Julen LARRINAGA, condenado no processo 33/01, entrevistado por Manex ALTUNA
Porta-voz do Movimento pró-Amnistia durante muitos anos, este bilbaíno prepara-se para enfrentar uma terceira experiência na prisão, depois de cumprir uma pena de seis anos na década de 90 e quase quatro anos de prisão preventiva após ser detido na operação policial que desembocou no processo 33/01, instruído pelo juiz Baltasar Garzón.
Esta entrevista foi realizada antes de que o Supremo Tribunal espanhol emitisse o acórdão contra as Gestoras pró-Amnistia e a Askatasuna.
Têm alguma esperança na sentença do Supremo?
Como dissemos no julgamento, temos por certa uma condenação. A sentença está decidida pelo Governo espanhol, que a dada altura decidiu dar início a uma onda de ilegalizações por motivos políticos e que não vai ser travada por nenhum poder do Estado. Não há uma divisão de poderes, e, à base de retorcer leis, o «Estado de Direito» de que falavam converteu-se num Estado policial com um dos maiores ratios de gente armada no mundo. Pode haver alguma modificação nas penas, mas seria uma maquilhagem para dar uma imagem de maiores garantias, porque a ilegalização e o encarceramento de militantes vai-se manter.
Por isso renunciaram à defesa jurídica?
A análise que fazíamos antes do julgamento era a de que em processos anteriores, como o do «caso Jarrai-Haika-Segi» ou do 18/98, se tinha tentado utilizar mecanismos jurídicos face a provas inexistentes, mas vimos que ia dar ao mesmo porque a decisão estava tomada. Portanto, a nossa intenção foi pôr às claras que se tratava de um julgamento político.
Também denunciaram a repressão na Audiência Nacional.
Nos últimos 30 anos o Estado espanhol recorreu a todo o tipo de violência contra a dissidência basca. Desde a guerra suja até políticas penitenciárias de extermínio, deportação, atirar a matar em manifestações, perseguição política com base nas ilegalizações, brutalidade policial, tortura... A utilização da violência gerou uma grande bolsa de perseguidos políticos que o Estado terá de assumir. O Movimento pró-Amnistia sempre trabalhou com este colectivo e quisemos dizer em tribunal que poderão ilegalizar as estruturas e encarcerar os militantes mas que nenhum perseguido político irá ficar sozinho.
De que são acusados?
É curioso que na sentença da Audiência Nacional se rejeitem todas as acusações feitas
por Garzón por falta de provas, mas ilegalizam-nos com base na teoria de que «tudo é ETA» por via ideológica. Acusam-nos de trabalhar ideologicamente para a ETA por denunciarmos a situação nas prisões ou a tortura, quando o Estado é que é o causador da dispersão ou da repressão, e das dinâmicas que surgem naturalmente contra ele.
Qual é objectivo que o Estado persegue com as ilegalizações?
Quando o Estado empreendeu uma estratégia a longo prazo de perseguição política a nível penal, juntou todos os poderes para que não houvesse qualquer voz crítica em Euskal Herria ou no Estado espanhol. Tenta aniquilar a esquerda abertzale para que perca a esperança, deixe de ser uma referência política e não tenha a iniciativa. Espera gerar uma espécie de crack na esquerda abertzale para depois pedir uma solução a qualquer preço - que para o Estado é zero - tanto à ETA como aos restantes agentes políticos.
E com o processo 33/01?
O Estado quer garantir a sua impunidade, além de deixar à deriva todo o colectivo de perseguidos políticos. Pretende que não sobre ninguém para pôr em causa que isto é uma democracia. Sempre tiveram impunidade, mas havia espaço para a crítica. Agora querem uma impunidade total, para empreenderem uma via de aniquilamento a curto prazo.
A sentença de Estrasburgo dá cobertura a toda esta estratégia?
O relator da ONU apresentou um relatório demolidor para os interesses do Estado no que respeita ao conflito basco. Esperava-se que Estrasburgo também emitisse uma sentença que não validasse as teses espanholas. Contudo, vimos a capacidade de pressão diplomática que o Estado espanhol possui. Dá a impressão de que nas instâncias internacionais se vendeu a ideia de que era uma sentença sem alcance porque num espaço de três ou quatro anos a dissidência basca seria aniquilada. Também chama a atenção a terminologia utilizada, porque era copiada de sentenças da Audiência Nacional e do Supremo. Depois, soubemos que um dos juízes era espanhol. Vamos ver se o recurso chega à grande sala.
Como vê a actual situação?
