Oito anos depois de uma ofensiva contra os manuais de texto em euskara que deu muito que falar, o Governo navarro ameaça de novo abrir processos contra manuais cujo conteúdo entende que «vai contra a realidade navarra». Rejeita sobretudo a inclusão do conceito de Euskal Herria, apesar de este ter sido recentemente aceite na CAB tanto pelo Departamento da Educação de Isabel Celaá como pelos seus colegas de governo do Partido Popular.
O Governo de Nafarroa dirigido Miguel Sanz ameaça reabrir as hostilidades para excluir o conceito de Euskal Herria do ensino primário e secundário. O Departamento da Educação deu a conhecer o resultado de uma inspecção, que mostra que dez das 42 escolas públicas de modelo D e as 15 ikastolas navarras utilizam materiais que «vão contra a realidade navarra», nas palavras do conselheiro, Carlos Pérez-Nievas, da CDN.
O Executivo pretende que a informação recebida nas aulas pela população escolar aluda exclusivamente a Nafarroa como mais uma comunidade autónoma do Estado espanhol e sem qualquer ligação ao resto de Euskal Herria. Segundo Pérez-Nievas, alguns destes livros «descrevem uma realidade de Navarra manipulada ou nem sequer a mencionam: falam da Europa, de Espanha e de Euskal Herria e fica-se por aí», afirmou no sábado, em declarações ao Diario de Navarra.
Com esta campanha, que imita a realizada em 2001, o Governo composto por UPN-CDN distancia-se do seu homólogo de Lakua, com o qual apresentou uma nova etapa de colaboração numa reunião entre Miguel Sanz e Patxi López celebrada a 3 de Julho em Iruñea. Três semanas depois, a conselheira da Educação de Lakua, Isabel Celaá, afirmou que o conceito de Euskal Herria se iria manter nos seus manuais de texto, e o seu parceiro de governação - PP - aprovou-o.
Perante o pedido feito por alguns lobbys de pressão do âmbito educativo, a conselheira do PSE deixou claro que não se ia eliminar a alusão a Euskal Herria do currículo educativo porque «Euskal Herria existe, é o país do euskara e é um território de cultura e língua comum que nós, os bascos, partilhamos».
Esta consideração foi ratificada pelas fileiras do PP, formação ideologicamente muito próxima à UPN. Iñaki Oyarzábal, secretário-geral do PP na CAB, aprovou a decisão do Governo de Lakua matizando que, «até agora, o currículo basco apresentava o termo 'Euskal Herria' como um elemento de confusão, como se fosse uma realidade política e institucional, coisa que não é correcta. Não se trata de fazer desaparecer o termo como expressão cultural, mas de o ajustar à realidade política e institucional».
Nos manuais que o Governo navarro considera repudiáveis, as alusões a Euskal Herria cingem-se a esta consideração como entidade cultural. Contudo, isto não interessa ao Governo UPN-CDN, que ameaça proibi-los directamente.
Revisão iminente
Embora o conselheiro da Educação não tenha avançado com nomes até à data, debaixo de fogo parecem estar três editoriais bascas que surgem entre as mais utilizadas nos centros educativos, também em Nafarroa. Matiza que, na realidade, 80% das escolas nem sequer responderam à inspecção, ou seja, não precisaram que manuais empregam. Pérez-Nievas insinua também que alguns professores utilizam materiais próprios nos quais vem incluído o termo que o Governo de Miguel Sanz combate. Em teoria, a liberdade de ensino é um direito reconhecido aos docentes.
Assim sendo, o Departamento de Educação anuncia uma nova inspecção para a semana que vem, centrada nos manuais utilizados neste ano lectivo na disciplina de Inguruaren Ezaguera (Conhecimento do Meio). E avisa desde já que se irá actuar num duplo sentido: «Haverá casos em que bastará incluir uns folhetos referentes a Navarra, que o departamento até já elaborou; noutros será impossível mantê-los», diz Pérez-Nievas. Nestes últimos casos, haverá inclusive a hipótese de abertura de processos sancionadores, o que significaria um salto qualitativo.
O Departamento de Educação argumenta que em Março último já enviou uma nota às escolas, na qual lhes pedia que se cingissem ao currículo imposto pelo Governo.
Um exemplo
Os manuais de texto homologados pelo Governo de Miguel Sanz não fazem menção alguma a Euskal Herria nem admitem qualquer laço histórico ou cultural entre Nafarroa e os restantes herrialdes bascos.
