quarta-feira, 3 de fevereiro de 2010

Cruzadas


De espada na mão e ao grito de Deus le volt, os exércitos cristãos deixaram, durante três séculos e oito cruzadas, a sua marca de sangue em territórios que não lhes pertenciam. O fervor religioso e a guerra santa (o que chamamos fundamentalismo quando falamos do Islão) ocultavam os interesses expansionistas de reis e nobres feudais e o insaciável afã de poder dos papas. Espada e arcabuz na mão, os conquistadores espanhóis precederam monges e sacerdotes, abrindo caminho a ferro e fogo à evangelização das Índias. Devotos a Maria Santíssima, partilharam os gozos da missão divina e os frutos da imposição, do genocídio e da espoliação.

A golpes de chicote e potro, a Inquisição dedicou-se, para maior glória de Deus, à tarefa de acabar com o ambiente satânico, submetendo a interrogatórios demenciais centenas de infelizes sobre quem pesava a denúncia de ser judaizante, necromante, bruxa ou cabalista e mandando para a fogueira os que sobreviveram aos longos meses de tortura. De armas na mão, os golpistas assassinaram por Deus e por Espanha milhares de pessoas enquanto a igreja saudava de braço erguido a nova Cruzada e permitia que o ditador passeasse sob o pálio.

Ester Lakasta contava há alguns dias que, quando perguntaram ao bispo Sebastián se lhe parecia cristã a punição extra da dispersão, este se limitou a responder «mas eu não ando com pistolas». Pode ser que se tenha esquecido da história de uma igreja que, quando não empunhou as armas, fez uso delas e, quando não, benzeu-as. Ou que tenha a dispersão na conta de nova cruzada, um outro Deus le volt. Outro por Deus e por Espanha.

Gloria REKARTE
preso-ohia / ex-presa

Fonte: Gara