As formas de repressão mudam, mas a vontade de reprimir em vez de buscar soluções políticas mantém-se. Têm vindo a aperfeiçoar a repressão, aplicando a brutalidade policial a conta-gotas. Já não é repressão, é aplicação do Estado de Direito. As leis especiais permitiram uma perseguição política mais dura até que no franquismo. Não obstante, em vez de exibirem força, mostram debilidade. O Estado dá por perdida a batalha ideológica em Euskal Herria, já que carece de projecto político, como demonstrou no último processo de negociação. Tem pavor da decisão dos cidadãos e por isso ataca a esquerda abertzale, por entender que é o motor da demanda de soberania. Apostam na repressão para ganhar tempo e também mantêm o PNV sob rédea curta, com os interesses do Estado. O paradoxo é que o Estado tem força para reprimir, mas instituições como tribunais ou a Guarda Civil encontram-se deslegitimadas entre sectores que vão para lá da esquerda abertzale, como o EA, a IU ou mesmo o PNV.
Como se lhe pode fazer frente?
Na minha opinião pessoal, acho que é preciso articular uma união de forças soberanistas. Não é novidade nenhuma, já se tentou o mesmo em Txiberta, Lizarra-Garazi ou na proposta de Bergara, tendo fracassado pelas diferenças de interesses. Penso que é preciso haver união e fazer uma exigência unitária a Madrid para encaminhar o conflito político para vias democráticas. É necessário dar a volta a esta situação que o Estado quer impor com a repressão e sair em direcção a um outro cenário, em que o Estado espanhol sabe que vai ter problemas.
E o Movimento pró-Amnistia?
É preciso prosseguir com o trabalho de denúncia e solidariedade, apesar das proibições. A denúncia da repressão teve sempre consequências, mas a bolsa de perseguidos políticos que está a gerar é cada vez maior. E esse colectivo tem um potencial político enorme para denunciar e exigir uma reparação histórica.
Fonte: Gara
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Entre sexta e sábado: «Detidos sete dos oito membros das Gestoras pró-Amnistia e da Askatasuna que estavam em liberdade», em Gara
Porta-voz do Movimento pró-Amnistia durante muitos anos, este bilbaíno prepara-se para enfrentar uma terceira experiência na prisão, depois de cumprir uma pena de seis anos na década de 90 e quase quatro anos de prisão preventiva após ser detido na operação policial que desembocou no processo 33/01, instruído pelo juiz Baltasar Garzón.
Esta entrevista foi realizada antes de que o Supremo Tribunal espanhol emitisse o acórdão contra as Gestoras pró-Amnistia e a Askatasuna.
Têm alguma esperança na sentença do Supremo?
Como dissemos no julgamento, temos por certa uma condenação. A sentença está decidida pelo Governo espanhol, que a dada altura decidiu dar início a uma onda de ilegalizações por motivos políticos e que não vai ser travada por nenhum poder do Estado. Não há uma divisão de poderes, e, à base de retorcer leis, o «Estado de Direito» de que falavam converteu-se num Estado policial com um dos maiores ratios de gente armada no mundo. Pode haver alguma modificação nas penas, mas seria uma maquilhagem para dar uma imagem de maiores garantias, porque a ilegalização e o encarceramento de militantes vai-se manter.
Por isso renunciaram à defesa jurídica?
A análise que fazíamos antes do julgamento era a de que em processos anteriores, como o do «caso Jarrai-Haika-Segi» ou do 18/98, se tinha tentado utilizar mecanismos jurídicos face a provas inexistentes, mas vimos que ia dar ao mesmo porque a decisão estava tomada. Portanto, a nossa intenção foi pôr às claras que se tratava de um julgamento político.
Também denunciaram a repressão na Audiência Nacional.
Nos últimos 30 anos o Estado espanhol recorreu a todo o tipo de violência contra a dissidência basca. Desde a guerra suja até políticas penitenciárias de extermínio, deportação, atirar a matar em manifestações, perseguição política com base nas ilegalizações, brutalidade policial, tortura... A utilização da violência gerou uma grande bolsa de perseguidos políticos que o Estado terá de assumir. O Movimento pró-Amnistia sempre trabalhou com este colectivo e quisemos dizer em tribunal que poderão ilegalizar as estruturas e encarcerar os militantes mas que nenhum perseguido político irá ficar sozinho.
De que são acusados?
