sexta-feira, 15 de maio de 2009

Todo um mundo de democracia: a Iniciativa Internacionalista à beira da ilegalização por contaminação basca*


O Supremo Tribunal concedeu à Iniciativa Internacionalista um prazo que termina hoje às 18h para que apresente alegações contra as impugnações da Procuradoria e da Magistratura do Estado, depois de a defesa da formação política ter pedido que o prazo se prolongasse até às 23h.


O afã ilegalizador dos governos espanhóis não tem fronteiras. A Magistratura do Estado e da Procuradoria formalizaram ontem a impugnação da candidatura estatal de esquerda Iniciativa Internacionalista ao considerarem-na um instrumento do "conjunto" ETA-Batasuna. A acusação baseia-se no currículo político de Alfonso Sastre, que inclui a participação em diversas listas independentistas bascas, e ainda no facto de outras candidatas como Doris Benegas e Ángeles Maestro terem tido contactos com a esquerda abertzale e participado em manifestações em Euskal Herria.
O Supremo Tribunal concedeu à Iniciativa Internacionalista um prazo que termina hoje às 18h para que apresente alegações contra as impugnações da Procuradoria e da Magistratura do Estado, depois de a defesa da formação política ter pedido que o prazo se prolongasse até às 23h.
Os magistrados da Sala do 61 vão continuar a deliberar a partir das 17h de hoje, e deverão tomar uma decisão antes da meia-noite de amanhã.

Comunicado da esquerda abertzale
Neste contexto, a esquerda abertzale tornou público um comunicado ontem à tarde em que, ao mesmo tempo que denuncia a intoxicação que está a ocorrer, lembra que a sua aposta eleitoral para as eleições europeias é conhecida: Euskal Herriaren Alde, ainda que apenas seja uma candidatura legal em Lapurdi, Zuberoa e Nafarroa Behera [Ipar Euskal Herria / País Basco Norte].

O texto refere que “a esquerda abertzale já manifestou na devida altura que a sua opção para as próximas eleições europeias era a de formar uma candidatura nacional que, sob a designação de Euskal Herriaren Alde, abarcasse o conjunto de Euskal Herria e respondesse à necessidade de juntar forças soberanistas-independentistas em defesa da consecução de um cenário democrático e da construção de um Estado basco a partir da esquerda. Uma opção que apenas se pôde materializar legalmente em Ipar Euskal Herria, já que as restantes forças políticas chamadas a participar no referido projecto voltaram a antepor os seus interesses partidários aos interesses do país”.

Depois deste primeiro esclarecimento, “a esquerda abertzale nega a suposta promoção e instrumentalização pela sua parte” da candidatura Iniciativa Internacionalista.
Esta diferenciação não impede “a esquerda abertzale de querer transmitir publicamente a sua solidariedade às pessoas que fazem parte da candidatura Iniciativa Internacionalista-La Solidaridad entre los Pueblos e em especial a Alfonso Sastre, face ao que constitui uma verdadeira caça de bruxas ideológica e pessoal”. Apela ainda “às restantes forças políticas que denunciem publicamente esta nova agressão antidemocrática e exijam a derrogação imediata da Lei de Partidos”.

Decidido no Ministério
A Procuradoria e Governo pediram ontem ao Supremo Tribunal espanhol que impeça a Iniciativa Internacionalista de concorrer às próximas eleições europeias, por considerar que se trata de uma lista “pilotada” pela ETA para “elevar a moral” das suas bases após as ilegalizações levadas a cabo em anteriores eleições.

É significativo que nestas denúncias não só não se inclua qualquer prova de relação desta candidatura com a ETA como se chegue ao ponto de especular sobre o que a organização armada pretenderia no caso de serem certas as acusações.

Durante os últimos dias tanto a Magistratura do Estado como a Procuradoria tinham mostrado algumas dúvidas quanto à validade dos dados de que dispunham para impugnar a candidatura. Mas a decisão acabou por ser tomada numa reunião com os ministros do Interior e da Justiça.

Assim o explicou aos jornalistas o Magistrado do Estado, Joaquín de Fuentes Bardají, depois de apresentar no Alto Tribunal o pedido de anulação.
“Estivemos ontem [na quarta-feira] com os ministros do Interior e da Justiça a ver as provas e entendeu-se que havia prova suficiente para pedir ao Supremo a ilegalização da lista e a impossibilidade de se apresentar às eleições”, disse De Fuentes.

