quinta-feira, 17 de dezembro de 2009

Apresentam como «peritos» guardas civis que pediram o fechamento do «Egunkaria»

Tasio (Gara)

A segunda sessão do julgamento do «caso Egunkaria» teve o seu quê. Dois guardas civis citados para prestar declarações na qualidade de testemunhas reconheceram ontem ter investigado e feito relatórios sobre os processados e muitas outras pessoas e empresas. Um deles afirmou que, como instrutor do caso, até pediu o encerramento do Egunkaria. Estes dois agentes foram também propostos como «peritos» pelas acusações e deixaram claro que são parte interessada no processo.

Editorial: «Um povo unido contra um novo julgamento» (Gara, 16/12/2009)

As defesas de todos os processados nos julgamentos políticos realizados na Audiência Nacional espanhola denunciaram sempre a participação de polícias espanhóis na qualidade de «peritos», isto é, especialistas qualificados e supostamente imparciais. Tanto no «caso Jarrai-Haika-Segi», no 18/98 ou no processo contra as Gestoras pró-Amnistia e Askatasuna, os advogados dos imputados afirmaram que não podem ser considerados «especialistas» na ETA, já que não existe nenhum diploma ou estudo científico que sustente este conceito, como acontece na medicina ou em muitos outros campos. Além disso, sempre deixou às claras que os polícias que comparecem como «peritos» são parte interessada no processo, por terem participado nas investigações. O que não é tão habitual é que isto seja destacado na audiência oral, como ocorreu ontem.

Dois guardas civis que declararam na segunda sessão do julgamento do Egunkaria reconheceram este ponto ao responderem a questões colocadas por Iñigo Iruin, advogado de Martxelo Otamendi e Xabier Oleaga, e por José María Elosua, advogado de Iñaki Uria. Estes mesmos agentes foram propostos pelas acusações como «peritos» na fase posterior do julgamento. Pois bem, o primeiro deles disse que foi o instrutor do caso e, consequentemente, quem pediu ao juiz que decretasse as medidas necessárias para investigar determinadas pessoas e empresas relacionadas com a cultura basca. Segundo revelou, ele mesmo pediu ao magistrado Juan del Olmo o fechamento do Egunkaria, depois de Iruin insistir que a sua assinatura aparecia no processo.

Elosua perguntou-lhe por que razão decidiu redigir relatórios sobre uma vintena de empresas que os serviços de informação da Guarda Civil ligaram ao financiamento da ETA. Afirmou que as investigações começaram em 1996 - tomou como ponto referência, para se lembrar, a morte do ex-presidente do Tribunal Constitucional Francisco Tomás y Valiente num atentado - e referiu que encontraram «ligações, para nós evidentes», do diário encerrado à organização armada basca.

O agente disse que, como resultado dessas diligências, teve lugar a detenção de Joxe Mari Sors, imputado na causa económica contra o Egunkaria.
O segundo guarda civil a declarar afirmou ter participado como secretário nas declarações policiais dos arguidos e disse que, em substituição do instrutor, comunicou também aos juízes vários pedidos para investigar contas e realizar escutas telefónicas.

Uria... «tropeçou»
Os dois agentes confirmaram ter estado presentes nas declarações policiais realizadas pelos arguidos, mas negaram ter visto indícios de que os detidos tivessem sido torturados.

«Se alguma coisa me tivesse chamado a atenção, tinha-o enviado para o médico, mas era tudo normal naquela situação», respondeu ao ser questionado se tinha notado que Iñaki Uria apresentava alguma dor, coxeava ou respirava de forma ofegante. Pouco antes, contudo, ao responder a questões colocadas pela advogada da Dignidad y Justicia, afirmara que tiveram de levar Uria ao médico porque «tinha torcido um tornozelo».

O outro guarda civil afirmou que o zarauztarra «tropeçou» quando estava a ser conduzido ao forense. No primeira dia, Uria afirmou que sofreu uma lesão no pé depois de cinco dias em regime de incomunicação e que teve de fazer fisioterapia durante vários meses na prisão.

O instrutor da Guarda Civil também teve dúvidas quando o questionaram sobre os interrogatórios a Xabier Oleaga. Iruin perguntou-lhe se teve conhecimento de que perdeu a consciência e limitou-se a dizer que os forenses apenas «comunicam se necessitam de tratamento», embora depois tenha dito que, «se está registado nas incidências, será assim, mas não me lembro».

Os dois guardas civis reconheceram que foram processados nas denúncias de tortura que Uria e Oleaga apresentaram, mas escudaram-se no facto de as causas estarem arquivadas.

Os advogados perguntaram também aos dois agentes onde se encontrava o advogado de ofício nas declarações policiais. Os guardas civis afirmaram que se sentam atrás dos detidos, mas que estes podem olhar para eles se quiserem. Mas depois disseram que, ao mostrar o cartão de advogado, é «prática corrente» tapar a fotografia, por «motivos de segurança».

«Continuamos preocupados»
No final da audiência, Joan Mari Torrealdai fez algumas declarações em nome de todos os processados, tendo assinalado que continuam a estar «muito preocupados» porque as acusações «mantêm a sua tese». «Hoje vimos como o guarda civil que nos transformou em terroristas disse que todas as nossas empresas constituíam uma rede da ETA e que estavam ao serviço da ETA», criticou.
Torrealdai salientou o facto de termos «deixado bem claro que o Egunkaria é um projecto jornalístico, mediático e cultural, e que estivemos ao serviço do euskara e nunca ao serviço da ETA». E reiterou o apelo à participação na manifestação de sábado em Bilbau.

Manex ALTUNA
O Kontseilua pede que se repita o protesto de 2003
A manifestação de sábado em Bilbau contra este julgamento (Aita Donostia, 17h) acumula apoios. A direcção do Kontseilua fez ontem um apelo à participação. Foi numa conferência de imprensa que reuniu múltiplos representantes no âmbito do euskara. Com o secretário-geral do conselho, Xabier Mendiguren, compareceram Koldo Tellitu (Euskal Herriko Ikastolak), Joanmari Larrarte (EKT), Mikel Arrizabalaga (Elkar), Unai Larreategi (EHE), Sebastian Castet (Euskal Konfederazioa), Leire Muxika (Emun), Aritz Zerain (Bertsozale Elkartea) e Aurkene Urrusolo.

Tal como fizeram os arguidos antes de partir para Madrid, Mendiguren pediu que se repita a enorme mobilização de 2003, dias depois do encerramento policial do diário euskaldun. «Temos de responder pelo menos da mesma maneira que então», declarou. Realçaram o facto de que o processo supõe uma agressão contra todo o mundo do euskara e que «a única coisa que estas pessoas fizeram foi usar um direito fundamental em todos os povos: criar meios de comunicação na sua própria língua. Fazer uso da liberdade de expressão».

A esquerda abertzale junta-se ao protesto com uma nota em que situa este processo como «um ataque contra Euskal Herria», apelando, assim, à união de forças para «condicionar e incapacitar a acção repressiva do Estado». O Movimento pró-Amnistia é outro dos organismos que, por motivos semelhantes, anuncia a sua presença em Bilbau.
Fonte: Gara

«Deputados europeus apoiam o Egunkaria», de C.R.J., em lejournalPaysBasque - EHko Kazeta
"No momento em que teve início, anteontem o julgamento de Joan Mari Torrealdai, Xabier Oleaga, Txema Auzmendi, Iñaki Uria e Martxelo Otamendi na Audiência Nacional espanhola, os deputados Verts/ALE fizeram questão de manifestar o seu apoio aos cinco ex-dirigentes do diário Euskaldunon Egunkaria."