Unai Romano apresentou na segunda-feira passada uma denúncia de tortura no Tribunal Europeu dos Direitos do Homem, com sede em Estrasburgo, depois de o TC espanhol ter recusado analisar o seu caso e, assim, ter fechado todas as vias legais dentro do Estado espanhol. A denúncia de tortura do habitante de Gasteiz, que foi detido pela Guarda Civil a 6 de Setembro de 2001, foi feita poucos dias após a sua detenção e enquanto ainda permanecia sob incomunicação nas mãos dos militares, tal se ficando a dever ao facto de ter precisado de receber assistência num hospital madrileno e de este, em virtude do estado em que o paciente se encontrava, ter accionado a denúncia correspondente. A fotografia de Romano que mostraram na conferência de ontem em Donostia foi a mesma que detonou essa denúncia.
O Torturaren Aurkako Taldea [Grupo contra a Tortura] deu então a conhecer, ontem, em Donostia a acção interposta por Romano no Tribunal de Estrasburgo. Com Romano, também participou na conferência de imprensa o director do diário encerrado Egunkaria, ele mesmo autor de uma denúncia de tortura no Tribunal de Estrasburgo, há pouco mais de um mês. No caso de Martxelo Otamendi, o seu processo também esbarrou com o arquivamento em todas as instâncias espanholas.
Auto-lesão, segundo o forense
Foi a 17 de Abril último que o Tribunal Constitucional deu a conhecer a sua decisão de não admitir a tramitação do recurso interposto pelo jovem gasteiztarra contra os arquivamentos da sua denúncia ditados em tribunais da capital espanhola.
O representante do TAT Aiert Larrarte criticou a “penosa” resposta oferecida pela máxima instância judicial do Estado espanhol, “que nem sequer apreciou o fundo da questão”. Unai Romano criticou o arquivamento directo do seu processo, do qual esperava que saísse um julgamento, “porque há duas versões contrapostas; a minha e a da Guarda Civil”. A tese oficial foi ratificada pelo médico forense, defendendo que foi o próprio Unai Romano que se auto-lesionou no quartel. Uma versão cuja falsidade deixaram patente diversos relatórios de peritos forenses independentes.
Será julgado em breve
Como recordou o TAT na conferência de Donostia, o Tribunal de Estrasburgo não analisa o fundo das causas que se lhe apresentam, mas a existência ou não de garantias judiciais. E, embora a decisão emitida pelo Tribunal Europeu dos Direitos do Homem não tenha um carácter vinculativo para o Estado espanhol, as suas decisões costumam ser acatadas em âmbitos estatais.
Outro dos pontos que destacaram na conferência de imprensa foi o facto de terem tido que passar sete anos para que a investigação sobre a tortura que Unai Romano sofreu nas mãos da Guarda Civil fosse vetada pelos tribunais espanhóis. E ainda fizeram saber que em breve arrancará no tribunal especial de Madrid o julgamento em que Romano e mais 13 alaveses terão que se sentar no banco dos réus pelas acusações estabelecidas após a operação policial de 2001. Mais alarmante chega a ser o facto de os bascos que foram detidos nessa operação de Gasteiz terem sido acusados de um suposto delito de “colaboração com grupo armado” e agora, sete anos passados, verem a acusação elevada à categoria de “pertença”. Uma tipificação que, por conseguinte, aumenta também o período de tempo de prisão a que poderiam ser condenados.
Martxelo Otamendi, por seu lado, partilhou com os meios de comunicação a sensação que teve quando veio a público a fotografia em que o rosto de Unai Romano surgia totalmente deformado após a sua passagem pelas instalações da Guarda Civil. O tolosarra lembrou que “então muitos pensámos que aquilo acabaria com uma condenação”, tal era a evidência do motivo do
seu estado, mas que, mais uma vez, se voltou a demonstrar que “o Estado tem sempre mecanismos para dizer incríveis mentiras profissionais; o Estado teve o desplante de o ocultar de novo”.
Assim, coincidindo com a leitura realizada pelo Torturaren Aurkako Taldea, Otamendi afirmou que “a tortura é interesse do Estado”, no qual confluem os interesses policial, judicial e político. A esse respeito, quis chamar a atenção para a responsabilidade que os juízes têm sobre os detidos e, por conseguinte, sobre tudo o que lhes possa acontecer nas instalações policiais durante o período em que permanecem sob incomunicação; incluindo a tortura.
Gari MUJIKA
Fonte: Gara