As «provas»
Aquilo a que o Magistrado do Estado chama “provas” baseia-se, sobretudo, numa parte do extenso currículo político do dramaturgo Alfonso Sastre. São invocadas as diferentes candidaturas independentistas em que participou (a maior parte delas legais) e alguns artigos de imprensa que assinou. Tudo isto chega para o considerar “a pessoa que de forma mais evidente e significativa se encontra vinculada à organização terrorista”.

Também são esmiuçadas as supostas ligações da número 2 da candidatura, Doris Benegas, e da número 5, Ángeles Maestro, à esquerda abertzale, que inclui a participação em manifestações, apoios a protestos, ter sido testemunha de defesa em julgamentos e até a participação num documentário sobre os fuzilamentos de Txiki e Otaegi. Tudo dentro da mais estrita legalidade.

Tanto estas “provas” como outras referentes as ligações dos avalistas da candidatura vêm demonstrar o estreito controlo político que as Forças de Segurança do Estado têm vindo a exercer sobre determinadas pessoas.

É também significativo que se pretenda utilizar como “prova” o seguinte: quando “a imprensa voltou a fazer eco desta pertença ao complexo ETA/BATASUNA nas últimas semanas, perante a evidência de que esta candidatura ia ser utilizada pela organização terrorista para se apresentar às eleições europeias. Nem então nem agora nenhum dos candidatos ou responsáveis fizeram o menor protesto, nuance, precisão ou esclarecimento. Nem sequer fizeram uma tentativa cosmética de lavar a mácula que, para uma candidatura com pretensões de acesso ao Parlamento europeu, pudesse implicar a ligação a uma organização terrorista. Nada”.

Esta acusação é rotundamente falsa. No dia 7 de Maio Doris Benegas, em declarações à Europa Press, negou que algum representante do Batasuna ou da rede do MLNB se tivesse posto em contacto com a sua formação política com vista às eleições de 7 de Junho, e isso foi divulgado em diversos órgãos de informação.

É também de salientar o argumento da acusação segundo o qual a militância da Izquierda Castellana e Comuner@s, partidos legais e base da Iniciativa Internacionalista, “é muito reduzida, sem infra-estrutura e recursos económicos, o que questiona a sua capacidade de poder enfrentar umas eleições europeias, a não ser que conte com o apoio e a infra-estrutura de alguma outra formação”. No entanto, não são poucos – e os dados podem encontrar-se na página de Internet do Ministério do Interior – os partidos que, com menos apoios que os mencionados, participaram e participam nas eleições europeias.

Ao longo do dia de ontem, formações como ERC, PNV, EA, Aralar mostraram a sua oposição a esta nova utilização arbitrária da Lei de Partidos. A IU [Esquerda Unida], pelo contrário, disse que aquilo que os tribunais decidirem estará bem decidido, pedindo ao mesmo tempo aos vereadores do CUT de Juan Manuel Sánchez Gordillo, autarca de Marinaleda, que retirem o aval concedido à II.

O editorial do GARA, como prova de acusação
A Magistratura do Estado apresentou ontem de manhã no Supremo Tribunal um novo documento a incluir na demanda contra a lista da Iniciativa Internacionalista-La Solidaridad entre los Pueblos (II-SP), com o propósito de constituir como prova um editorial publicado pelo diário GARA, no qual, segundo refere o documento, “fica claro que a candidatura impugnada responde aos desígnios da rede ETA/Batasuna”. O editorial, intitulado «El miedo a la libertad extiende la sinrazón» reunia argumentos já conhecidos deste diário contra as ilegalizações e que pouco se afastam das críticas que a actuação estatal nesta matéria suscitou, por exemplo, em partidos como EA, PNV e Aralar.

A inclusão do editorial de ontem nas “provas” acusatórias contra a candidatura serve para ter uma ideia da solidez jurídica dos recursos apresentados pela Magistratura do Estado e pela Procuradoria contra essa lista estatal de esquerda.

Fonte: Gara

* O título não corresponde à tradução do título original.