sexta-feira, 30 de outubro de 2009

Brian Currin confirma a iniciativa do Batasuna e define-a como «louvável»


Depois de ter assistido atónito às especulações lançadas em meios espanhóis sobre a sua acção em Euskal Herria - «ninguém me chamou» -, o experiente mediador sul-africano Brian Currin rompeu o silêncio em Donostia na quarta-feira. Confirmou que conhece a iniciativa política do Batasuna e que acredita firmemente nela: «Posso dizer que é louvável e potencialmente inovadora». Por isso, pediu que seja apoiada e garantiu que um processo assim lograria o apoio internacional.

Nas últimas semanas, na sequência dos avanços sobre movimentos da esquerda abertzale, o nome de Brian Currin foi ouvido em muitos meios. Mas até esta quarta-feira não o tinham ouvido a ele. Currin interveio em Donostia numa conferência organizada por Lokarri, e ali admitiu que há alguns meses realizou um trabalho pedido pela esquerda abertzale sobre a formação de um bloco anti-apartheid no seu país nos anos 80. Mas, sobretudo, confirmou que conhece a nova estratégia política proposta pelo Batasuna, garantindo ao auditório que se trata de uma proposta com novidades e que, se for levada à prática, «poderá ter um efeito profundo na cena política de Euskal Herria».

Currin foi muito explícito ao apontar que tipo de participação teve em trabalhos que se desenrolaram «nos últimos dezasseis meses». Manteve mais discrição, logicamente, sobre outras questões que permanecem em aberto, mas sobre as quais disse estar bem informado, como as possibilidades de apoio internacional a um eventual processo de paz. «Não lhes posso dizer que Gordon Brown ou Barack Obama farão declarações sobre aquilo que se vai passar no País Basco, mas digo-lhes, isso sim, que a comunidade internacional não ficará calada se vir uma oportunidade de alcançar a paz no último conflito violento na Europa Ocidental».

Uma proposta «louvável»
De Currin sabia-se até esta quarta-feira que foi uma figura importante na resolução do conflito da África do Sul - trabalhou na Comissão da Verdade. Também que colaborou posteriormente no Norte da Irlanda - coordenou a Comissão de Revisão de Sentenças - e que foi mediador no Sri Lanka, no Ruanda ou no Médio Oriente. Faltava saber qual era o seu grau de envolvimento em Euskal Herria. Currin lamentou que periodicamente lhe telefonem para o informar de que o seu nome aparece nos meios de comunicação espanhóis, «mas ninguém me chamou, e eu pensava que contrastar estas coisas fazia parte da ética jornalística».

Depois desta queixa, referiu que em Julho de 2008 «líderes da esquerda independentista» lhe pediram um relatório que descrevesse como as forças anti-apartheid sul-africanas se uniram e conseguiram intervir legalmente na política. Também lhe consta que depois, entre Setembro e Novembro do ano passado, houve «amplas consultas» sobre aquela estratégia e as suas possíveis aplicações em Euskal Herria. «Esse documento gerou um processo que ganhou uma vida própria. Eu não procuro qualquer mérito. Foram examinadas as estratégias e as consequências. Em Dezembro li que Arnaldo Otegi começava a falar de um novo projecto político diferente do do passado. Sei que houve mais consultas entre Dezembro e Abril deste ano, e que se desenvolveu um posicionamento sobre a violência».

Chegado a este ponto, Currin foi contundente: «Eu sei o que há nesse posicionamento e posso-lhes garantir que é recomendável».

«Apoiem-na»
Currin tinha começado a sua alocução aludindo às detenções de Arnaldo Otegi, Rafa Díez e seus companheiros, e admitiu o seu assombro: «Claramente, o Governo espanhol parece saber que houve consultas entre a esquerda independentista e a ETA, mas se essas consultas têm a ver com um processo de paz, como se pode processar essas pessoas?», perguntou.
Perante um auditório que não perdia pitada, o mediador sul-africano admitiu que só pode avançar uma hipótese sobre o motivo: «Sei que existe uma desconfiança mútua entre a esquerda independentista e a maioria dos partidos, se não todos. Sei-o porque o testemunhei. Pode ser que Madrid, e não digo isto com ligeireza, deseje aprofundar essa desconfiança, porque não quer que essa iniciativa tenha êxito. Porquê? Talvez porque o PSOE está agora à frente do Governo basco?».

Assim sendo, Currin deixou uma última mensagem, que admitiu que podia ser vista como «ingénua» ao ser formulada ante rivais políticos da esquerda abertzale: «Creio sinceramente que esse movimento está verdadeiramente comprometido com uma estratégia alternativa. Apoiem esta iniciativa. Com isso, não apoiam a esquerda abertzale, apenas apoiam um projecto que precisa de ser inclusivo. Se não começam a confiar uns nos outros, não existe qualquer possibilidade de encontrar uma solução». Ouviram-no, entre outros, Juan José Ibarretxe, Joseba Egibar, Markel Olano ou Aintzane Ezenarro.

Ramón SOLA
Fonte: Gara