terça-feira, 23 de março de 2010

Examinar e domar


Não pensem que exagero se disser que o tiroteio de Dammarie-les-Lys e a morte do gendarme Jean-Serge Nérin encheu de satisfação - não dissimulada, por outro lado - uma boa parte da classe política espanhola e os seus terminais em Euskal Herria.

Crêem alguns - muitos - que a acção atribuída à ETA vai provocar o envolvimento louco das forças policiais francesas no combate aos clandestinos da ETA no hexágono. Como se até agora a atitude do Eliseu tivesse sido displicente com os insurrectos bascos do sul. O tempo o dirá.

Mas, muito para lá dos aspectos policiais e operacionais, a satisfação dessa classe política fundamenta-se na possibilidade que lhes é oferecida para examinar a esquerda independentista e tratar de a domar. Falam sem pudor da prova do algodão, do grau de exigência na condenação, no repúdio ou na reprovação. Como o professor de ginástica, elevam a cada passo a fasquia a superar para marcar um «aprovado».

Não vale a análise política, a reflexão ética ou a memória histórica. Tudo se reduz a um simples tópico: condenamos a ETA. Como se a resolução de um conflito político que tem raízes fundas na História se resolvesse com uma palavra, assim como a história do centurião no Evangelho Cristão (Mateus 8, 5-8): «Dizei uma palavra e serei salvo».

Não sei o que farão os franceses ou quais serão os frutos das ameaças do presidente Sarkozy, mas há algo que não me escapa: nem o conflito basco se resolverá com pronunciamentos mais ou menos farisaicos nem é esse, sequer, o objectivo que persegue o unionismo espanhol.

Não procuram o repúdio nem a condenação. Não é isso. Porque sabem que o seu problema não é a ETA. O seu problema é o pecado original do regime espanhol, imposto à força aos bascos, desenhado nas suas linhas mestras por Franco e seus acólitos. E o seu drama é que um sector importante da sociedade basca não está disposto a acreditar em histórias do arco-da-velha. Por isso, quando exigem a condenação da ETA, o que na realidade querem é a renúncia ao objectivo da independência basca. Por isso se enganam outra vez. O ministro Alfredo Pérez Rubalcaba percorre exactamente o mesmo caminho que os seus predecessores.

Martin GARITANO
jornalista
Fonte: Gara