corpo de Anza aparece por fim, mas essa presença física não é válida por si mesma para explicar o que ocorreu durante a sua longa ausência.

A procuradora de Baiona repete o itinerário que o habitante de Ahetze fez e deposita o dossier judicial em Toulouse. O silêncio pesa e as escassas revelações que afloram só fazem aumentar as dúvidas.

Como durante esses dez meses de homenagem ao vazio, os passos dos cidadãos são o eco mais sonoro de um caso emaranhado entre respostas incompletas e versões interessadas nos gabinetes de uma República que há algum tempo sacrificou a defesa dos direitos humanos no altar da chamada colaboração antiterrorista.

É outra vez Primavera. Mas os tímpanos pressentem de novo o grito afogado na masmorra. Nada importa. A centenas de quilómetros, uma juíza francesa ordena a enésima detenção de um basco sem avaliar a origem falsa da prova.

Há um ano que o comboio partiu com um passageiro e entregou um desaparecido. À Justiça francesa, com a sua ministra Alliot-Marie à frente, cabe-lhe dar as respostas precisas para limpar as brumas que envolvem desde então o caso Anza.

É Primavera e, embora a pesada bruma dilua a paisagem, aqui existe um povo que empreendeu uma viagem com bilhete fixo até à estação esperança.

Maite UBIRIA
jornalista
Fonte: Gara
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Manifestação em Donibane Lohizune (17/04/2010)


Exigiu-se a «verdade» sobre o que aconteceu a Jon Anza. Egia nahi dugu!