Para dar um exemplo tirado ao acaso, no livro de Inguruaren Ezaguera do quinto ano da Primária, da editorial Anaya, podem encontrar-se treze mapas do Estado espanhol, sendo que não existe um único que delimite o conjunto de Euskal Herria, e que são muito poucos os exclusivamente relativos a Nafarroa.
Esta surge sempre definida como «comunidade foral», junto à «CAB» e a «França». Um dos capítulos dedica-se exclusivamente à «organização de Espanha», explicando-se que são a Constituição, as comunidades autónomas, o Congresso, o Senado, o Tribunal Constitucional ou Supremo Tribunal, além de identificar Juan Carlos I, mas não outras autoridades, nem estatais nem navarras.
Na parte dedicada à história, faz-se referência ao reino independente de Nafarroa, mas não ao modo como desapareceu. Referem-se, sim, «as conquistas» dos Reis Católicos ou «o descobrimento da América».
Oito anos depois dos livros «traduzidos» com dinheiro público
O ataque anunciado pelo Departamento da Educação de Pérez-Nievas recordou o que foi lançado na sua época pelo departamento de Jesús Laguna. Foi em 2001, também com Miguel Sanz como presidente do Governo navarro. O seu executivo afirmou que os manuais de texto que se utilizavam nas escolas públicas e privadas não se cingiam ao currículo imposto e, como tal, tomou uma medida sem precedentes: subsidiar a edição de livros em euskara que excluíssem o conceito de Euskal Herria e se limitassem a mostrar uma Navarra espanhola e sem relação com os restantes herrialdes bascos.
Editoriais bascas como Elkarlanean e Erein viraram as costas àquela proposta, à qual concorreram duas madrilenas - Anaya e Santillana - e duas catalãs - Edebé e Vicens-Vives. O Governo atribuiu-lhes quase 200 000 euros para que elaborassem os novos materiais homologados. Na realidade, o trabalho consistiu em traduzir para o euskara os livros que se utilizavam em castelhano. A denominação Euskal Herria desapareceu completamente de textos em que, ao invés, as referências a Espanha eram abundantes e as referências de Nafarroa minguavam. A título de exemplo, afirmava-se que o dia de Aragão é 23 de Abril, mas não que o de Nafarroa é 3 de Dezembro.
Depois da apresentação dos novos livros subsidiados, professores de ikastolas e escolas públicas anunciaram que não os iriam utilizar e reivindicaram o seu direito à liberdade de ensino. O estudo agora levado a cabo por Carlos Pérez-Nievas aponta para que efectivamente esses manuais apoiados com dinheiro público continuem ausentes de uma boa parte das escolas.
Ramón SOLA
O Governo de Nafarroa dirigido Miguel Sanz ameaça reabrir as hostilidades para excluir o conceito de Euskal Herria do ensino primário e secundário. O Departamento da Educação deu a conhecer o resultado de uma inspecção, que mostra que dez das 42 escolas públicas de modelo D e as 15 ikastolas navarras utilizam materiais que «vão contra a realidade navarra», nas palavras do conselheiro, Carlos Pérez-Nievas, da CDN.
O Executivo pretende que a informação recebida nas aulas pela população escolar aluda exclusivamente a Nafarroa como mais uma comunidade autónoma do Estado espanhol e sem qualquer ligação ao resto de Euskal Herria. Segundo Pérez-Nievas, alguns destes livros «descrevem uma realidade de Navarra manipulada ou nem sequer a mencionam: falam da Europa, de Espanha e de Euskal Herria e fica-se por aí», afirmou no sábado, em declarações ao Diario de Navarra.
Com esta campanha, que imita a realizada em 2001, o Governo composto por UPN-CDN distancia-se do seu homólogo de Lakua, com o qual apresentou uma nova etapa de colaboração numa reunião entre Miguel Sanz e Patxi López celebrada a 3 de Julho em Iruñea. Três semanas depois, a conselheira da Educação de Lakua, Isabel Celaá, afirmou que o conceito de Euskal Herria se iria manter nos seus manuais de texto, e o seu parceiro de governação - PP - aprovou-o.
Perante o pedido feito por alguns lobbys de pressão do âmbito educativo, a conselheira do PSE deixou claro que não se ia eliminar a alusão a Euskal Herria do currículo educativo porque «Euskal Herria existe, é o país do euskara e é um território de cultura e língua comum que nós, os bascos, partilhamos».
Esta consideração foi ratificada pelas fileiras do PP, formação ideologicamente muito próxima à UPN. Iñaki Oyarzábal, secretário-geral do PP na CAB, aprovou a decisão do Governo de Lakua matizando que, «até agora, o currículo basco apresentava o termo 'Euskal Herria' como um elemento de confusão, como se fosse uma realidade política e institucional, coisa que não é correcta. Não se trata de fazer desaparecer o termo como expressão cultural, mas de o ajustar à realidade política e institucional».
