quinta-feira, 4 de março de 2010

Inabilitação


Espanha continua a ser um filme de Buñuel. Todos estes anos passaram em vão. A miséria sangrenta e descarada, a escatologia trágica, o não-humor negro (porque não se lhe pode chamar humor, não nos faz rir, mas chorar) mostra repetidamente a sua fronha suja através do verniz de civilização que lhe quiseram aplicar após a morte de Franco.

Desde sempre, os estados não hesitaram em recorrer a todo o tipo de meios para alcançar os seus objectivos. Mas Espanha, que se considera um membro do grupo das «democracias ocidentais», também não hesita em fazer uma figura ridícula para lograr os seus fins.

E um objectivo prioritário do Estado espanhol no seu contencioso com Euskal Herria é que a esquerda abertzale não consiga levar por diante o seu projecto de unir as forças independentistas, e fará o impossível para o impedir.

E ontem voltou-nos a surpreender na sua descarnada crueza.

Uma juíza tosca («Por mí como si bebe vino»), ignorante («Mandela nunca ha sido un terrorista, era un pacifista») e incompetente («Quiten éso, no se entiende ni papa» -referindo-se à principal prova de acusação) inabilitou por 16 anos um dos políticos mais brilhantes do país vizinho.

Deixando de lado o fundo da questão, a ausência de pertinência do julgamento, ou a injustiça palpável da sentença, é uma metáfora perfeita do estado dos poderes públicos no Reino de Espanha.

Espelho perfeito da crueldade gratuita. Uma tragédia pelas suas consequências. Mas, na sua actuação e trajectória, uma farsa. Buñuel em estado puro.

E Gatza continua na prisão.

I. GARDEAZABAL
Fonte: kaosenlared.net