quarta-feira, 15 de outubro de 2008

Os torturadores de Joxi e Josean

A maior parte dos agentes da máxima confiança de Galindo receberam, em Intxaurrondo, um ano depois do sequestro de Lasa e Zabala, uma condecoração das mãos de Julen Elorriaga. Fica bem patente a impunidade que gozam os torturadores no Estado espanhol, exercendo idênticas funções inclusive depois de terem sido duplamente condenados por tal.

Quando Enrique Rodríguez Galindo orquestrou a partir do quartel de Intxaurrondo a trama obscena dos GAL, estava rodeado por um grupo de incondicionais da sua total confiança, três dos quais, Enrique Dorado, Felipe Bayo e Ángel Vaquero, foram condenados juntamente com ele por sequestrar, torturar, assassinar e enterrar em cal viva os refugiados Joxi e Josean.

E os restantes implicados? Um dos condenados, Bayo, implicou claramente Fidel del Hoyo, que era o segundo oficial de serviço de informação sob o comando de Galindo (o primeiro, Vaquero, foi condenado), mas o juiz instrutor decidiu que, embora soubesse que ambos os refugiados se encontravam sequestrados no palácio de La Cumbre, em Donostia, só devia ser processado por detenção ilegal, e esse delito já tinha prescrito.

O dito torturador esteve implicado em dois casos de tortura muito sonantes ocorridos no mesmo ano em que sequestraram Lasa e Zabala – 1983: foi o instrutor dos “interrogatórios” dos irmãos Olarra, e esteve acusado pelas torturas a Jokin Olano.

Além disso, foi condenado noutro caso ocorrido um ano depois: Ildefonso Melli Salazar foi selvaticamente torturado em 78, 82 e 84, e assim o denunciou na presença de um juiz nas três ocasiões, mas apenas na última se abriu um processo judicial, após o qual foi condenado Fidel del Hoyo, que ascendeu a capitão durante o processo, mais tarde a comandante... e vá-se lá saber que alta patente e alto cargo ocupa hoje em dia.

A vingança pela condenação não se fez esperar, e a 20 de Setembro de 1989 enviaram a Melli uma carta armadilhada, que explodiu quando o carteiro, José Antonio Cardosa, que teve morte instantânea, a tentava meter na caixa de correio da sua casa, em Orereta. O crime nunca foi esclarecido.

A maior parte dos agentes da máxima confiança de Galindo receberam, em Intxaurrondo, um ano depois do sequestro de Lasa e Zabala, uma condecoração das mãos do quinto condenado pelo crime, o Delegado do Governo, Julen Elorriaga, e um dos mais importantes deles, José Goli Domínguez Tuda, foi condenado nos dois casos sonantes de tortura antes mencionados... e indultado por duas vezes.

No curso da instrução do segundo caso, o de Jokin Olano, em plena campanha de atentados dos GAL, foram destruídos por engenhos explosivos o veículo e um estabelecimento comercial do torturado, e também sofreu um outro atentado intimidatório o forense do caso, Luís Moles, cujos relatórios corroboraram todas as denúncias da vítima.

A sentença do caso Olano, que também impôs penas a Dorado e Bayo, assassinos de Joxi e Josean, lembrou que “Goli” foi condenado por três delitos de tortura, e de imediato indultado (no caso dos irmãos Olarra), e denunciou “a pertinaz dedicação destes funcionários à prática da tortura e a inutilidade do indulto que se lhes outorgou”.

Pois bem, a 3 de Março de 1995, um decreto real, assinado pelo Rei e o ministro do Interior e da Justiça, Juan Alberto Belloch, decidiu indultá-lo novamente (com o beneplácito do PNV), e Belloch justificou-o manifestando que Goli tinha demonstrado “nos últimos onze anos de serviço em tarefas de investigação do terrorismo” que estava efectivamente reinserido.

Era fácil adivinhar o tipo de “tarefas” que desempenhou durante todo esse tempo, e no ano passado pudemos corroborar as nossas suspeitas: La Gaceta de los Negocios informou que na década de 90 “o tenente-coronel José Domínguez Tuda tinha a seu cargo os interrogatórios” em Intxaurrondo.

E hoje em dia Goli continua a estar destacado para esse quartel de tão sinistra memória (pelo menos estava lá até há bem pouco), e não seria nada de estranhar que continuasse a ter “a seu cargo os interrogatórios”.

Volta assim a ficar na mais absoluta evidência a impunidade que gozam os torturadores no Estado espanhol para continuar a exercer idênticas funções inclusive depois de terem sido duplamente condenados por tal... E ainda por cima no mesmo quartel!

Xabier MAKAZAGA
membro do Torturaren Aurkako Taldea [Grupo contra a Tortura]

Fonte: Gara