Nos manuais que o Governo navarro considera repudiáveis, as alusões a Euskal Herria cingem-se a esta consideração como entidade cultural. Contudo, isto não interessa ao Governo UPN-CDN, que ameaça proibi-los directamente.
Revisão iminente
Embora o conselheiro da Educação não tenha avançado com nomes até à data, debaixo de fogo parecem estar três editoriais bascas que surgem entre as mais utilizadas nos centros educativos, também em Nafarroa. Matiza que, na realidade, 80% das escolas nem sequer responderam à inspecção, ou seja, não precisaram que manuais empregam. Pérez-Nievas insinua também que alguns professores utilizam materiais próprios nos quais vem incluído o termo que o Governo de Miguel Sanz combate. Em teoria, a liberdade de ensino é um direito reconhecido aos docentes.
Assim sendo, o Departamento de Educação anuncia uma nova inspecção para a semana que vem, centrada nos manuais utilizados neste ano lectivo na disciplina de Inguruaren Ezaguera (Conhecimento do Meio). E avisa desde já que se irá actuar num duplo sentido: «Haverá casos em que bastará incluir uns folhetos referentes a Navarra, que o departamento até já elaborou; noutros será impossível mantê-los», diz Pérez-Nievas. Nestes últimos casos, haverá inclusive a hipótese de abertura de processos sancionadores, o que significaria um salto qualitativo.
O Departamento de Educação argumenta que em Março último já enviou uma nota às escolas, na qual lhes pedia que se cingissem ao currículo imposto pelo Governo.
Um exemplo
Os manuais de texto homologados pelo Governo de Miguel Sanz não fazem menção alguma a Euskal Herria nem admitem qualquer laço histórico ou cultural entre Nafarroa e os restantes herrialdes bascos.
Para dar um exemplo tirado ao acaso, no livro de Inguruaren Ezaguera do quinto ano da Primária, da editorial Anaya, podem encontrar-se treze mapas do Estado espanhol, sendo que não existe um único que delimite o conjunto de Euskal Herria, e que são muito poucos os exclusivamente relativos a Nafarroa.
Esta surge sempre definida como «comunidade foral», junto à «CAB» e a «França». Um dos capítulos dedica-se exclusivamente à «organização de Espanha», explicando-se que são a Constituição, as comunidades autónomas, o Congresso, o Senado, o Tribunal Constitucional ou Supremo Tribunal, além de identificar Juan Carlos I, mas não outras autoridades, nem estatais nem navarras.
Na parte dedicada à história, faz-se referência ao reino independente de Nafarroa, mas não ao modo como desapareceu. Referem-se, sim, «as conquistas» dos Reis Católicos ou «o descobrimento da América».
Oito anos depois dos livros «traduzidos» com dinheiro público
O ataque anunciado pelo Departamento da Educação de Pérez-Nievas recordou o que foi lançado na sua época pelo departamento de Jesús Laguna. Foi em 2001, também com Miguel Sanz como presidente do Governo navarro. O seu executivo afirmou que os manuais de texto que se utilizavam nas escolas públicas e privadas não se cingiam ao currículo imposto e, como tal, tomou uma medida sem precedentes: subsidiar a edição de livros em euskara que excluíssem o conceito de Euskal Herria e se limitassem a mostrar uma Navarra espanhola e sem relação com os restantes herrialdes bascos.
Editoriais bascas como Elkarlanean e Erein viraram as costas àquela proposta, à qual concorreram duas madrilenas - Anaya e Santillana - e duas catalãs - Edebé e Vicens-Vives. O Governo atribuiu-lhes quase 200 000 euros para que elaborassem os novos materiais homologados. Na realidade, o trabalho consistiu em traduzir para o euskara os livros que se utilizavam em castelhano. A denominação Euskal Herria desapareceu completamente de textos em que, ao invés, as referências a Espanha eram abundantes e as referências de Nafarroa minguavam. A título de exemplo, afirmava-se que o dia de Aragão é 23 de Abril, mas não que o de Nafarroa é 3 de Dezembro.
Depois da apresentação dos novos livros subsidiados, professores de ikastolas e escolas públicas anunciaram que não os iriam utilizar e reivindicaram o seu direito à liberdade de ensino. O estudo agora levado a cabo por Carlos Pérez-Nievas aponta para que efectivamente esses manuais apoiados com dinheiro público continuem ausentes de uma boa parte das escolas.
Ramón SOLA
Fonte: Gara