É curioso que na sentença da Audiência Nacional se rejeitem todas as acusações feitas
por Garzón por falta de provas, mas ilegalizam-nos com base na teoria de que «tudo é ETA» por via ideológica. Acusam-nos de trabalhar ideologicamente para a ETA por denunciarmos a situação nas prisões ou a tortura, quando o Estado é que é o causador da dispersão ou da repressão, e das dinâmicas que surgem naturalmente contra ele.
Qual é objectivo que o Estado persegue com as ilegalizações?
Quando o Estado empreendeu uma estratégia a longo prazo de perseguição política a nível penal, juntou todos os poderes para que não houvesse qualquer voz crítica em Euskal Herria ou no Estado espanhol. Tenta aniquilar a esquerda abertzale para que perca a esperança, deixe de ser uma referência política e não tenha a iniciativa. Espera gerar uma espécie de crack na esquerda abertzale para depois pedir uma solução a qualquer preço - que para o Estado é zero - tanto à ETA como aos restantes agentes políticos.
E com o processo 33/01?
O Estado quer garantir a sua impunidade, além de deixar à deriva todo o colectivo de perseguidos políticos. Pretende que não sobre ninguém para pôr em causa que isto é uma democracia. Sempre tiveram impunidade, mas havia espaço para a crítica. Agora querem uma impunidade total, para empreenderem uma via de aniquilamento a curto prazo.
A sentença de Estrasburgo dá cobertura a toda esta estratégia?
O relator da ONU apresentou um relatório demolidor para os interesses do Estado no que respeita ao conflito basco. Esperava-se que Estrasburgo também emitisse uma sentença que não validasse as teses espanholas. Contudo, vimos a capacidade de pressão diplomática que o Estado espanhol possui. Dá a impressão de que nas instâncias internacionais se vendeu a ideia de que era uma sentença sem alcance porque num espaço de três ou quatro anos a dissidência basca seria aniquilada. Também chama a atenção a terminologia utilizada, porque era copiada de sentenças da Audiência Nacional e do Supremo. Depois, soubemos que um dos juízes era espanhol. Vamos ver se o recurso chega à grande sala.
Como vê a actual situação?
As formas de repressão mudam, mas a vontade de reprimir em vez de buscar soluções políticas mantém-se. Têm vindo a aperfeiçoar a repressão, aplicando a brutalidade policial a conta-gotas. Já não é repressão, é aplicação do Estado de Direito. As leis especiais permitiram uma perseguição política mais dura até que no franquismo. Não obstante, em vez de exibirem força, mostram debilidade. O Estado dá por perdida a batalha ideológica em Euskal Herria, já que carece de projecto político, como demonstrou no último processo de negociação. Tem pavor da decisão dos cidadãos e por isso ataca a esquerda abertzale, por entender que é o motor da demanda de soberania. Apostam na repressão para ganhar tempo e também mantêm o PNV sob rédea curta, com os interesses do Estado. O paradoxo é que o Estado tem força para reprimir, mas instituições como tribunais ou a Guarda Civil encontram-se deslegitimadas entre sectores que vão para lá da esquerda abertzale, como o EA, a IU ou mesmo o PNV.
Como se lhe pode fazer frente?
Na minha opinião pessoal, acho que é preciso articular uma união de forças soberanistas. Não é novidade nenhuma, já se tentou o mesmo em Txiberta, Lizarra-Garazi ou na proposta de Bergara, tendo fracassado pelas diferenças de interesses. Penso que é preciso haver união e fazer uma exigência unitária a Madrid para encaminhar o conflito político para vias democráticas. É necessário dar a volta a esta situação que o Estado quer impor com a repressão e sair em direcção a um outro cenário, em que o Estado espanhol sabe que vai ter problemas.
E o Movimento pró-Amnistia?
É preciso prosseguir com o trabalho de denúncia e solidariedade, apesar das proibições. A denúncia da repressão teve sempre consequências, mas a bolsa de perseguidos políticos que está a gerar é cada vez maior. E esse colectivo tem um potencial político enorme para denunciar e exigir uma reparação histórica.
Fonte: Gara
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Entre sexta e sábado: «Detidos sete dos oito membros das Gestoras pró-Amnistia e da Askatasuna que estavam em liberdade», em Gara
"Ainhoa Irastortza, Iker Zubiaga, Jagoba Terrones, Gorka Zulaika, Jon Imanol Beaskoa, Aratz Estomba e Josu Beaumont, sete dos oito membros das Gestoras pró-Amnistia condenados pelo Supremo Tribunal espanhol por pertencerem ao colectivo de apoio a presos políticos bascos, foram detidos entre sexta à noite e ontem, após a ordem de prisão decretada pela Audiência Nacional espanhola".